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Como a Ford recuperou um símbolo da decadência de Detroit
Ford comprou prédio da Michigan Station em 2018 para transformá-lo em um grande centro comunitário e de inovação tecnológica| Foto: Jason Keen/Michigan Central

Detroit, localizada no estado do Michigan, nos EUA, outrora conhecida como o coração pulsante da indústria automotiva americana, tinha visto sua glória desvanecer ao longo das últimas décadas.

A partir dos anos 1960, a chegada dos carros japoneses, a pressão dos sindicatos, a tensão racial e as administrações municipais ineficazes contribuíram para um declínio acentuado da cidade americana.

No entanto, a recente revitalização da Michigan Central Station (Estação Central de Michigan), liderada pela Ford, pode estar simbolizando o renascimento esperançoso da chamada “Motor City”.

A Michigan Central Station, inaugurada em 1914, já foi uma importante estação trem, mas havia se tornado um ícone da decadência de Detroit. Fechada desde 1988, a estação era frequentemente destacada em fotografias de ruínas urbanas, que enfatizavam a situação de abandono da cidade. Durante anos, o imponente edifício permaneceu vazio, deixando apenas uma saudosa lembrança dos tempos áureos que a “Motor City” já viveu.

Detroit enfrentou desafios significativos em sua situação econômica, principalmente nas últimas décadas do século 20. Naquele período, a concorrência acirrada gerada pela chegada dos fabricantes japoneses de veículos e as demandas inflexíveis dos sindicatos, bem como os altos impostos e as restrições do poder público local, criaram um ambiente de produção insustentável para a indústria automobilística americana que dava vida à cidade.  

Em meio a este cenário, diversas fábricas optaram por deixar Detroit em busca de se reinventar em outros locais – com menos burocracia e menos gastos.

Após anos enfrentando problemas, em 2013, Detroit tornou-se a maior cidade americana a declarar falência municipal, o que destacou, de vez, os desafios financeiros extremos enfrentados pela cidade.

A Ford, no entanto, viu uma oportunidade onde outros viam apenas desolação. Em 2018, a empresa adquiriu a Michigan Central Station por US$ 90 milhões, com um plano ambicioso: restaurar e revitalizar todo o local, com o objetivo de impulsionar maneiras de trazer Detroit de volta à vida.

O projeto monumental traçado pela empresa envolveu a reforma da estação e de seus arredores, transformando toda a área em um grande centro de inovação tecnológica e comunitário. A Ford investiu cerca de US$ 1 bilhão nesta ideia, que trouxe um novo significado a um dos edifícios mais icônicos de Detroit.

Segundo a empresa americana, nos últimos seis anos, mais de 3 mil trabalhadores qualificados dedicaram seu esforço, criatividade e mais de 1,7 milhão de horas para restaurar a estação. A meticulosa reforma incluiu desde a recuperação de pequenos detalhes arquitetônicos até a restauração de colunas coríntias feitas à mão.

A estação reformada não receberá mais trens — algo que ainda se pode discutir no futuro — no entanto, abrigará escritórios, restaurantes, lojas e até um hotel, ancorando também um distrito de inovação focado em mobilidade e transporte, disse a empresa.

Uma volta por cima?

Como mencionou a Ford, o esforço de revitalização da estação faz parte de um movimento mais amplo para recuperar Detroit. Desde a falência, a cidade parece ter começado a dar a volta por cima, conquistando um ressurgimento econômico, com investimentos em infraestrutura básica, como reparo de calçadas, iluminação pública, coleta regular de lixo e demolição de estruturas que foram abandonadas e que eram utilizadas por vândalos e dependentes químicos.

A recuperação da indústria automotiva local desempenhou um papel crucial nesse movimento. Segundo informações da CNN, as chamadas "três grandes" de Detroit — Ford, General Motors e Chrysler, essa última atualmente controlada pela Stellantis — passaram por uma reinvenção significativa, tornando-se novamente importantes criadoras de empregos na cidade.

O aumento da demanda dessas empresas por proximidade às bases de produção também resultou no reaproveitamento de algumas antigas instalações industriais, o que tem contribuído para a regeneração urbana.

Os indicadores econômicos recentes mostram sinais promissores para Detroit, conforme a CNN. A taxa de desemprego na região metropolitana da cidade estava em 3,8% em abril, ligeiramente abaixo da média nacional de 3,9%. Pela primeira vez em décadas, Detroit também “sorriu” com um aumento populacional, o que pode sinalizar uma recuperação gradual da cidade que já foi uma das mais populosas dos EUA.

A criminalidade, no entanto, ainda é uma preocupação, embora os dados de 2023 mostrem uma redução significativa nos casos de tiroteios, roubos de carros e homicídios em comparação ao ano anterior.

Segundo as estatísticas da Polícia de Detroit, divulgadas no começo deste ano, em 2023 houve uma redução de 15% nos tiroteios e de 33% nos roubos de carros em comparação ao ano anterior. O total de homicídios no ano foi de 252, uma diminuição de 18% em relação a 2022 e o menor número registrado desde 1966, quando foram contabilizados 232 homicídios. Tais indicadores trouxeram um “sopro de esperança” para a cidade.

A Ford espera que a estação reformada, em seu “cenário urbano vibrante”, se torne um local de encontro comunitário e familiar, já que ela contará com lojas de varejo, restaurantes, espaço para eventos e até um hotel.

“A estação de Michigan significa muito para todos nós. De muitas maneiras, este edifício conta a história da nossa cidade”, diz Bill Ford, bisneto de Henry Ford e atual presidente executivo da Ford.

“Esta estação foi a nossa Ellis Island (ilha onde fica a estátua da liberdade) — um lugar onde sonhadores em busca de novos empregos e novas oportunidades pisavam pela primeira vez em Detroit. Mas, uma vez que o último trem partiu, tornou-se um lugar onde a esperança se foi. Em 2018, decidi que era hora de mudar isso, reimaginando esta estação como um lugar de possibilidades novamente”, afirma.

“Eu queria que a estação de Michigan fosse lindamente restaurada, mas também reimaginada para muito mais”, continua Bill Ford, acrescentando que “este será um lugar para a comunidade desfrutar e um destino para visitantes de todas as partes. Teremos restaurantes, música, arte e ótimas lojas. E a inovação que acontecerá aqui, com startups e empresas grandes e pequenas, ajudará a garantir que Detroit preserve seu título de Motor City para as próximas gerações.”

A Ford afirma que “a estação reunirá a comunidade mais ampla de Detroit para colaborar e testar ideias em um só lugar, fortalecendo os compromissos de longa data do Michigan Central com o crescimento do ecossistema local de mobilidade, envolvendo novas vozes e promovendo uma maior participação e desenvolvimento da comunidade. Isso inclui um andar dedicado a programas para jovens na torre da estação, que oferece mais de 2 mil metros quadrados de espaço flexível para abrigar organizações locais e nacionais focadas no crescimento da próxima geração”.

A estação foi reinaugurada no último dia 7, contando com a presença de mais de 20 mil pessoas. O local foi palco de um show com artistas da cidade e as pessoas puderam ver de perto o resultado da revitalização.

"Este foi um dia que os habitantes de Detroit esperaram por 40 anos, e valeu a pena esperar", disse o prefeito Mike Duggan, do Partido Democrata, na reinauguração do prédio.

"Graças à visão de Bill Ford e aos nossos incrivelmente talentosos artistas de Detroit, nossa cidade celebrou um dia especial que será lembrado para sempre, e pessoas assistindo de todo o país viram mais um exemplo do talento de Detroit e sua contínua revitalização”, concluiu Duggan.

Abaixo, você pode fazer um tour virtual pela estação reformada. Bom passeio!

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