No último dia da sua cúpula em Joanesburgo, nesta quinta-feira (24), os Brics, grupo de economias emergentes formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul, surpreendeu ao anunciar que, a partir do início de 2024, deve dobrar seu número de membros: Argentina, Arábia Saudita, Egito, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Irã vão entrar para o grupo.
Os Brics, que na prática nunca evoluíram para um grupo de países coeso e eficiente, já carregavam uma disputa interna, com China e Índia reivindicando territórios na fronteira entre os dois países. Com os novos membros, outras disputas também estarão no centro do bloco, ameaçando seu futuro.
A Argentina terá ao seu lado no grupo o Irã, que teve participação nos grandes atentados à embaixada de Israel em Buenos Aires em 1992 e à Associação Mutual Israelita Argentina (Amia) em 1994, que deixaram 29 e 85 mortos, respectivamente.
Nesta quinta-feira, a candidata de centro-direita à presidência argentina, Patricia Bullrich, disse que esse histórico levará a uma retirada argentina dos Brics caso ela seja eleita em outubro.
O candidato libertário Javier Milei, que venceu as primárias do último dia 13, manifestou a mesma posição, ao afirmar que o “alinhamento geopolítico” de um eventual governo seu será “com os Estados Unidos e Israel”.
O Irã também tem diferenças com outro novo membro dos Brics, a Arábia Saudita. Apesar de terem anunciado em março o restabelecimento das relações diplomáticas após sete anos de laços rompidos (acordo que ocorreu com mediação da China), os dois países têm um histórico de conflitos por procuração no Oriente Médio. O mais recente é a guerra no Iêmen – cujo cessar-fogo, em vigor desde abril do ano passado, por vezes é desrespeitado.
A incerteza também paira sobre outro acordo, que visa solucionar um conflito entre Egito e Etiópia, também novatos dos Brics. Os dois países travam há vários anos uma disputa diplomática (que esteve perto de descambar para a guerra em alguns momentos) devido a uma grande barragem etíope que está sendo construída no rio Nilo Azul, com os egípcios manifestando preocupações a respeito da sua segurança hídrica.
Em julho, Egito e Etiópia concordaram em fechar um acordo sobre a disputa dentro de quatro meses, medida que foi considerada um grande avanço, mas que, levando-se em conta os anos de tensões, tem um desfecho incerto.
Para complicar as relações entre futuros membros dos Brics, na segunda-feira (21) a organização Human Rights Watch (HRW) divulgou um relatório que acusou a guarda de fronteira saudita de matar a tiros centenas de migrantes etíopes na fronteira com o Iêmen.
Riad negou nesta quinta-feira a acusação e responsabilizou supostos “grupos armados” - os quais não identificou -, segundo a agência de notícias oficial saudita SPA.
E é preciso considerar que essa lista não leva em conta as disputas econômicas – a Índia, por exemplo, que roubou dos chineses o posto de país mais populoso do mundo este ano, está tirando cada vez mais investimentos da China devido à interferência da ditadura de Xi Jinping na economia local.
Em entrevista à Rádio França Internacional (RFI), Michael Dillon, professor de história do King's College de Londres, afirmou que a expansão dos Brics, um bloco que, “depois de todos estes anos, ainda é uma organização que está em processo de evolução e de definição sobre o que vai fazer”, lembra a Conferência de Bandung, realizada por países asiáticos e africanos em 1955.
No encontro, a China fez muita pressão em nome do chamado Movimento dos Não-Alinhados, também propondo uma alternativa à ordem geopolítica mundial do momento – exatamente o argumento para a expansão dos Brics agora.
“Bem, os resultados não foram muito produtivos naquela época e não estou convencido de que serão agora, por causa dos conflitos internos entre os países-membros. E acho que alguns dos novos membros vão apenas trazer novos conflitos”, afirmou Dillon. (Com Agência EFE)
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