No fim da fila, Juancho Maldonado espera a sua vez. "Vou tentar de todas as formas", conta. "Está cada vez mais difícil continuar aqui, e ninguém quer abrir a porta."
Esse imigrante, que deixou tudo para trás junto com a violência que consome a capital da Guatemala, viu de longe as primeiras famílias entrarem para pedir asilo em solo americano, mas, por enquanto, passa fome e frio ao relento no lado mexicano da fronteira.
Maldonado está entre as centenas de pessoas que acabam de atravessar todo o México em caravana para tentar escapar da miséria e da ira de gangues que assolam a América Central. No caminho, eles atraíram um séquito de câmeras de telejornal e sofreram ameaças muito mais sérias do que as bravatas do presidente americano Donald Trump.
Enquanto o político na Casa Branca mandava despachar homens das Forças Armadas até a fronteira e pedia a autoridades ali que não deixassem ninguém entrar, Maldonado e o resto dos homens no cortejo -mulheres e crianças foram de ônibus- se equilibravam sobre um trem de carga em direção à divisa.
Ele lembra que bandidos armados numa camionete chegaram a se aproximar do grupo dizendo que atirariam neles caso seguissem adiante.
Quando não era o pavor que tirava o seu sono, Maldonado conta que o frio das noites do deserto e o sol inclemente do dia causavam ainda mais problemas. No fim do trajeto de quase 5 mil quilômetros, muitos chegaram à cerca que separa o México dos Estados Unidos com febre, tosse e gripe.
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E deram com a cara na porta. Nos últimos dias, guardas do ponto de entrada de San Ysidro, que separa Tijuana, a última cidade mexicana, de San Diego, do lado americano, disseram que não era possível processar os pedidos de asilo, chegando a barrar a entrada da maioria até liberar uns poucos para as primeiras audiências.
Maldonado, que já foi deportado três vezes pelos americanos e chegou a ser preso no país, não está entre as prioridades dos ativistas que organizaram a caravana.
Na tentativa de chamar a atenção para a crise humanitária na América Central, eles tentam passar mulheres com crianças na frente.
"É verdade que muita gente está correndo riscos. Há crianças recém-nascidas, e as temperaturas estão muito baixas. Mas todos nós queremos estar com nossas famílias", diz Maldonado, que deixou os filhos na Guatemala e quer encontrar o pai e irmãos em Atlanta.
Ameaças
Homens que vigiam a fronteira, no entanto, não têm pressa, e as tensões aumentam a cada dia.
Enquanto soldados liberam pessoas a conta-gotas, ativistas acusam os EUA de criminalizar esses migrantes.
Mas os problemas do lado mexicano do muro também aumentam. Ele conta que autoridades mexicanas, irritadas com a aglomeração na fronteira, vêm ameaçando mandar embora todos aqueles que não passarem o quanto antes pela triagem dos americanos.
"Essa caravana acontece todo ano, mas Trump criou esse problema", diz Libre Gutierrez, um artista mexicano que viajou junto com o grupo e documentou toda a sua jornada. "Os guardas mexicanos até podiam ter feito algo antes, mas não fizeram porque havia muita gente e tivemos muito apoio ao longo do caminho."
Nos últimos quatro anos, de fato, o governo mexicano, pressionado por Washington, expulsou quase 1 milhão de migrantes da América Central de seu território antes que chegassem à fronteira, mas imagens da caravana que circularam quase em tempo real despertaram a simpatia de ativistas dos dois lados da divisa.
Gutierrez, que cresceu na cidade fronteiriça de Tijuana e viu muitos de seus amigos arriscando a vida na travessia para o norte, fez de seu perfil na rede social Instagram um diário de bordo da caravana.
Nas fotografias e nos vídeos que publicou, homens mudos desafiam a exaustão da viagem sobre os vagões do trem de carga que corta a paisagem desértica do México, as fortes rajadas de vento dali servindo de trilha sonora para o trajeto.
Mesmo tendo acabado de cruzar todo o seu país contando essa história, Gutierrez agora planeja refazer o caminho instalando esculturas ao longo dele que funcionem como indicadores das rotas seguras para futuros migrantes que encararem a travessia.
"É uma odisseia", diz Gutierrez. "É um perigo andar em cima do trem, você pode escorregar e cair a qualquer momento e bandidos do crime organizado estão sempre atentos ao redor. Essas pessoas são todas muito vulneráveis. Elas estão fugindo de gangues, máfias e governos que estão violentando a própria população."