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“Invasão”

Chineses querem terras australianas

No leste da Austrália, o aumento no número de imigrantes chineses está ressuscitando a cidade de Gunnedah, que volta a ter na mineração um de seus pilares econômicos | Jfolley/Creative Commons
No leste da Austrália, o aumento no número de imigrantes chineses está ressuscitando a cidade de Gunnedah, que volta a ter na mineração um de seus pilares econômicos (Foto: Jfolley/Creative Commons)
Monumento aos trabalhadores que morreram nas minas de carvão em Gunnedah |

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Monumento aos trabalhadores que morreram nas minas de carvão em Gunnedah

A família de Tony Clift arou o solo negro das planícies de Liverpool, na Austrália, por seis gerações. A ideia de vender nunca passou pela sua cabeça – até que uma empresa chinesa chegou à cidade.

A Shenhua Watermark Coal se ofereceu para comprar fazendas pagando valores (altos) inimagináveis. A decisão não foi fácil, diz Clift. Seus ancestrais pioneiros adquiriram a terra em 1832, mas ser fazendeiro é difícil nos dias atuais e vender seus 2,6 mil hectares era um bom negócio.

"Se alguém oferecer a você uma pilha de dinheiro, você tem de aceitar", diz o australiano de 50 anos e pai de dois filhos, sentado à mesa da cozinha da mansão que ele mesmo construiu no topo de uma colina com o dinheiro da venda.

Um mar amarelo se estende abaixo da colina: são campos de canola plantados em terras menos férteis que ele comprou 40 quilômetros ao norte.

A escalada nos preços do carvão alimentada pelo crescimento econômico da China tornou as regiões mineradoras das terras australianas muito mais lucrativas do que as fazendas que as dominavam.

É um exemplo de como o crescimento da China como potência do comércio global poderá transformar países de formas nunca contempladas antes e que ainda não foram totalmente compreendidas.

Na Austrália, as exportações de carvão e minério ajudaram o país a evitar a recessão por 21 anos e resultaram nos maiores superávits comerciais em 140 anos.

O crescimento rápido da China deu à Austrália os resultados comerciais mais fortes desde o crescimento acelerado do comércio de lã, nos anos 1950, diz o economista Peter Robertson, da University of Western Australia. "Aquele crescimento teve vida curta, mas a duração deste é desconhecida. Poderá se tornar muito maior, dependendo do desempenho futuro da China", avalia.

As relações da antiga colônia britânica com a China vêm se aprofundando também de outras formas. Em 12 meses (entre 2010 e 2011), mais de 29 mil chineses se tornaram residentes permanentes no país, ultrapassando pela primeira vez o Reino Unido, fonte tradicional de imigrantes. A China respondeu por quase dois terços dos 10.407 vistos de trabalho no último ano.

"Aqui, a China não é apenas nosso maior parceiro comercial, é agora a grande fonte de imigrantes e de estudantes internacionais residindo na Austrália", diz Peter Drysdale, professor emérito da Australian National University. O estudo leva à imigração, que leva ao investimento, que leva ao aprofundamento das relações econômicas e à interação entre as comunidades, acrescenta Drysdale.

No leste da Austrália, o aumento no número de imigrantes chineses está ressuscitando a cidade de Gunnedah. Trabalhadores da construção e pesquisadores vestindo camisas de um tom verde fluorescente são uma visão comum, um lembrete constante de que a mineração é a causa do renascimento econômico.

Nem todo mundo está feliz. A perspectiva de ter empresas chinesas explorando as minas de carvão dividiu a cidade de 12 mil habitantes, incluindo os membros da família de Tony Clift. Há temores de que a poeira do carvão, as ferrovias para transporte e os danos aos aquíferos possam alterar para sempre o modo de vida bucólico da região.

Tradicional no país, extração de carvão ocupa terras ricas

Gunnedah, cujos dias de glória ocorreram durante o crescimento no comércio da lã, durante os anos 1950, pode estar passando por uma de suas maiores transformações desde seu surgimento, em 1856, diz Adam Marshall, que deixou o cargo de prefeito em setembro. "Tivemos um mini boom do carvão no início dos anos 1980, mas nada na escala que estamos vendo agora", diz ele.

A mineração de carvão tem uma longa história na Austrália, mas nunca avançou até terras ricas como as das fazendas das Planícies Liverpool, uma área de 12,4 mil quilômetros quadrados cercada por montanhas e dotada de colinas vulcânicas cerca de 275 milhas ao norte de Sidney.

A chinesa Shenhua Water­mark, subsidiária da estatal China Shenhua Energy, maior companhia de mineração de carvão do mundo, gastou 167 milhões de dólares australianos (mais de US$ 170 milhões) para comprar 43 fazendas que cobrem uma área de 36,3 mil acres. De acordo com o ex-prefeito Marshall, a Shenhua pagou várias vezes mais que o valor de mercado.

George Clift, de 83 anos, que recusou-se a vender, está aborrecido com o fato de seu primo Tony tê-lo feito. "Espera-se que você mantenha a terra para a próxima geração, então, se você não vai fazê-lo, você nem deveria ter recebido a terra", diz ele. "Estou muito, muito triste em ver como tudo está mudando para a próxima geração; vimos o melhor da Austrália e acho que daqui pra frente só vai piorar."

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