Um novo acordo mundial para a migração, idealizado pela ONU (Organização das Nações Unidas), foi confirmado nesta segunda-feira (10) pela maioria dos países que fazem parte da organização. Dezenas de nações, entretanto, seguiram os Estados Unidos, crítico do documento desde o seu lançamento, e se recusaram a participar.
A aprovação do texto ocorreu em uma conferência em Marrakech, no Marrocos, e foi feita por aclamação. A ONU não anunciou nem o número exato nem quais países apoiaram o documento, mas a agência de notícias Associated Press afirmou que foram 164.
O Pacto Global para a Migração das Nações Unidas foi finalizado em julho, com apoio quase unânime entre os 193 países da ONU —inicialmente apenas os Estados Unidos ficaram de fora.
Ele prevê, por exemplo, que o migrante que estiver irregular no país não poderá ser deportado imediatamente e terá o caso analisado individualmente. O texto diz ainda que ele terá acesso a justiça, saúde, educação e informação.
O pacto proíbe também deportações coletivas e discriminação na análise sobre a permanência ou não do migrante no país. E recomenda que a detenção de migrantes seja o último recurso, e que, se necessária, a pessoa fique o menor tempo possível detida. Os países também vão analisar dados e benefícios da migração e a contribuição dos migrantes ao desenvolvimento sustentável.
O documento foi o resultado de um esforço europeu para evitar repetições do drama de 2015. Naquele ano, mais de um milhão de pessoas buscaram refúgio na Europa, muitas vezes a pé e sob condições dolorosas. Ao assinar o pacto, os países se comprometem a respeitar os direitos humanos dos refugiados e migrantes econômicos, reduzir a detenção de migrantes e oferecer-lhes serviços sociais básicos.
Pelas estimativas da ONU, há mais de 258 milhões de imigrantes no mundo, e esse número deve continuar crescendo nos próximos anos. Desde 2000, pelo menos 60 mil deles morreram na tentativa de entrar em outro país.
Para entrar em vigor, o pacto ainda precisa ser ratificado pela Assembleia Geral da ONU, o que está previsto para ocorrer no próximo dia 19.
Debandada
Nos últimos meses, diversos governos desistiram de participar do acordo, afirmando que ele poderia incentivar a imigração ilegal e ameaçava a soberania nacional. O mais recente foi o Chile, que anunciou no domingo (9) sua retirada.
De acordo com Ministério do Interior, pontos do documento "não se aplicam" à política de imigração chilena.
O texto, que é não vinculante (não tem a força de uma lei), foi considerado pelo Chile, assim como fizeram os EUA em dezembro de 2017, uma ameaça à soberania nacional e "uma espécie de camisa de força sobre o que cada país" pode fazer em relação à política de imigração.
Em novembro, o governo da Áustria, que detém a presidência da União Europeia, também já tinha afirmado que iria se retirar, dizendo que o acordo poderia obscurecer a linha entre migração legal e ilegal. A Austrália também disse que não assinaria o acordo de migração porque ele comprometeria sua política de imigração e colocaria em risco a segurança nacional.
“O pacto não consegue distinguir adequadamente entre pessoas que entram ilegalmente na Austrália e aquelas que vêm para a Austrália da maneira correta, particularmente no que diz respeito à prestação de bem-estar e outros benefícios", criticou o primeiro-ministro australiano, Scott Morrison.
Israel, Itália, Polônia, Hungria, Holanda e Eslováquia também não se juntaram ao pacto global. Segundo a agência de notícias AFP, ao menos 15 países, a maioria europeus, se recusaram a participar do acordo.
Em uma resposta a esses países, o secretário-geral da ONU, António Guterres, afirmou na abertura do encontro no Marrocos que pretende combater as "mentiras e mitos" que envolvem o acordo. "Não devemos sucumbir ao medo", disse. Segundo ele, o documento “garante o direito soberano dos estados de determinar suas políticas de migração” e “não é juridicamente vinculativo”, deixando as portas abertas para caso estes países mudem de ideia.
Na Bélgica, assinatura do pacto pode custar o governo
Na Bélgica, a decisão do primeiro-ministro, Charles Michel, de comprometer seu país com o pacto para a imigração levou o partido nacionalista Nova Aliança Flamenga, de direita, a deixar a coalizão governista no sábado. A Nova Aliança, que detinha o poder sobre a política de migração e procurava acelerar as deportações da Bélgica, declarou que participar do pacto significava abrir mão da soberania sobre as fronteiras do país. Ao partir para a conferência da ONU em Marrakesh, onde assinará o documento, Michel disse que buscaria um governo minoritário.