Os líderes dos quatro partidos da coalizão de direita: Matteo Salvini, Silvio Berlusconi, Giorgia Meloni e Maurizio Lupi.| Foto: EFE/EPA/GIUSEPPE LAMI
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Com os efeitos que vem causando na geopolítica e na economia mundial por meio da invasão à Ucrânia, a Rússia sem dúvida exerce papel de protagonista (ou antagonista?) em escala global em 2022. Nas eleições gerais da Itália, que serão realizadas no próximo domingo (25), essa influência tem aparecido com muita força.

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A coalizão de direita que lidera as pesquisas (e que pode transformar Giorgia Meloni na primeira mulher premiê do país) diverge internamente sobre as sanções a Moscou, principal aposta – ao lado da ajuda militar a Kyiv – para uma vitória ucraniana no conflito iniciado em fevereiro.

Matteo Salvini, líder da Liga, um dos partidos da coalizão, disse no início de setembro que a aliança conservadora seguirá apoiando a Ucrânia, mas colocou em dúvida a continuidade das retaliações econômicas ao país de Vladimir Putin.

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“Se assumirmos o governo, vamos mudar nossas alianças? Não. Permanecemos profunda, orgulhosa e firmemente enraizados em um Ocidente livre e democrático que se opõe à guerra e à agressão”, declarou. “Mas se adotamos um instrumento para prejudicar o agressor e depois de sete meses de guerra ele não foi ferido, pelo menos considerar uma mudança parece legítimo para mim.”

Meloni, líder do Irmãos da Itália (FdI), partido que encabeça a coalizão, tem reiterado que um eventual governo de direita manteria as políticas do atual premiê Mario Draghi nessa questão, para que seja mantida a “credibilidade internacional” do país – ou seja, ajuda militar à Ucrânia e sanções contra a Rússia.

A associação com Putin assombra a Liga e outro partido da coalizão, o Força Itália (FI), liderado pelo ex-primeiro ministro Silvio Berlusconi (a quarta legenda da aliança é o Nós Moderados). A Liga já foi investigada pela Justiça italiana pela suspeita de ter recebido dinheiro de Moscou e Salvini manifestou no passado admiração pelo presidente russo, de quem Berlusconi é amigo.

Na semana passada, os serviços secretos dos Estados Unidos divulgaram que a Rússia teria financiado políticos de outros países com US$ 300 milhões. Embora partidos italianos não tenham sido citados, a Liga, o FdI e o FI se apressaram em negar o recebimento de recursos.

Meloni anunciou uma ação judicial contra o jornal Repubblica e contra Kurt Volker, ex-embaixador dos Estados Unidos na OTAN, que disse à publicação: “Sabemos há anos que os russos utilizam recursos financeiros para influenciar eleições em todo o Ocidente. Eles tentam promover a divisão em nossas sociedades e entre nossos países. Esses US$ 300 milhões não deram muito resultado, mas melhoraram as perspectivas de alguns partidos, como o de [Marine] Le Pen na França e o FdI na Itália”.

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Nesta quinta-feira (22), Berlusconi, que havia criticado o presidente russo no início da guerra, disse à emissora pública italiana RAI que Putin “foi pressionado pelo povo russo, por seu partido, por seus ministros para criar essa operação especial” – citando o termo utilizado pelo Kremlin para se referir à invasão da Ucrânia.

Berlusconi alegou ainda que o plano inicial da Rússia era conquistar Kyiv “em uma semana” e substituir o presidente ucraniano Volodymyr Zelensky por “um governo de pessoas decentes” e sair “na outra semana”.

Outra saia-justa nesta última semana de campanha foi uma publicação no Twitter feita pela Embaixada da Rússia na Itália que mostrou fotos de Putin ao lado de políticos italianos, como o ex-primeiro ministro Matteo Renzi, Salvini, Berlusconi e o líder da coalizão de esquerda, Enrico Letta, principal adversário de Meloni na eleição de domingo.

As imagens foram acompanhadas por uma mensagem provocativa: “Da história recente das relações russo-italianas. Há algo para lembrar”.

Maioria já apoia retirada das sanções

Em agosto, o ex-presidente russo Dmitry Medvedev pediu que políticos que defendam sanções contra Moscou sejam derrotados nas eleições que estão sendo realizadas este ano na Europa.

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“Gostaríamos de ver os cidadãos europeus não apenas indignados com as ações de seus governos, mas também que os responsabilizassem e punissem por sua óbvia estupidez”, escreveu no Telegram. “Tomem medidas, vizinhos europeus. Não fiquem em silêncio. Exijam que sejam responsabilizados.”

Também no mês passado, o Comitê de Inteligência do Parlamento italiano apontou, em seu relatório anual, que a Itália sofre de “uma fraqueza substancial em suas intervenções para combater a desinformação e as várias formas de interferência” no ambiente da ciberguerra – e mencionou a Rússia como uma dessas ameaças.

“Editar e divulgar notícias falsas, campanhas de mídia social e o uso de trolls estão se estabelecendo como ferramentas sofisticadas e abrangentes de influência da Rússia e outros atores estatais”, indicou o documento.

Independentemente de haver interferência russa ou não no processo eleitoral italiano, o aumento da inflação (o índice interanual ficou em 8,4% em agosto, o maior em mais de 36 anos), especialmente no setor de energia, já vem provocando uma queda no apoio da população às sanções à Rússia.

Numa pesquisa recente do instituto Termometro Político, 51% dos entrevistados disseram ser favoráveis a retirá-las para aliviar as pressões na economia italiana.

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Michele Geraci, ex-subsecretário do Ministério do Desenvolvimento Econômico da Itália e próximo da cúpula da Liga, deixou no ar a possibilidade de revisão das sanções caso a coalizão de direita seja realmente a vencedora no próximo domingo.

“Ambos [Meloni e Salvini] querem sanções que ponham fim à guerra – esse é o objetivo. Há muita confusão sobre se as sanções estão funcionando ou não. Salvini está aos poucos entendendo que não estão, enquanto Meloni talvez ainda não tenha entendido isso. Após a campanha eleitoral, quando tiverem tempo para avaliar adequadamente o impacto, talvez eles decidam abandoná-las [sanções] ou tentar modificá-las”, afirmou, em entrevista ao jornal inglês The Guardian.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]