A revista médica The Lancet documentou um dos primeiros casos de transmissão da varíola de macaco de humanos para animais domésticos. Um cachorro que é o animal de estimação de um casal gay testou positivo para o ortopoxvírus símio, que causa a doença, em Paris. O bicho é um galguinho italiano (uma raça historicamente apreciada entre monarcas) macho de quatro anos de idade. Ele também desenvolveu, 12 dias após o início dos sintomas dos donos, lesões cutâneas características da doença como pústulas na barriga e uma ulceração anal.
A transmissão dos donos para o cão foi confirmada por método molecular de comparação do material genético dos vírus encontrado em amostras dos três. Foi possível aferir qual dos dois donos transmitiu para o animal. O vírus é transmitido por contato próximo com fluidos corporais e as feridas na pele. Os donos relataram que o galguinho dormia com eles. Temendo que fosse possível a transmissão, eles evitaram contato dele com outras pessoas e animais antes que ele apresentasse sintomas, além de isolar a si mesmos.
Os membros do casal são um homem de origem latino-americana de 44 anos que vive com HIV em níveis indetectáveis graças ao tratamento antiviral contra a AIDS e um homem branco de 27 anos que é HIV-negativo. Eles têm uma relação aberta, ou seja, permitem-se outros parceiros sexuais. Eles procuraram o Hospital Pitié-Salpêtrière na capital francesa em 10 de junho por causa de ulcerações anais que apareceram seis dias após contato sexual com outras pessoas. O mais velho teve também pústulas na face, orelhas e pernas. O mais novo apresentou essas lesões nas pernas e nas costas. Ambos sentiram também fraqueza, dor de cabeça e febre.
Outro estudo da revista NEJM apontou que 98% dos infectados com varíola de macaco são homens gays ou bissexuais, e suspeitou que 95% da transmissão estivesse acontecendo pela via sexual. Pessoas de outras orientações sexuais também estão expostas, devido aos modos de transmissão do vírus.
O caso é de interesse pois aponta para uma transmissibilidade interespécies que poderia ser importante para prever como o surto pode evoluir. Em países onde a varíola de macaco é endêmica, ou seja, um risco presente e constante, esse ortopoxvírus fora encontrado somente entre animais silvestres, especialmente roedores e primatas. O caso mostra também que cães podem ser não apenas hospedeiros intermediários, como também manifestar uma doença em resposta à infecção.
O site Our World in Data, afiliado à Universidade de Oxford, aponta no momento mais de 36 mil casos de varíola de macaco no mundo, 2663 na França e 2893 no Brasil. As mortes continuam em baixos números, com indícios de que as vítimas tinham problemas prévios no sistema imunológico.