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O presidente da Argentina, Alberto Fernández, fala durante coletiva de imprensa na Casa Rosada, em abril de 2022.
O presidente da Argentina, Alberto Fernández, fala durante coletiva de imprensa na Casa Rosada, em abril de 2022.| Foto: EFE/Juan Ignacio Roncoroni

O país comandado pelo peronista Alberto Fernández deve refinanciar uma dívida de 45 bilhões de dólares (cerca de R$ 238 bilhões) com o FMI. A inflação, que chegou a 83% em setembro, deve alcançar 100% até o final de 2022. Além disso, mais de um terço da população continua na pobreza. Nesse cenário, a hemorragia de reservas em dólar e a multiplicação das taxas de câmbio estão reconfigurando a situação econômica e financeira dos argentinos, que preferem consumir e gastar imediatamente ou investir em criptomoedas do que guardar dinheiro no banco.

Os economistas chamam isso de "fuga para o consumo", uma característica de períodos de inflação e desvalorização antecipada da moeda. Nesse cenário, os restaurantes da capital, Buenos Aires, registram o maior consumo dos últimos sete anos, conforme dados oficiais. O turismo interno também se beneficia dessa lógica. Um fim de semana prolongado no início do mês marcou novo recorde, segundo o governo, com 2 milhões de viagens em um país de 46 milhões de habitantes.

Santiago Manoukian, economista da Ecolatina, em entrevista ao Le Monde, observou outra consequência desse fenômeno econômico: os argentinos tendem a recorrer ao mercado paralelo, onde pouco mais de 150 pesos são necessários para comprar um dólar, contra mais de 280 pesos na cotação oficial. "Nesse contexto, consumir é uma escolha racional”, analisa Manoukian.

Outra forma que os argentinos encontraram para driblar o risco de guardar dinheiro, segundo o Estudo de Inteligência de Mercado das Américas, foi comprar criptomoedas. Doze em cada cem argentinos estão fazendo esse tipo de investimento.

Esse percentual é o dobro da média da América Latina, enquanto nos Estados Unidos 16% da população comprou criptomoedas no final de 2021.

O Morning Consult é mais otimista. Segundo o instituto, cerca de um terço dos argentinos disseram que compram ou vendem criptomoedas pelo menos uma vez por mês (o dobro do que os americanos). E mais da metade dos consultados na pesquisa revelam que "proteger suas economias" é um dos principais benefícios desse tipo de investimento.

Embora o mercado de criptomoedas tenha se fragilizado nos últimos meses, muitos argentinos o veem como um porto seguro em um país onde a inflação crescente e a crise econômica atingiram a moeda nacional e as contas bancárias.

O peso derrete como sorvete 

"O dinheiro aqui é como sorvete", disse Marcos Buscaglia, economista de Buenos Aires, ao New York Times. "Se você guardar o peso por muito tempo, ele derreterá tanto quanto o que você poderá comprar com ele", analisa.

Os problemas da cadeia de suprimentos mundial e a guerra na Ucrânia contribuíram para o aumento dos preços, mas economistas culpam, sobretudo, os problemas da Argentina por anos de gastos excessivos do Estado. Como o governo não arrecada o suficiente para compensar o déficit, o banco central imprime pesos, fazendo com que a inflação suba ainda mais.

"O grande problema da Argentina é que não há dólares suficientes para cumprir com suas obrigações", apontou, em entrevista à Gazeta do Povo, Flavio González, advogado e professor da Universidade de Buenos Aires.

Ele descreveu que os governos kirchneristas não querem enfrentar os problemas de déficit fiscal, a emissão monetária descontrolada e a desvalorização do peso. González também observou que os impostos e a legislação do país não são atraentes para investimentos estrangeiros e que as políticas argentinas não têm credibilidade internacional, além de promoverem a pobreza.

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