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Pandemia

Embaixada chinesa no Brasil lista “rumores” sobre a Covid-19. A história não é bem assim

Funcionário com traje de proteção, uma precaução contra o novo coronavírus, aguarda para medir a temperatura de motoristas na entrada de um estacionamento em Pequim, 22 de abril de 2020 (Foto: GREG BAKER / AFP)

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A Embaixada da China no Brasil publicou nesta quarta-feira (29) em seu site uma lista de 12 "rumores" que envolvem o país asiático e a pandemia do novo coronavírus.

Com a publicação do documento, a representação diplomática procura rebater as críticas à resposta da China nos momentos iniciais da pandemia do novo coronavírus, que teve início na cidade de Wuhan, e as acusações de falta de transparência do país asiático.

A embaixada afirmou que relatos sobre a origem e disseminação do novo coronavírus são "frequentemente misturados com alegações falsas".

"Nas redes sociais e em algumas mídias tradicionais, mentiras, rumores e teorias da conspiração são muito populares", diz o texto, acrescentando que a China "foi particularmente afetada por essa epidemia da má informação".

Entre os rumores considerados infundados pelo país asiático estão as acusações de que o vírus foi criado artificialmente ou teve origem em um acidente de laboratório.

No entanto, algumas das alegações da China podem não contar toda a história das ações do governo chinês durante a pandemia de Covid-19 ou ter interpretações diferentes.

Um dos rumores listado pela diplomacia chinesa é o de que "a China ocultou a verdade sobre a epidemia de Covid-19 durante muito tempo antes de se tornar uma pandemia global". Sobre essa alegação, a embaixada chinesa afirma que o país notificou "tão cedo quanto possível" o público nacional e global sobre a epidemia e tomou as mais rigorosas medidas de prevenção e controle, "dando ao resto do mundo pelo menos seis semanas de avanço para se preparar.

No entanto, os relatos do médico chinês Li Wenliang revelam que a China não deu ouvidos aos primeiros sinais de que um vírus semelhante ao causador da síndrome respiratória aguda grave (Sars) tinha aparecido em Wuhan. Pelo contrário, o médico foi reprimido por autoridades locais do partido comunista chinês após ter alertado sobre pacientes internados com sintomas parecidos com o da Sars logo no início do surto do novo coronavírus.

Li alertou colegas sobre os casos por mensagens em um grupo privado, em 30 de dezembro de 2019, recomendando que eles usassem equipamentos de segurança para evitar a infecção. Após as suas mensagens circularem nas redes sociais, o médico recebeu a visita de autoridades que o acusaram de "divulgar informações falsas" que "causaram distúrbios graves à ordem social". Outras sete pessoas foram investigadas pela polícia.

O médico oftalmologista contraiu Covid-19 ao tratar pacientes infectados e morreu em decorrência da doença em 6 de fevereiro.

A China alega que as suas instituições oficiais receberam pela primeira vez informações sobre um caso de pneumonia atípica em 27 de dezembro de 2019 e publicaram seu primeiro aviso de epidemia em 31 de dezembro.

Documentos do governo chinês obtidos pela agência Associated Press revelaram que o presidente da China, Xi Jinping, esperou seis dias para alertar publicamente sobre o surto de coronavírus em Wuhan. A decisão veio quase uma semana depois que funcionários determinaram que a situação "provavelmente se tornaria um grande evento de saúde pública". Acredita-se que 3.000 chineses tenham sido infectados durante esse período de seis dias.

Xi interrompeu o silêncio sobre a epidemia em 20 de janeiro para avisar que o surto "deve ser levado a sério". No mesmo dia, o principal epidemiologista chinês, Zhong Nanshan, disse pela primeira vez em público que o vírus era transmissível entre pessoas.

A falta de medidas imediatas foi um problema no início da epidemia, que surgiu pouco antes do movimentado feriado do ano novo lunar. As autoridades de Wuhan demoraram para perceber a gravidade do surto. Quando a cidade foi bloqueada, muitos casos já haviam sido registrados em outras regiões da China.

O próprio governo chinês reconheceu e admitiu publicamente a sua falha, em uma iniciativa rara. O reconhecimento veio do Comitê Permanente do Politburo, o organismo mais poderoso do Partido Comunista da China, relatou a Business Insider.

O comitê afirmou, em registro da reunião publicado pela mídia estatal, que a epidemia expôs problemas de gestão de emergência que precisariam ser solucionados.

Críticas também foram feitas ao governo local de Wuhan, que permitiu que um banquete anual com milhares de pessoas fosse realizado. Para celebrar os 20 anos do evento, os organizadores planejavam quebrar o recorde mundial de refeições servidas, segundo o South China Morning Post. Pelo menos três semanas antes do banquete, realizado em 18 de janeiro, as autoridades de Wuhan já sabiam que o vírus estava se espalhando pela cidade, de acordo com a publicação.

"A China ocultou e reportou com inexatidão o número de casos diagnosticados e mortes por Covid-19". Sobre essa acusação, a embaixada chinesa afirma que a China "sempre foi transparente" no diagnóstico e no número de mortes pela doença e "cumpriu suas obrigações de informar".

A representação diplomática diz ainda que o baixo número de casos confirmados e mortes na China é atribuído a medidas "oportunas, rigorosas e abrangentes" de prevenção e controle tomadas pelo governo.

Mas as suspeitas sobre os números reais de infecção no território chinês cresceram à medida que outros países começaram a registrar muito mais casos da doença. A China enfrenta críticas sobre a transparência dos seus dados.

Atualmente, apesar do seu tamanho e de ser o país onde a doença foi primeiro detectada, a China ocupa o décimo lugar no ranking dos países com mais casos confirmados de coronavírus, atrás de países muito menores, como Itália, Espanha, França, Reino Unido, Irã e Turquia.

A dimensão da epidemia na China pode ser maior do que parece. Pesquisadores de Hong Kong estimaram que o número de casos de Covid-19 na China pode ser quatro vezes maior do que o reportado pelo governo chinês. Em estudo publicado na revista científica The Lancet, os autores calculam que mais de 232 mil pessoas podem ter sido infectadas pelo patógeno até 20 de fevereiro, quando a contagem oficial de casos era de 55 mil.

A diferença entre os números seria gerada pelas mudanças nas diretrizes usadas pelo governo chinês para determinar um caso confirmado de Covid-19. Para chegar a essa estimativa, os pesquisadores aplicaram em modelo as diretrizes adotadas em meados de fevereiro no país.

No entanto, a subnotificação de casos é uma possibilidade também para outros países que não têm capacidade de fazer testes em massa.

A embaixada chinesa também refuta a alegação de que "a China está ajudando outros países a combater a epidemia, apenas para expandir a sua influência geopolítica".

A China ajuda outros países "por motivos humanitários e de solidariedade, partilhando a sua experiência acumulada na luta contra epidemias", afirmou a embaixada.

A ajuda de Pequim, que sempre quis ampliar sua influência na Europa, tem sido recebida com um misto de gratidão e desconfiança. Analistas sugerem que a China parece ter visto uma oportunidade de melhorar sua imagem no cenário internacional com o envio de auxílio aos outros países. Líderes ocidentais já contestaram ações da chamada "diplomacia das máscaras", como a instalação de cartazes com a imagem de Xi Jinping na Sérvia.

Há relatos de diplomatas chineses pedindo que representantes de governos elogiassem publicamente a transparência e solidariedade da China, por exemplo, como noticiou a Business Insider.

O documento rebate ainda as acusações de que "os produtos médicos importados da China são contrafeitos e de qualidade duvidosa", dizendo que o país conduz "inspeções rigorosas de qualidade nos produtos médicos exportados. Parte do problema deriva do uso impróprio ou da diferença de regulamentações entre a China e o resto do mundo".

Segundo a embaixada, os produtos em que foram detectados problemas de qualidade foram em número reduzido.

O controle de qualidade de produtos como máscaras e outros equipamentos de proteção para profissionais de saúde tem sido um desafio para a China. Antes da crise, a China produzia cerca de metade das máscaras médicas no mundo, cerca de 20 milhões por dia. A indústria de máscaras chinesas aumentou a produção para cerca de 116 milhões de máscaras por dia, segundo a Newsweek.

Países europeus recusaram equipamentos chineses de combate ao coronavírus após receberem materiais com defeito. Autoridades da Espanha, Turquia e Holanda relataram que milhares de kits diagnósticos e máscaras cirúrgicas estavam abaixo dos padrões ou defeituosas.

Mais recentemente, o Canadá recebeu um milhão de máscaras N95 fabricadas na China que não atingiram os padrões de qualidade do país.

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