A cada segundo, Marte perde 100 g de atmosfera por causa de um fluxo de partículas emanadas do Sol -- e isso explica por que o planeta é tão árido e frio
Medições obtidas por uma espaçonave da Nasa mostram que a atmosfera de Marte está sendo constantemente varrida para o espaço pela interação com o fluxo de partículas emanadas do Sol.
Os resultados foram publicados na revista científica “Science” e anunciados nesta quinta-feira (5) em uma entrevista coletiva promovida no quartel-general da Nasa, em Washington (Estados Unidos).
Trata-se de uma parte fundamental do quebra-cabeça na dramática história evolutiva do planeta vermelho, que passou de um mundo com rios, lagos e oceanos -- há 4 bilhões de anos -- a um deserto árido e frio, no presente.
E qual é o nome do filme? Pelos novos achados, obtidos pela sonda orbital Maven, é “E o Vento Solar Levou”.
Escape atmosférico
A espaçonave foi lançada em novembro de 2013 e está desde setembro do ano passado investigando a interação da alta atmosfera marciana com o ambiente espacial ao seu redor.
Marte vai perder uma de sua luas...e em ‘pouco’ tempo
Marte não parece ser mesmo um planeta de sorte. Não só perdeu a maior parte de sua atmosfera -- e com ela a capacidade preservar água líquida na superfície de forma estável -- como está destinado a ficar sem uma de suas luas.
É o que mostra um estudo recém-apresentado por Terry Hurford, do Centro Goddard de Voo Espacial, da Nasa, durante reunião da Sociedade Geológica da América.
A maior e mais interna das duas luas marcianas , Fobos, está sendo forçada ao seu limite pelo efeito de maré produzido por Marte. Pesquisas mostram que ela provavelmente não passa de um agregado de pedras reunidos apenas pela força da gravidade. E como a lua orbita muito perto do planeta, a apenas 6.000 km da superfície, o estresse desse “estica e puxa” do efeito de maré pode ser significativo.
O primeiro sintoma é a aparição de ranhuras paralelas na superfície da pequena lua -- que já foram observadas em imagens feitas pelas várias sondas que já a fotografaram ao longo dos anos.
Isso, segundo Hurford e seus colegas, significa que o processo que levará ao despedaçamento da lua já começou. Em cerca de 100 milhões de anos (um piscar de olhos perto da história de 4,6 bilhões de anos do Sistema Solar), Fobos será estraçalhado pelo efeito de maré e possivelmente formará um anel de detritos em torno de Marte.
No fim das contas, esse material provavelmente também acabará caindo no planeta vermelho.
Diferentemente da nossa Lua, os dois satélites naturais de Marte não são corpos esféricos e grandes. São meramente pedregulhos espaciais, que mais lembram asteroides. Fobos tem 22 km de diâmetro, e Deimos, 12 km. Aliás, há quem defenda que eles sejam de fato asteroides, que acabaram capturados pela gravidade de Marte.
Também não se descarta, contudo, que Fobos e Deimos tenham se formado ali mesmo, resultado de um impacto violento no planeta no passado remoto, mesmo mecanismo que teria dado origem ao sistema Terra-Lua.
Em essência, as medidas permitiram mapear o fluxo de partículas da atmosfera para o espaço, formando uma cauda e uma pluma na direção oposta à do Sol.
“Descobrimos que cerca de 100 gramas de atmosfera escapam de Marte a cada segundo”, disse Dave Brain, da Universidade do Colorado em Boulder, um dos membros da equipe científica da Maven.
“Não posso evitar pensar em hambúrgueres, um por segundo, escapando da atmosfera de Marte -- mas nesse caso são de oxigênio e dióxido de carbono.”
Processo inconstante
Os pesquisadores também puderam estabelecer que essa é uma medida mínima. Durante tempestades solares, quando nossa estrela ejeta grandes quantidades de partículas carregadas na direção dos planetas, a taxa de perda atmosférica aumenta em 10 a 20 vezes. Ou seja, 20 hambúrgueres por segundo.
“Se isso continuar assim, Marte em tese poderia perder toda a sua atmosfera em mais um par de bilhões de anos”, disse Bruce Jakosky, líder científico da missão Maven.
“Mas não achamos que isso vá acontecer porque também há fontes de gás sob o solo e na forma de gelo, para reabastecer a atmosfera”, afirma ele.
Em compensação, sabe-se que as tempestades solares eram mais frequentes e intensas na época em que o Sol era jovem, o que ajuda a explicar como Marte perdeu atmosfera de forma muito mais radical no passado.
Hoje, o ar de Marte tem menos de um centésimo da densidade vista na Terra. Com uma atmosfera tão rarefeita, é impossível reter o calor, e por isso o planeta vermelho se transformou no deserto gelado de hoje.
Os pesquisadores esperam usar os dados da Maven para compreender melhor o que ocorreu no passado, mas evidências geológicas sugerem que essa transição do estado molhado para o seco aconteceu entre 4,2 bilhões e 3,7 bilhões de anos atrás.
O processo teria coincidido com o desligamento do campo magnético global de Marte. No passado remoto, o interior do planeta vermelho tinha calor suficiente para a geração de uma magnetosfera robusta, como a que a Terra tem ainda hoje.
Esse, aliás, é o mecanismo que protege nosso planeta de perder grandes quantidades de atmosfera para o espaço. Mas Marte, menor, perdeu essa capacidade cedo em sua história. Com o desligamento do campo magnético, o vento solar encontrava caminho desimpedido para se chocar com a atmosfera e levar à sua rápida erosão.
Auroras
A sonda também pôde monitorar a ocorrência de auroras em Marte. E o mais surpreendente é que elas aparecem em dois tipos: uma é similar às que acontecem na Terra, mas mais fraca e com a diferença de que não há um campo magnético global para guiá-las.
Já a outra é ainda mais estranha, porque parece não envolver nem mesmo magnetismo em escala local, e é causada por elétrons de alta energia durante tempestades solares, que por sua vez conduzem à emissão de luz ultravioleta.
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