Disputa
Influência cultural da China ainda não é páreo para a dos EUA
O professor da Universidade de Brasília Argemiro Procópio Filho publicou, neste ano, o livro O Capitalismo Amarelo Relações Internacionais da China (Juruá).
Numa das viagens que fez durante o trabalho de pesquisa, observou nas ruas que os jovens chineses se penteiam como ocidentais. "Horas passadas diante do espelho para criar um visual cuidadosamente desleixado", diz.
O exemplo, dado em tom de brincadeira, serve para ilustrar que a influência cultural da China no mundo ainda não é páreo para a norte-americana. "O dia em que jovens ocidentais rasparem a cabeça, deixando uma trancinha na parte de trás da cabeça, a situação terá mudado."
Não bastasse a competição com EUA, Japão e Alemanha, Procópio diz que a Índia deve brigar cada vez mais por espaço no cenário internacional.
No texto principal desta página, Rodrigo Wolf Apolloni diz que a "invisibilidade" é a grande instituição chinesa. Para Procópio, o título cabe ao Partido Comunista Chinês. Graças às dimensões da China, trata-se do maior partido político do mundo, com mais de 80 milhões de afiliados.
"Um país pode obter os resultados que quer na política internacional à medida que outras nações (...) se dispõem a segui-lo."
Joseph Nye, cientista político, professor da Universidade de Harvard e autor do livro O Futuro do Poder (Benvirá).
"Até o século 15, a China era a maior potência tecnológica do Mundo. Havia criado pólvora, bússola, leme e canhão."
Argemiro Procópio Filho, autor do livro O Capitalismo Amarelo Relações Internacionais da China (Juruá).
"A China exerce uma forma muito sutil de soft power: é uma grande produtora de bens sem assumir a identidade desses bens."
Rodrigo Wolff Apolloni, doutor em Sociologia e tradutor do livro O Mosteiro de Shaolin, de Meir Shahar (Perspectiva).
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Quando o cientista político Joseph Nye cunhou o termo soft power, ele o definiu como um modo de levar os outros a fazer o que você quer usando meios de sedução e não de coerção. No lugar de dinheiro e armas, cultura e políticas.
O "poder suave" é uma das preocupações do Partido Comunista Chinês para sustentar, e quiçá ampliar, a influência da China no mundo nos próximos anos.
Um exemplo fácil de soft power é o cinema norte-americano, uma máquina de propaganda consumida onde quer que haja uma sala de projeção. Outra "arma" dos Estados Unidos nesse campo é a democracia.
O professor de Relações Internacionais Argemiro Procópio Filho, da Universidade de Brasília, diz que a China não concorre com os EUA quando o assunto é cultura de massa. E há ainda uma peculiaridade.
"Na China, com o confucionismo, se prioriza o coletivo", explica o professor. Isso, num mundo dominado por ocidentais individualistas. Mas é exatamente a doutrina de Confúcio (551 a.C. 479 a.C.), que valoriza a família e o Estado, um dos valores chineses a se propagar pelo mundo.
Os chineses têm filiais do Instituto Confúcio em várias partes do mundo num modelo que se assemelha ao Instituto Goethe, da Alemanha, e à Aliança Francesa para difundir a língua e a cultura chinesas.
Doutor em Sociologia pela Universidade Federal do Paraná, o colunista da Gazeta do Povo Rodrigo Wolff Apolloni tem a cultura chinesa como um de seus interesses acadêmicos e afirma que o soft power do país mais populoso do mundo, ao menos na cultura pop, é exercido por meio das artes marciais. Ela tem personagens carismáticos como o americano filho de chineses Bruce Lee (1940-1973), o honconguês Jackie Chan e o pequinês Jet Li.
O maior exemplo do kung fu como soft power talvez seja o filme O Mosteiro de Shaolin (1982), produzido, de acordo com Apolloni, com apoio do Partido Comunista Chinês. A aventura marcou a estreia de Jet Li no cinema e teve uma repercussão monstruosa na China e fora dela.
Hoje, as artes marciais estão nos jogos eletrônicos, no cinema dos EUA (o diretor e roteirista Quentin Tarantino, de Kill Bill, é a prova) e até na música popular brasileira (Caetano Veloso cita Bruce Lee nas letras de "Um Índio").
Fora das questões culturais, existe uma forma muito sutil de soft power, segundo Apolloni. "A China é uma grande produtora de bens sem assumir a identidade desses bens", diz. Os norte-americanos passaram a usar um expediente interessante para defender sua autoria sobre certos produtos. Para citar uma instituição americana: toda a parafernália da Apple fabricada em território chinês é, observe as letras pequenininhas, "assembled" (montada) nos Estados Unidos.
"Invisibilidade é a grande instituição chinesa", diz Apolloni. A China ainda não entrou na era das ideias como muitos analistas observam , mas sustenta o mundo no setor produtivo.
Procópio diz que os chineses foram criativos ao galgar espaço no mercado investindo, de início, em objetos simples, domésticos, "que ninguém dá valor, mas de que todo mundo precisa". Cortadores de unha, por exemplo.
Em meados dos anos 1980, diz Procópio, 20 navios de produtos chineses viajavam para o Japão e 19 voltavam vazios. Um navio carregado com produtos japoneses bastava para pagar os carregamentos das duas dezenas de embarcações com itens chineses. Embora não se saiba como essa imagem dos navios funciona hoje, é razoável supor que ela tenha mudado um tanto em favor dos criadores da pólvora.
O futuro da influência chinesa não é previsível. "Qual será o mangá e o animê da China?", pergunta Apolloni, retoricamente, citando as histórias em quadrinhos e os desenhos animados que se tornaram sinônimos de Japão para o mundo. "Eu não sei."
Tópicos
Valores, cultura, políticas e instituições compõem a base do soft power.
Poder
Cientista político e professor da Universidade de Harvard, Joseph Nye criou o termo soft power para falar da influência norte-americana no mundo. Seu livro mais recente a sair no Brasil é O Futuro do Poder (Benvirá), publicado neste ano.
Influência
O "poder suave" funciona por sedução e não por coerção. Está, segundo Nye, baseado em quatro itens: valores, cultura, políticas e instituições. Com eles, ou com alguns deles, um país consegue exercer influência no cenário internacional sem lançar mão de métodos agressivos.
Hollywood
Os filmes norte-americanos são "armas" de soft power que divulgam os valores e a cultura do país pelo mundo. Além de representar uma das instituições dos EUA: Hollywood, a indústria cinematográfica.
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