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O novo presidente da Argentina, Javier Milei, que assumiu o cargo no último domingo (10), já enfrenta uma forte oposição dos setores da esquerda política e sindical do país, que prometem “resistir” às suas medidas econômicas de corte de gastos, controle da inflação e reformas estruturais.
Milei, que chegou à presidência defendendo pautas relacionadas ao livre mercado, já anunciou um pacote com medidas econômicas nesta terça-feira (12), onde destacou o corte de gastos e o controle financeiro.
Desde quando o libertário assumiu oficialmente o comando da Casa Rosada, membros da esquerda argentina, que inclui desde movimentos sociais e sindicatos até partidos políticos, já anunciaram que não vão aceitar “passivamente” as reformas econômicas e os ajustes propostos por Milei, e que vão se mobilizar nas “ruas e nas instituições” para “defender” o que afirmam serem os “direitos dos trabalhadores, dos pobres e dos excluídos”.
Alguns dos principais líderes e representantes da esquerda argentina criticaram duramente o discurso de posse do novo presidente, que foi feito na escadaria do Congresso, diante da população, e não no recinto parlamentar.
Um dos mais contundentes foi Juan Grabois, dirigente do Movimento dos Trabalhadores Excluídos (MTE), que também foi pré-candidato à presidência pela coalizão peronista União pela Pátria, que acusou, por meio de uma postagem no X (antigo Twitter), Milei de fazer um discurso de posse “messiânico”, com uma “análise rasa” para "justificar as medidas de choque na economia, ajuste do Estado, privatizações e demissões”. Grabois deixou claro que a esquerda argentina fará uma "oposição política e ideológica frontal, ‘intelectualmente honesta’, mas implacável em seus princípios” durante a presidência do economista libertário.
Outros deputados e senadores de esquerda também já manifestaram seu descontentamento com Milei. Entre eles estão José Mayans, líder do bloco peronista do União pela Pátria no Senado; Liliana Paponet, deputada peronista pela província de Mendoza; a socialista Myriam Bregman, ex-candidata à presidência pela Frente de Esquerda e dos Trabalhadores; Juan Carlos Giordano, deputado socialista eleito pela coalizão de Bregman, e Jesús Escobar, ex-candidato à presidência pelo movimento esquerdista Livres do Sul.
Importantes sindicatos e centrais de trabalhadores ligados a movimentos de esquerda do país sul-americano também já “avisaram” que não irão “permitir” que Milei “avance” sobre o que disseram ser “direitos trabalhistas, os salários e as condições de trabalho”. Entre os sindicalistas que se pronunciaram contra Milei estão Rodolfo Aguiar, secretário-geral da Associação de Trabalhadores do Estado (ATE); Pablo Biró, da Associação de Pilotos de Linhas Aéreas; Héctor Daer, da Confederação Geral do Trabalho (CGT); e Esteban Castro, ex-secretário-geral da União de Trabalhadores da Economia Popular (UTEP).
Foi Biró, inclusive, quem reagiu dizendo que Milei teria que “matar os sindicalistas” se quisesse privatizar a companhia aérea Aerolíneas Argentinas. O presidente, que ainda não havia tomado posse, deu uma entrevista para uma emissora local onde confirmou sua intenção de privatizar a companhia, que é deficitária, mas a ideia não foi bem recebida por Biró, que afirmou que “sem financiamento do Estado, a Aerolíneas não tem como funcionar”.
O governo de Milei também anunciou na segunda-feira (11) que fará um corte de gastos na máquina pública reduzindo o que chamou de “empregos militantes” dentro do Estado. Reagindo ao anúncio do novo governo, Rodolfo Aguiar, secretário-geral da ATE, disse que já convocou uma reunião da Associação para quinta-feira (14), onde as “lideranças provinciais” definirão o “plano de ação” e as “posições diante da nova gestão".
"Já passamos por vários períodos de ameaças e retirada de direitos, incluindo a trágica ditadura militar genocida", disse Aguiar, lembrando que "todos os trabalhadores” que sua associação conhece “desempenham funções na administração pública do Estado há anos" e que alguns estão sendo taxados de "militantes” porque lutam “há décadas em defesa dos direitos do povo”, que, segundo ele, são “garantidos” com os “esforços diários" dos servidores públicos.
Segundo informações da mídia local, a esquerda argentina pretende atrapalhar as reformas e os planos de Milei realizando protestos e até mesmo paralisações pelo país. Os movimentos e sindicatos já convocaram as primeiras manifestações contra o novo governo para os dias 19 e 20 de dezembro, datas que coincidem com o aniversário da grave crise de 2001, que provocou uma convulsão social e política no país e levou à renúncia dos presidentes Fernando de la Rúa (1999-2001) e Adolfo Rodríguez Saá (2001). Os movimentos, sindicatos e líderes esquerdistas pretendem “denunciar” durante esses protestos o que apontam ser o “risco de uma nova explosão social” que pode ser causada, segundo eles, pelas medidas econômicas do governo de Milei.
Além dos protestos, a esquerda argentina também se prepara para fazer frente a Milei no Congresso do país, onde terá uma representação parlamentar significativa. Os peronistas e kirchneristas do União pela Pátria terão 35 senadores e 108 deputados. Um dos principais objetivos é usar o Senado, onde terão um maior número de parlamentares, como base para fazer oposição ao governo libertário.
Ao formar seu gabinete, Milei construiu pontes com outras forças políticas para encontrar aliados para o seu governo dentro do Congresso argentino. O presidente conseguiu unir na composição de sua administração libertários, apoiadores do ex-presidente Mauricio Macri (2015-2019) e membros do partido União Cívica Radical (UCR), bem como alguns nomes que já atuaram ao lado de peronistas no passado, como Daniel Scioli, que continuará no cargo de embaixador da Argentina no Brasil. No entanto, o economista ainda terá que negociar, principalmente no Senado, para tentar aplicar com sucesso o seu plano de governo.