Os novos fortes ataques a cidades ucranianas nesta segunda-feira (10) serviram de represália à explosão da Ponte de Kerch, que liga a Rússia à Crimeia, no sábado (08), conforme anunciou o presidente russo, Vladimir Putin. Simbolicamente, a ponte serve como um cordão umbilical entre russos e o território ucraniano anexado à Federação Russa em 2014.
Na inauguração da estrutura, em 2018, Putin passou pela ponte conduzindo um caminhão, tamanho orgulho o líder russo sentia de ter executado a obra que representa o avanço de suas ambições imperialistas.
Por isso, mais do que à Rússia, o ataque foi dirigido ao chefe do Kremlin, pois a ponte da Crimeia, construída com grandes custos, está associada ao seu nome e à anexação da península ucraniana declarada por ele em 2014.
A explosão dessa ponte selou a contraofensiva ucraniana, que no último mês levou tropas russas às fronteiras e reconquistou importantes territórios, como Kharkiv e Luhansk.
Fragilidade da Rússia
Os ataques que sucederam a explosão da ponte de Kerch podem servir como uma tentativa de esconder fragilidades da Rússia. Para o cientista geopolítico Pascal Le Pautremat, o incidente representa "uma verdadeira derrota" do país comandado por Putin.
"É a prova do fim para Putin. A explosão traz à tona a vulnerabilidade de todo o seu sistema, incluindo a área considerada como russa", destaca o especialista em entrevista ao jornal francês Le Figaro. "É realmente um golpe de mestre, porque essas operações exigem grupos pequenos e altamente móveis, pertencentes às forças especiais ou aos serviços secretos, com uma coordenação muito forte de meios logísticos e sincronização", descreve La Pautremat.
O analista ainda lembra que o ataque também criou problemas táticos e estratégicos aos russos. O evento paralisou - ou pelo menos atrasou - o abastecimento das tropas em toda a frente sul, a grande área ao redor de Kherson.
Apesar da retomada parcial do tráfego ainda na noite de sábado, por segurança, em vez de ferrovias e estradas, os militares russos terão que usar transporte marítimo ou seguir rotas mais longas, ficando mais expostos a possíveis ameaças dos ucranianos.
A Crimeia serve como base logística de retaguarda e Moscou não contava com a necessidade de reformar a ponte, que deverá ficar comprometida por pelo menos dois meses, conforme previram as autoridades.
Pressão ao Kremlin
Os serviços de segurança russos publicaram, no domingo à noite, um documento indicando que os bombardeios ucranianos nas regiões fronteiriças do sul da Rússia (Belgorod, Bryansk, Kursk) "aumentaram significativamente" desde o início de outubro, com 100 bombardeios afetando 32 localidades e com um civil morto.
A contraofensiva ucraniana em setembro e os ataques do começo deste mês reforçaram as críticas no país direcionadas especialmente aos militares e ao ministro da Defesa, Sergei Shoigu, além de enfraquecerem a imagem de Putin.
A pressão sobre o Kremlin surge, sobretudo, dos nacionalistas. O ataque de sábado foi acompanhado por apelos renovados para "endurecer" a ofensiva na Ucrânia, reforçando o discurso dos mais radicais de que a operação "ainda não começou realmente".
Um dos líderes desse grupo, o checheno Ramzan Kadyrov, foi promovido por Putin a general das Forças Armadas na última quarta-feira (05), depois de criticar as estratégias do país e sugerir o uso de armas nucleares. Kadyrov se reuniu com uma multidão de combatentes (70 mil, segundo ele) na sexta-feira (07). Eles estariam prontos para partir para a Ucrânia.
Putin viu a explosão como uma ultrapassagem da linha vermelha, através de "um ataque terrorista" realizado pelo serviço secreto ucraniano". Diante de tanta pressão a ele e ao Kremlin, a resposta do mandatário dificilmente seria outra senão atacar com mais força o país vizinho.
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