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Não demorou muito para que a oposição em Hong Kong começasse a ser perseguida por Pequim sob as novas regras de segurança nacional, em vigor há duas semanas. Depois de ter prendido manifestantes e retirado livros pró-democracia das bibliotecas e escolas públicas da cidade, a China criticou e ameaçou lideranças políticas da oposição que organizaram, no fim de semana, eleições primárias para escolher os candidatos que disputarão uma vaga no Conselho Legislativo de Hong Kong, em setembro, pelo movimento democrático.
Essas primárias não são oficiais, tampouco o parlamento da ilha é escolhido por sufrágio universal. Mas mais de 600 mil honcongueses – 13% do eleitorado da cidade – foram às urnas para apoiar o movimento democrático, apesar das ameaças do governo local, pró-Pequim, de que os participantes estariam violando a nova lei de segurança nacional. Para a oposição, essa é uma maneira de determinar uma lista mais concisa de candidatos para evitar uma pulverização dos votos.
A mobilização em massa foi vista como um amplo apoio da população à oposição e Pequim não demorou a expressar seu descontentamento. Em um comunicado publicado nesta terça-feira (14), o ministério chinês de Relações com Hong Kong e Macau afirmou que as primárias são "ilegais" e violam a miniconstituição de Hong Kong e a lei de segurança nacional. "É uma interferência e uma destruição do sistema eleitoral democrático de Hong Kong", afirmou o órgão, alegando que nenhuma lei eleitoral de Hong Kong prevê a realização de primárias. "É ilegal para qualquer grupo ou indivíduo organizar tais eleições por conta própria", reforçou.
Um dos motivos de preocupação, segundo o gabinete, é de que os organizadores ativistas estejam tendo acesso a uma grande quantidade de informações pessoais e dados eleitorais dos cidadãos. Na sexta-feira passada, a polícia revistou os escritórios do Instituto de Pesquisa de Opinião Pública de Hong Kong, que ajudou o movimento pró-democracia na realização das primárias. Computadores foram apreendidos, mas ninguém foi detido. Um porta-voz do departamento de crimes cibernéticos disse que a operação foi feita depois de uma denúncia de que informações estariam sendo vazadas. O governo de Hong Kong informou ainda que recebeu várias denúncias de que as regras de distanciamento social, impostas por causa da pandemia, estavam sendo descumpridas durante as primárias.
A chefe-executiva de Hong Kong, Carrie Lam, pró-Pequim, disse que os esforços da oposição para obter a maioria dos 70 assentos do legislativo – o que é bem difícil, já que apenas metade delas é escolhida por voto direto – e vetar o orçamento do governo podem ser contrários às leis antissubversão e serão investigados. Pequim, por meio do gabinete de Relações com Hong Kong, disse que apoia essas investigações.
"Se o objetivo da chamada eleição 'primária' é alcançar o que eles chamam de '35 + ' [maioria do parlamento] com o objetivo de contestar, resistir a todas as iniciativas políticas do governo da RAE [Região Administrativa Especial] de Hong Kong, então isto pode ser enquadrado na categoria de subverter o poder do estado, que agora é um dos quatro tipos de crimes sob a nova lei de segurança nacional", disse Lam à imprensa na segunda-feira (13).
A China ainda fez acusações diretas a um líder específico da oposição, o acadêmico e ativista Benny Tai Yiu-ting, que já foi preso por ser um dos organizadores do movimento pró-democracia "Ocupar Central", de 2014. O gabinete das Relações com Hong Kong disse que Tai é um "agente político de forças estrangeiras em Hong Kong", "defensor da independência" e "um dos principais culpados em criar o caos" na cidade. Também disse que o objetivo do movimento pró-democracia é "é derrubar o Governo da Região Administrativa Especial e tomar o poder de governá-la".
Ao jornal South China Morning Post, Tai negou as acusações de Pequim e as classificou como absurdos. Ele disse que as primárias do movimento pela democracia foram organizadas com recursos locais e que os candidatos derrotados poderiam disputar as eleições parlamentares de setembro. E sobre as intenções alegadas pelas autoridades chinesas, o ativista afirmou que os legisladores têm poder constitucional de vetar o orçamento e responsabilizar o governo.
"É absurdo alegar que isso subverte o Estado. Além disso, a alegação ignora a redação clara da Lei Básica" de Hong Kong, declarou.