Um dia após o ditador venezuelano Nicolás Maduro se envolver em um incidente em Caracas, qualificado por ele como uma tentativa de assassinato, ainda há dúvidas a serem respondidas. Há, pelo menos, duas versões: um ataque de drones, segundo o governo venezuelano e assumido pelo desconhecido Movimento Nacional dos Soldados com Camisetas, e a explosão de um tanque de gás perto de onde Maduro discursava.
Uma das primeiras providências do governo foi acusar a oposição, a Colômbia e os Estados Unidos pelo que aconteceu. As três partes negaram o envolvimento. E, segundo o Ministério do Interior e Justiça, pelo menos seis pessoas já teriam sido presas. Os autores intelectuais e materiais do suposto atentado também teriam sido identificados.
A preocupação é de Maduro aproveite a oportunidade para fazer mais prisões e realizar expurgos nas Forças Armadas. A Venezuela enfrenta uma situação econômica e social crítica. “Perdemos metade do PIB em cinco anos”, disse Henkel Garcia, diretor da consultoria Econométrica.
O que ocorreu no sábado?
O ditador Nicolás Maduro diz ter sido vítima de uma tentativa de atentado, na tarde de sábado, enquanto discursava durante a solenidade de comemoração dos 81 anos da Guarda Nacional, em Caracas.
Segundo ele, drones portando explosivos tinham ele como alvo. Só que, apesar das dezenas de câmeras espalhadas pelo local do evento, nenhuma detectou a presença dos equipamentos.
Maduro escapou ileso ao incidente. Segundo as autoridades, sete pessoas ficaram feridas em meio ao pânico desencadeado pela explosão. O presidente afirmou que um “escudo de amor” o protegeu.
Quais são as versões para o caso?
Há duas versões para o episódio: a oficial, na qual Maduro seria alvo de um ataque de drones e que o desconhecido Movimento Nacional de Soldados de Camiseta assumiu ser o autor, e uma levantada pela agência de notícias Associated Press, que sinaliza para a explosão de um tanque de gás perto de onde Maduro discursava.
O ministro do Interior e Justiça, Néstor Reverol, disse que dois drones voaram sobre a solenidade militar e que, cada um, tinha um quilo do explosivo C4. Um deles teria caído em um prédio e explodido. “As investigações evidenciaram que se trata de um delito de terrorismo e magnicídio”, disse ele ao jornal El Nacional.
Apesar de líderes da oposição duvidarem da versão do governo, dois moradores de um prédio, próximo ao local onde Maduro discursava, disseram neste domingo que viram o drone e assistiram à explosão. “O drone parecia ter o tamanho de meia bicicleta. Veio do céu e pensamos que tivesse um menino brincando com ele”, disse Pedro Peña, que estava em um apartamento no sétimo andar com Gladys Miquelena.
Os dois disseram que, segundos após terem visto o equipamento, ele explodiu. “Ficamos com medo. Soou como uma bomba.”
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Um grupo desconhecido autointitulado "Movimento Nacional de Soldados de Camiseta" assumiu responsabilidade pela autoria do suposto atentado, chamando o incidente de "Operação Fênix". Em uma conta nas redes sociais, o grupo divulgou fotos e vídeos do momento do incidente, quando Maduro fazia discurso pelos 81 anos da Guarda Nacional, em Caracas, neste sábado (4).
"A operação era sobrevoar dois drones carregados com [explosivo] C4 com direção ao palco presidencial. Franco-atiradores da guarda de honra derrubaram os drones antes de chegarem ao alvo. Demonstramos que são vulneráveis. Não conseguimos, mas é questão de tempo", disse uma das mensagens do grupo. O movimento divulgou, em sua conta no Twitter, uma imagem de um dos drones sendo destruído.
Eles se dizem um conjunto de "militares e civis patriotas e leais ao povo da Venezuela, baseados em argumentos leais e constitucionais", e afirmam tem respaldo de "oficiais, suboficiais, classes e soldados" que estariam "dispostos a oferecer suas vidas".
A agência de notícias Associated Press informou, no sábado, que três bombeiros no local disseram que um tanque de gás explodiu. "Não é verdade que foi um vazamento de gás", disse Peña. "O gás chega aqui por meio de tubos. Eu acho que foi um drone com explosivos dentro dele."
"Não foi um vazamento de gás. Temos gás direto", disse Catherine Pita, 24 anos, outra vizinha. "Foi um zumbido que atingiu o prédio e causou o incêndio. Uma garota foi atingida por uma janela de vidro na cabeça e foi levada para o hospital."
Como a Venezuela reagiu?
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, responsabilizou grupos de direita, como ele qualifica os oposicionistas, e o governo da Colômbia pelo que Caracas tem chamado de tentativa de assassinato contra o mandatário. Os acusados são, tradicionalmente, responsabilizados pelo ditador como sendo responsáveis pelos atuais problemas enfrentados pela Venezuela.
O Ministério de Interior e Justiça informou que seis pessoas foram presas em decorrência do incidente, vários veículos foram apreendidos e que foram feitas várias investigações em hotéis. O ministro Néstor Reverol, aponta que há evidências, em vídeo, dos supostos colaboradores do incidente.
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“Os autores materiais e intelectuais foram identificados”, disse ele ao jornal El Nacional. Reverol afirmou que um dos detidos tinha participado das manifestações de 2014 e tinha recebido um benefício processual. Outro dos envolvidos teria participado do ataque ao Forte Paramacay, em agosto de 2017. O governo venezuelano não descarta realizar novas prisões.
Freddy Bernal, aliado de Maduro e chefe nacional dos Comitês Locais de Abastecimento e Produção, publicou em uma rede social fotos de sete pessoas na faixa dos 20 anos, instando os venezuelanos a buscar "esses traidores".
Onze jornalistas e funcionários de meios de comunicação foram presos, segundo o Sindicato Nacional de Trabalhadores na Imprensa da Venezuela. Posteriormente, foram liberados.
O que dizem os grupos acusados por Maduro?
O governo da Colômbia rechaçou a acusação de Maduro de que o presidente Juan Manuel Santos seria articulador do atentado. "Já é costume que Maduro culpe a Colômbia de qualquer tipo de situação que ocorra internamente", afirmou a nota da chancelaria de Bogotá.
Além dos vizinhos colombianos, Maduro disse que alguns dos responsáveis pelo atentado estão na Flórida e afirmou que espera que o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, colabore no combate a "grupos terroristas que pretendem assassinar presidentes". "É claramente um desespero da direita por causa das medidas econômicas que estamos implantando", disse Maduro.
Na semana passada, o país detalhou o plano de reconversão monetária. A medida prevê a eliminação de cinco zeros do bolívar a partir de 20 de agosto e a retirada de restrições às operações cambiais. O objetivo é atacar a inflação galopante.
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Um funcionário da Casa Branca negou que os EUA estão por trás da suposta explosão de drones que teria como alvo o ditador venezuelano, Nicolás Maduro. "Posso dizer sem equívoco que o governo dos EUA não está envolvido", disse John Bolton, conselheiro nacional de segurança, ao canal Fox.
"Se o governo da Venezuela tem informações que demonstram violação de leis e quer apresentar aos EUA, vamos analisar seriamente", acrescentou.
O conselheiro americano, John Bolton, ainda sugeriu que o próprio Maduro pudesse estar por trás dos acontecimentos, mencionando a corrupção e opressão na Venezuela. "Poderia ser muitas coisas, incluindo um pretexto armado por Maduro", diz.
O que poderá acontecer daqui para a frente?
A oposição venezuelana acusa Maduro de se aproveitar do suposto ataque para intensificar sua repressão política. Segundo opositores, incidentes como esse já foram usados como motivo para ações contra críticos do regime.
É possível que haja mais prisões e expurgos militares daqui em diante. O incidente causou ondas de choque na Venezuela, um país que já está no limite. A nação sul-americana enfrenta uma crise política e econômica turbulenta. Segundo o Fundo Monetário Internacional (FMI), para este ano é prevista uma inflação de 1.000.000% e a economia deverá encolher 18%.
Dezenas de oficiais e soldados foram presos nos últimos anos pelo governo em conexão com supostas tentativas de golpe de Estado. Em junho de 2017, um ex-piloto da Polícia Científica e ator voou com um helicóptero sobre prédios do governo e lançou granadas contra a Suprema Corte e o Ministério do Interior.
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Centenas de soldados abandonaram seus postos desde que Maduro - ex-motorista de ônibus e sucessor de Hugo Chávez, que morreu em 2013 - venceu uma eleição em maio, considerada como fraudulenta pela oposição e por dezenas de países, incluindo os Estados Unidos.
O ditador tentou reunir seus partidários para defender a nação após sugestões do presidente Trump de que uma solução militar continua na mesa para forçar Maduro a restaurar a democracia.
Analistas sugerem que Maduro provavelmente usará o incidente para conduzir mais expurgos contra tropas militares suspeitas de deslealdade. "Ele usará o incidente para radicalizar; provavelmente, para fazer um expurgo nas forças armadas, fortalecer sua guarda pessoal e embelezar a narrativa sobre estar sob ataque dos Estados Unidos, Colômbia e outros em uma tentativa de obter solidariedade e apoio", disse Eric Farnsworth, vice-presidente da Sociedade das Américas e do Conselho das Américas.
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