Os números são bem conhecidos: na Apple, 20% dos cargos tecnológicos são ocupados por mulheres e na Google, só 17%.
Um relatório da Comissão Econômica Conjunta do Congresso estima que nos Estados Unidos 14% dos engenheiros na força de trabalho são mulheres.
Como mulher com doutorado em engenharia biomédica, vejo esses números com desespero. Por que tão poucas engenheiras?
Muitos motivos foram apresentados: sexismo no trabalho, falta de exemplos profissionais femininos, estereótipos sobre a incompetência inata das mulheres, as dificuldades de combinar as carreiras com a maternidade.
As soluções propostas incluem programas de mentores, grupos de apoio a estudantes e iniciativas de recrutamento dirigido.
Esses esforços começaram nas universidades e nas empresas, incluindo um compromisso com a diversidade da Intel de US$ 300 milhões (R$ 870 milhões).
Mas talvez haja uma solução muito mais simples, e até óbvia. Uma experiência na Universidade da Califórnia em Berkeley, onde sou professora, sugere que se o conteúdo do próprio trabalho tiver maior significado social as mulheres se candidatarão.
Isso se aplica não só à engenharia da computação, mas também a campos tradicionais igualmente dominados por homens, como engenharia mecânica e química.
O Centro Blum para Economias em Desenvolvimento, onde trabalho, iniciou recentemente um programa que, sem qualquer comunicação dirigida, conseguiu 50% de inscrições femininas em apenas um ano acadêmico.
No outono de 2014, a U.C. Berkeley começou a oferecer um doutorado em engenharia de desenvolvimento para estudantes que fazem teses sobre soluções para comunidades de baixa renda.
A metade dos estudantes matriculados na aula inaugural eram mulheres. Elas criam soluções acessíveis para água potável, inventando equipamento para diagnósticos de doenças tropicais negligenciadas e possibilitando a criação de fábricas em regiões pobres e remotas.
As mulheres parecem ser atraídas por projetos de engenharia que visam o bem social. Curiosa para saber se isso ocorria em outras universidades, meus colegas e eu contatamos as dezenas de instituições que têm programas voltados à redução da pobreza e da desigualdade. O que descobrimos foi consistente e notável.
O programa internacional em graduação para engenheiros na Universidade de Michigan relata que 51% dos alunos são mulheres.
Elas estão se formando predominantemente em alguns dos mais tradicionais campos da engenharia —operações industriais, mecânica e química— onde, possivelmente, os estereótipos de gênero são mais arraigados.
No Laboratório-D interdisciplinar do Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), enfocado no desenvolvimento de “tecnologias para melhorar a vida das pessoas que vivem na pobreza”, 74% dos mais de 230 estudantes inscritos no ano passado eram mulheres.
A Universidade Estadual do Arizona informou que seus cursos e opções de estudos em engenharia humanitária têm o dobro de mulheres que suas turmas tradicionais de engenharia.
Programas comparáveis na Universidade de Minnesota, na Universidade Estadual da Pensilvânia e na Universidade Santa Clara também registram aumentos significativos no número de mulheres participantes.
A tendência vale igualmente para cursos isolados. Susan Amrose, do curso de projetos para comunidades sustentáveis na U.C. Berkeley, contou 128 alunas mulheres e 103 homens desde o início do curso em 2006.
“No último outono, tivemos 70% de mulheres”, ela comentou. “Muitas delas me dizem que buscam trabalho em projetos técnicos com um objetivo forte, como aperfeiçoar os fogões de baixo consumo de combustível.”
Clubes e programas dirigidos por estudantes veem os mesmos padrões. Em Princeton, em Nova Jersey, o capítulo dos estudantes da Engenheiros Sem Fronteiras tem um conselho executivo com 70% de mulheres, mesmo percentual do programa Scholars de Engenharia Sustentável e Desenvolvimento.
Nenhum dos programas, clubes e cursos foi criado com o objetivo de atrair mulheres engenheiras, e talvez seja por isso que estão nos interessando. No núcleo de cada programa há um enfoque para a engenharia que é de vanguarda, com um contexto e uma missão social explícitos.
O que tudo isso mostra? Que a chave para aumentar o número de engenheiras talvez não sejam apenas programas de mentores ou creches, embora estes sejam importantes. Pode ter a ver com reformular os objetivos da pesquisa e os currículos de engenharia para que sejam mais relevantes às necessidades sociais.
Lina Nilsson é diretora de inovação no Centro Blum para economias em Desenvolvimento na Universidade da Califórnia em Berkeley
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