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Nos últimos anos, o Ártico se tornou palco de disputas geopolíticas entre as principais potências do mundo, que veem a região como uma área de investimentos próspera, com capacidade de se tornar uma nova rota de comércio, fonte de recursos naturais e influência.
Esse é o caso de China e Rússia, países que têm unido forças e aumentado a presença na região polar, tornando o estreitamento da relação uma nova ameaça aos países ocidentais, aliados dos EUA, que não têm a região como prioridade política e militar.
Em outubro, o almirante da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) Rob Bauer afirmou que “o Ocidente deve se preparar para o fato do conflito direto encabeçado pela Rússia e aliados poder surgir a qualquer momento e em qualquer domínio, incluindo o Ártico”.
Bauer fez a declaração no contexto da suspeita de sabotagem a um gasoduto e um cabo submarino de comunicações entre a Finlândia, que entrou oficialmente para a OTAN em abril, a Estônia e a Suécia, no Mar Báltico.
O almirante justifica seu temor num momento em que a Rússia aprofunda sua guerra contra a Ucrânia, realizando um dos maiores ataques desde o início do conflito neste mês, e a China intensifica significativamente sua atividade na região do Ártico, seguindo o plano da Nova Rota da Seda Polar, que visa construir infraestrutura para navegar entre a Europa e a Ásia até 2035, aproveitando o derretimento do gelo na região, que facilita o acesso aos seus recursos naturais e navegabilidade.
Os últimos dados científicos divulgados sobre o Ártico apontam que uma rota comercial alternativa na região polar levaria cerca de 40% menos tempo do que nas rotas tradicionais, como o Canal de Suez, no Egito. Além disso, o trajeto mais curto tornaria a viagem mais barata, com menor gasto de combustível.
Outro interesse geopolítico na região está ligado à exploração das reservas de gás e petróleo. De acordo com o serviço geológico do governo americano, o US Geological Survey, o Ártico contém cerca de 90 bilhões de barris de petróleo, representando 13% das reservas do planeta, e em torno de 44 bilhões de barris de líquidos de gás natural.
Apesar de terem aumentado a atividade na região no último ano, os governos chinês e russo já investem na área há anos. Em 2021, a Rússia implantou 18 bases militares na região, posicionando navios de exploração de recursos naturais e submarinos de ataque nuclear.
O governo de Moscou também está investindo em infraestrutura para que o Ártico se transforme em uma zona de trânsito global, ideia compartilhada com o ditador Xi Jinping. Ao todo, hoje existem 25 portos ao longo da costa ártica, tornando o comércio com a Europa e a Ásia mais acessível por esse caminho marítimo.
A presença chinesa na região já existia nos anos 2000, no entanto, se intensificou nos últimos anos, após o lançamento do livro branco, um documento oficial publicado pelo governo de Xi que delibera sobre a "Política do Ártico da China".
Desde então, segundo o jornal britânico Financial Times, a China já injetou cerca de US$ 90 bilhões em projetos com a Rússia ligados a combustíveis fósseis e minerais no Ártico.
O governo de Pequim já adquiriu minas em Nunavut, uma parcela canadense do Ártico, e busca expandir seu território na região polar.
Os negócios de Xi na área pouca explorada do Ártico ganharam novo fôlego neste ano, após a aplicação de sanções do Ocidente contra a Rússia começarem a afetar o governo de Putin.
Em março, os dois países estabeleceram um acordo para o tráfego ao longo da Rota do Mar do Norte. No mês seguinte, um novo acordo marítimo bilateral sobre o Ártico foi assinado pelo Serviço de Guarda de Fronteiras do Serviço Federal de Segurança russo e pela Guarda Costeira chinesa. Antes disso, o país asiático não possuía alianças de segurança e comércio na região.
Poucos meses depois, já existia um serviço regular de transporte de contêineres entre São Petersburgo e Xangai e a Rússia começou a realizar carregamentos de petróleo bruto para a Ásia.
Geograficamente, a Rússia possui maior vantagem sobre a área em relação à China. No entanto, devido à situação de guerra enfrentada por Putin, o governo asiático se mostra mais forte na nova parceria sino-russa.
Os novos acordos de cooperação representam uma nova ameaça aos EUA, que se tornam um alvo mais fácil por estarem localizados na área costeira à região. A influência americana no Ártico cresceu desde que o país comprou o Alasca da Rússia, em 1867, no entanto, o governo americano não dedica muitos investimentos na área, tendo outras regiões como prioridade.
Em 2021, antes do surgimento do novo cenário geopolítico resultante da guerra no leste europeu, o Exército americano anunciou seu primeiro plano de atuação no Ártico. Com o início da guerra na Ucrânia, o governo americano enviou três novos navios quebra-gelo ao Oceano Ártico., quando a Rússia já acumulava mais de 50.