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Terrorismo

Como alguém se torna um jihadista?

Em meio a veículos blindados e armamentos pesados, militantes do Estado Islâmico desfilam pelas ruas de Raqqa, na Síria, para celebrar a tomada de poder na região, em junho do ano passado | STRINGER
Em meio a veículos blindados e armamentos pesados, militantes do Estado Islâmico desfilam pelas ruas de Raqqa, na Síria, para celebrar a tomada de poder na região, em junho do ano passado (Foto: STRINGER)

Na França – palco dos ataques ao jornal satírico Charlie Hebdo e em uma mercearia judaica que chocaram a Europa e o mundo –, na Espanha, na Alemanha ou no Reino Unido, o roteiro se repete: muçulmanos com dificuldade de se integrarem, em um continente onde a perspectiva para jovens de todas as religiões já é difícil por causa de uma crise econômica sem fim, se deixam seduzir pelo canto da jihad, a guerra santa contra o Ocidente em nome do Islã.

Abordados na internet ou em mesquitas, esses jovens, a maioria deles filhos de imigrantes, mas nascidos na própria Europa, se radicalizam e viajam à Síria e ao Iraque, principal palco atual da jihad, para lutar ao lado do Estado Islâmico (EI) ou de facções da Al-Qaeda, ou para treinar para voltar à Europa e praticar atentados como os que ocorreram em Paris.

Reportagem tenta explicar como acontece esse processo de radicalização desafiador aos governos europeus, que apesar de se engajarem na luta contra o EI no Iraque e de mudarem a legislação de seus países para tentar conter o fascínio da jihad sobre seus próprios cidadãos, parecem não encontrar respostas para evitar novos massacres como o do Charlie Hebdo.

Trilha para a radicalização se tornou mais complexa e sinuosa ao longo dos anos

Nos anos 1990, os franceses que partiam para combater no Afeganistão se resumiam a algumas dezenas. Um número apenas um pouco superior foi registrado na década seguinte.

Nos últimos anos, no entanto, os candidatos à jihad se tornaram milhares, muitos dispostos a morrer e, principalmente, matar pelo radicalismo religioso inflamado nas entranhas do Estado Islâmico, de grupos rebeldes na Síria ou de organizações terroristas como a Al-Qaeda do Iêmen.

Amedy Coulibaly, Chérif e Saïd Kouachi eram anônimos franceses antes de aterrorizarem o país e entrarem para a história da barbárie terrorista, com 17 mortes em três dias. Jovem delinquente, Coulibaly mergulhou no banditismo comum. Os órfãos irmãos Kouachi, quando foram acolhidos entre 1994 e 2000 no centro educativo "Les Monedières", na pequenina cidade de Treignac, na região da Corrèze, gostavam de rap e de futebol.

A trilha para a jihad e a radicalização se tornou ao longo dos anos cada vez mais complexa e sinuosa, diz Myriam Beenraad, especialista em mundo árabe e muçulmano do Instituto de Estudos Políticos de Paris (Sciences-Po). Para escrever seu ensaio "Iraque: a Revanche da História" – com lançamento previsto para março, na França –, ela pesquisou a célula parisiense "Buttes-Chaumont", de envio de jihadistas franceses para o Iraque, na qual atuaram Coulibaly e os irmãos Kouachi. Sua análise aponta quatro fatores principais de favorecimento da radicalização hoje no país: crise identitária, condição socioeconômica, dilema existencial e a prisão.

Participar de um grupo, ainda que terrorista, dá um sentido para a vida

O que motivou cerca de 400 jovens, quase todos nascidos na Alemanha, a abandonar família e emprego para se dedicar à jihad? Enquanto o governo acaba de lançar um pacote de medidas para combater os jihadistas made in Germany – entre elas o confisco da carteira de identidade –, pais, professores e sociólogos buscam uma explicação sobre os motivos que levaram esses jovens, a maioria homens, à decisão de dimensão tão dramática.

A jornalista Souad Mekhennet, coautora do livro Os Filhos da Jihad, entrevistou muitos jihadistas na Alemanha e na Síria, onde chegou a falar com islamistas alemães que lutam no grupo terrorista Estado Islâmico.

"Os motivos são diversos, mas um dos principais é a falta de orientação. Participando de uma organização, mesmo que terrorista, eles descobrem um sentido para suas vidas", diz.

Heiner Keupp, que vem analisando o fenômeno há anos, afirma que as causas são tão diversas quanto o background socioeconômico dos novos jihadistas. Em comum, os islamistas dispostos à luta têm uma espécie de "sede de poder". Complexados pela falta de importância que acham que têm, eles passam a alimentar com a jihad a fantasia de poderosos. Uma forma deturpada do machismo também pode estar envolvida no fenômeno.

"Com o questionamento do papel de submissão das mulheres, o tradicional machismo entrou em crise, o que muitos homens consideram uma perda. Sobretudo os jovens muçulmanos sofrem com a redução do papel masculino", diz Keupp.

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