Quando o presidente dos EUA, Donald Trump, e o ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-un, apertarem as mãos pela primeira vez e se sentarem frente a frente nesta terça-feira (12), a cordialidade que planejam projetar irá mascarar o imenso abismo entre seus dois países enquanto diplomatas lutam para fechar um acordo em que a ditadura norte-coreana abandone suas armas nucleares.
A decisão de Trump e Kim de iniciar a cúpula em Cingapura em uma conversa a sós, sem seus principais assessores ou especialistas em armas nucleares, aponta que o objetivo real é desenvolver um relacionamento pessoal e encenar um espetáculo global em vez de abordar os detalhes técnicos de um acordo de desnuclearização.
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Ambas as nações buscaram reduzir as expectativas de um avanço imediato pós-encontro. Trump descreveu a cúpula como o primeiro passo no que poderia ser um processo demorado, abrindo a possibilidade de convidar Kim para os Estados Unidos para uma segunda reunião. Em uma indicação de que Kim tem a mesma opinião, a mídia estatal norte-coreana descreveu um processo de normalização das relações com os Estados Unidos que se desdobraria com o tempo.
Quando os dois líderes se encontrarem, eles planejam apertar as mãos e dar um passeio cerimonial diante das câmeras no Hotel Capella, na ilha tropical de Sentosa, de acordo com um alto oficial dos EUA. Depois de uma ou duas horas de discussões privadas apenas com seus intérpretes, Trump e Kim serão acompanhados por seus principais conselheiros para uma reunião bilateral mais tradicional.
As conversas para um eventual acordo de armas nucleares já estava em andamento nesta segunda-feira (11), quando os representantes de Trump e Kim se reuniram no Ritz-Carlton Hotel. Elas seguiram as negociações que já haviam sido iniciadas no mês passado, em maio, em Nova York e na zona desmilitarizada da Península Coreana.
As sessões de trabalho, incluindo aquelas conduzidas pelo secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, trataram repetidamente de questões básicas sobre o que a cúpula deveria ser e mostraram uma incapacidade de preencher lacunas fundamentais na compreensão sobre a desnuclearização norte-coreana.
Um obstáculo fundamental nas negociações tem sido o que virá primeiro: os norte-coreanos querem uma garantia de segurança, o que significa uma promessa de que os Estados Unidos não atacarão ou tentarão derrubar Kim; os americanos querem um compromisso substancial de desnuclearização.
Victor D. Cha, um ex-funcionário de segurança nacional que negociou com a Coreia do Norte no governo George W. Bush, disse: "Não é surpresa que eles estejam emperrados". "Eles nem conseguem ultrapassar a primeira base nas garantias de segurança porque os norte-coreanos nunca definirão o que realmente significa para eles acabar com a política hostil", disse Cha, que foi considerado por Trump para ser embaixador na Coreia do Sul.
A grande questão: o que significa desnuclearização?
As conversas entre Coreia do Norte e EUA nesta segunda-feira foram lideradas pelo veterano diplomata americano Sung Kim e o principal diplomata norte-coreano para assuntos dos EUA, Choi Sun-Hee. Eles ainda estavam tentando redigir uma declaração conjunta, estabelecendo as áreas de entendimento entre Trump e Kim. Normalmente, essas declarações pré-preparadas, ou comunicados, são elaboradas muito antes das cúpulas.
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Negociadores dos EUA não conseguiram fazer com que os norte-coreanos oferecessem uma garantia substancial sobre a desnuclearização, que tem sido a principal exigência do governo Trump.
A questão atormentou uma reunião de 27 de maio, em Panmunjom, entre diplomatas norte-americanos e norte-coreanos, segundo uma pessoa familiarizada com as negociações. As conversas começaram com o lado norte-coreano, liderado por Choe, dizendo que a desnuclearização não deveria ser assunto da cúpula de Cingapura - uma posição rejeitada pelos americanos como algo inaceitável.
Os dois lados não se encontraram por dois dias, em parte porque a delegação norte-coreana não tinha autoridade para negociar sem orientação adicional de Pyongyang. No dia 30 se reuniram brevemente para uma sessão que fez poucos progressos para a resolução do impasse.
Ao mesmo tempo, a Coreia do Norte enviou o ex-chefe de espionagem Kim Yong Chol para se reunir com Pompeo em Nova York. O norte-coreano também não se comprometeu com a desnuclearização - e embora Pompeo tenha dito que os dois fizeram um bom progresso, a reunião de 31 de maio foi concluída duas horas antes do esperado.
“O encontro [de Cingapura] é histórico, mas um verdadeiro teste de sucesso será se ele realmente levar a um progresso concreto, constante e rápido em direção aos objetivos gêmeos de desnuclearização e alívio das tensões na península coreana”, disse Daryl Kimball, executivo diretor da Associação de Controle de Armas. "Por definição, isso requer um entendimento comum do que 'desnuclearização' e 'paz' significa e quais devem ser as principais medidas de ação".
Um alto oficial da Casa Branca reconheceu a dificuldade de ambos os lados em avançar para tópicos mais complicados de um acordo nuclear, mas disse que o encontro entre Trump e Kim vai superar as discussões no nível de equipe e conduzirá ao resultado.
Um porta-voz do Departamento de Estado se recusou a comentar, dizendo que o governo dos EUA não discutirá "os detalhes de nossas discussões diplomáticas privadas".
Falta de confiança
Evelyn Farkas, vice-secretária adjunta de Defesa do governo Obama, especialista em políticas para a Ásia, disse: "O maior problema para os negociadores é a falta de confiança, de ambos os lados".
"O ponto crítico, historicamente, é que os norte-coreanos insistem que nós façamos o primeiro movimento", disse Farkas. “No passado, fizemos isso e não deu certo. A equipe de negociação especializada dos EUA está bem ciente dessa história e estará trabalhando em horas extras para garantir que os norte-coreanos ganhem nossa confiança ao tomar ações irreversíveis cedo, se não primeiro”.
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Trump havia cancelado a cúpula de Cingapura no mês passado devido ao que as autoridades americanas chamaram de obstrução por parte da Coreia do Norte. Depois de receber uma carta pessoal de Kim, o presidente dos Estados Unidos voltou atrás e manteve o encontro.
Dois funcionários norte-americanos familiarizados com o planejamento da cúpula disseram que os norte-coreanos se tornaram mais comunicativos e cooperativos após o anúncio de Trump, no dia 1º de junho, de que a reunião entre os dois líderes estava de pé - mas apenas até certo ponto. Reuniões de fim de semana eram escassas em discussões nucleares técnicas, segundo essas autoridades, e não pareciam quase nada com a meticulosa preparação para cúpulas de controle de armas do passado, inclusive entre os Estados Unidos e a União Soviética.
A delegação dos EUA em Cingapura não inclui especialistas de alto nível em inspeção e verificação nuclear, embora o diplomata sênior dos EUA, Sung Kim, seja um veterano do último esforço de controle de armas nucleares com a Coreia do Norte, o chamado “Diálogo a Seis”, que teve início em 2003.
Contraste
O entusiasmo de Trump pelo que ele chamou de "território desconhecido" de seu encontro com Kim é totalmente diferente de suas frágeis discussões com os aliados dos Estados Unidos na cúpula do Grupo dos Sete, que ocorreu no Canadá nos dias 8 e 9 de junho (sábado e domingo).
Trump chegou ao encontro do G-7 tarde e saiu cedo. Embora ele tenha dito que suas relações com o Canadá, França, Alemanha e outros aliados tradicionais representados na reunião são “10”, ele rompeu com o grupo com um tuíte furioso acusando os membros do G-7 de práticas comerciais desleais.
O G-7 é o tipo de organização tradicional, educada e consensual que Trump instintivamente desconfia. Ele reclamou com antecedência que não queria participar de palestras de outros líderes, e alguns funcionários da Casa Branca refletiram sobre o envio do vice-presidente Mike Pence em seu lugar.
Em contrapartida, Trump parecia empolgado com a perspectiva do encontro com Kim e a oportunidade de seguir por um caminho ousado que ele mesmo começou a desbravar.
“Isso provavelmente é raro. É território desconhecido, no verdadeiro sentido ”, disse Trump antes de deixar o Canadá para ir a Cingapura.
"Mas eu realmente me sinto confiante", acrescentou. “Eu sinto que Kim Jong-un quer fazer algo grande pelo seu povo, e ele tem essa oportunidade. E ele não terá essa oportunidade novamente. Ela nunca vai estar disponível novamente”.
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