Menino faz sinal de vitória em acampamento de refugiados sírios na fronteira da Turquia| Foto: Zohra Bensemra/Reuters

Com apoio do Brasil, a Assem­­bleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) aprovou on­­tem resolução condenando violações dos direitos humanos na Síria. Ontem, a repressão no país matou pelo menos 70 pessoas, segundo ativistas, e a onda de revolta se intensificou na região norte síria.

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O relatório na ONU foi aprovado por 137 votos favoráveis, 12 contrários e 17 abstenções. A de­­legação brasileira votou a favor do documento.

Pouco antes da votação, o se­­cretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, pronunciou-se con­­tra as mortes. "Todo dia o número [de mortos na Síria] sobe. Vemos bairros sendo bombardeados in­­discriminadamente e hospitais sendo usados como centros de tortura."

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Segundo estimativa da ONU, mais de 5,4 mil pessoas morreram em 11 meses, e há milhares desaparecidos por se oporem ao regime sírio.

O texto aprovado pede que o ditador Bashar Assad transfira o poder ao vice, que seria responsável pela formação de um governo de união, pela convocação de eleições e pela permissão de acesso humanitário ao local.

A aprovação na assembleia tem força simbólica, já que as me­­didas propostas não são obrigatórias, mas denota pressão crescente sobre a Síria.

O Brasil já votara na Assem­­bleia Geral da ONU contra o regime de Assad, em novembro de 2011. Na semana passada, o chanceler brasileiro, Antonio Patriota, classificou a situação na Síria co­­mo "gravíssima" e "preocupante".

No início deste mês, o Con­­se­­lho de Segurança (órgão decisório do organismo) votou documento em que apontava abusos. O relatório foi vetado por China e Rús­­sia.

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O vice-chanceler da China, Zhai Jun, deve viajar hoje ao país. Ele afirmou ontem que sanções ou ameaças não são caminhos para a resolução dos conflitos.

Segundo diplomatas, a condenação na Assembleia Geral era uma "mensagem forte" não só a Assad, mas aos países que ainda oferecem suporte ao regime. Além de China e Rússia, Venezuela e Coreia do Norte votaram contra a resolução na ONU.

EntrevistaAbdul Halim Khaddam, ex-vice-presidente sírio, hoje na oposição.

"A única solução para salvar o povo sírio é por força militar"

Ele foi um dos únicos políticos sunitas a chegar ao primeiro escalão do regime da Síria, controlado pela minoria alauíta. Mas, hoje, Abdul Halim Khaddam, de 79 anos, passou de pilar do Partido Baath e homem de confiança de Hafez al-Assad a arqui-inimigo do filho dele, Bashar al-Assad. Exilado em Paris, o ex-vice-presidente que renunciou em 2005 disse à Agência O Globo, por email, que a solução para a Síria passa pela militarização do conflito.

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O senhor criou um órgão político, o Comitê Nacional de Apoio à Revolução, mas não aderiu ao maior bloco opositor, o Conselho Nacional Sírio (CNS). Por quê?

O CNS é parte da oposição, mas não é a principal oposição. Não aderimos por termos pontos de vista distintos; acreditamos que a única solução para salvar o povo sírio requer a formação de uma coalizão militar internacional, fora do Conselho de Segurança da ONU, para proteger e salvar os civis sírios e permitir que alcancem seus objetivos. Coalizões assim já foram formadas sob a tutela da Otan na antiga Iugoslávia e na Costa do Marfim.

A oposição fragmentada não facilita o processo político? Como o senhor explica essa incapacidade de se criar consenso?

O regime sírio não deixou nenhuma chance de articulação aos partidos opositores. Todos foram criados no exílio, em circunstâncias e localidades diversas. Não fomos nós, da oposição, que deflagramos a revolução, mas estamos ajudando e apoiando de várias formas. Temos orientações distintas intelectual, política e ideologicamente. Por isso, a dispersão.

O senhor aposta no Exército Livre da Síria (ELS) como o melhor instrumento para confrontar as Forças Armadas?

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O ELS é formado por um grupo de militares patriotas que se recusaram a matar cidadãos e, portanto, seu papel atual é defender os civis. Para isso, devem receber um apoio considerável, tanto em termos de armas e como de recursos financeiros. O ELS será um catalisador importante, determinante, para a libertação da Síria.

Muitos especulam que o presidente Bashar Assad esteja querendo deflagrar uma guerra sectária generalizada. O senhor consegue identificar qual a estratégia dele?

Bashar Assad ordenou que unidades do Exército, formadas em sua maioria por oficiais da comunidade dele, a alauíta, matassem cidadãos e usassem os mais ultrajantes meios de assassinato e repressão em vilas e cidades de população sunita. Bashar Assad está treinando um grande número de alauítas para operações de combate com apoio da Guarda Revolucionária do Irã, que também tem ajudado o Exército a invadir cidades, matar e prender civis. O objetivo é aumentar a tensão sectária e incitar os alauítas contra a maioria sunita do país, para forçar essa minoria a ficar ao lado do regime, protegendo-o. Em um encontro com um de seus aliados libaneses, Bashar disse que não vai desistir ou fazer concessões. Se pressionado ao extremo, ele vai incitar a guerra sectária e mudar-se para a região costeira da Síria, onde declararia um "Estado alauíta".