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O governo da China anunciou nesta segunda-feira (31) que permitirá que casais tenham até três filhos, em uma flexibilização da política de planejamento familiar imposta no país. A medida tem como objetivo tentar reverter o envelhecimento da população, depois que os dados mais recentes do censo chinês mostraram uma acentuada queda no número de nascimentos nos últimos quatro anos. Contudo, apenas a revisão da política de planejamento familiar não deve bastar para resolver o problema demográfico.
"As políticas de natalidade serão melhoradas ainda mais. Será introduzida uma política que permite a um casal ter três filhos, com medidas de apoio", informou um comunicado do Partido Comunista da China, após uma reunião entre os principais líderes do país, presidida por Xi Jinping. "Isso vai melhorar a estrutura populacional da China".
As "medidas de apoio" devem incluir, entre outras coisas, a redução das despesas educacionais para as famílias, algo que impede muitos casais de terem mais filhos. O partido comunista também prometeu melhorar as políticas de licença maternidade e o sistema de seguro-maternidade, além de proteger os direitos das trabalhadoras que queiram ter filhos.
Campanhas que promovam o casamento e os valores familiares entre os jovens também devem ser reforçadas.
Outra medida que deve ser adotada com o objetivo de controlar os impactos do envelhecimento da população é aumentar a idade mínima para a aposentadoria, que atualmente gira em torno dos 60 anos para os homens, mas varia de acordo com a profissão e o sexo – trabalhadoras em fábricas, por exemplo, podem se aposentar a partir dos 50.
O anúncio desta segunda-feira trouxe apenas linhas gerais sobre a nova política. Ainda não há uma data para que a mudança entre em vigor. Os detalhes devem ser discutidos pelas lideranças e anunciados ao longo do ano.
População envelhecendo
Há poucas semanas, o Escritório Nacional de Estatísticas da China (NBS, na sigla em inglês) informou que a população da China chegou a 1,412 bilhão de pessoas em 2020, um pequeno aumento em relação ao ano anterior. O censo também mostrou que o número de nascimentos caiu pelo quarto ano consecutivo. Mulheres chinesas deram a luz a 12 milhões de bebês no ano passado, abaixo dos 14,65 milhões de nascimentos em 2019 – uma queda de 18%. A taxa de fertilidade na China está em torno de 1,3, abaixo da taxa de 2,1 filhos por mulher, necessária para uma população estável.
Enquanto isso, o percentual de chineses com 60 anos ou mais deu um salto entre 2010 e 2020, de 13,3% para 18,7%. Já a fatia da população com idades entre 15 e 59 anos diminuiu de 70,1% para 63,35% no mesmo período.
"Os dados do censo também mostram algumas contradições estruturais enfrentadas pelo desenvolvimento populacional do país, como o declínio do tamanho da população em idade ativa e das mulheres em idade reprodutiva, o aprofundamento do grau de envelhecimento, o declínio da taxa de fecundidade total e a diminuição no número de nascimentos”, disse o comissário do NBS, Ning Jizhe, acrescentando que a taxa de crescimento populacional da China continuará diminuindo.
O envelhecimento da população promete trazer desafios para os objetivos econômicos da China, com mão de obra mais escassa e aumento das despesas com aposentadoria.
Dificuldades
Até então, o governo chinês permitia que casais tivessem dois filhos. Essa "flexibilização" da brutal política do filho único – responsável por esterilizações forçadas, aborto e abandono de milhões de bebês ao longo de 35 anos e ainda um desequilíbrio entre número de homens e mulheres no país – ocorreu em 2015, quando as lideranças do país começavam a se preocupar com o envelhecimento populacional.
Contudo, a nova regra, acompanhada de pesadas propagandas para que os jovens tenham filhos, não teve os efeitos esperados. Desde 2016, quando a política de dois filhos entrou em vigor, o número de nascimentos na China tem caído em ritmo acelerado.
Isso está gerando um debate entre os chineses sobre o quão eficiente a nova política de planejamento familiar será para contornar o problema demográfico. Nas redes sociais, muitos usuários comentaram a notícia afirmando que há "muitas pressões na vida neste momento" e que, por isso, "os jovens não estão dispostos a ter filhos".
Um movimento de feministas chinesas questionou a nova política de natalidade, afirmando que "as mulheres não são um instrumento reprodutivo e não devem mudar a decisão pessoal de não ter filhos por causa do 'interesse nacional'". O Free Chinese Feminists defende que a China deve abolir completamente as políticas de controle de natalidade e planejamento familiar. "O Estado deve... promover vigorosamente os direitos das mulheres, mas isso não deve ser uma moeda de troca para [aumentar] taxas de fertilidade".