Democratas do Comitê de Inteligência da Câmara dos Deputados dos Estados Unidos apresentaram 3,5 mil anúncios do Facebook adquiridos por russos, ao longo da campanha eleitoral para a presidência daquele país, sobre assuntos que vão da imigração ao controle de armas. É uma lembrança da complexidade sobre a manipulação que o Facebook está tentando conter em meio às eleições de meio de mandato.
Os anúncios, de meados de 2015 a meados de 2015, mostram como as forças alinhadas ao Kremlin procuraram alimentar a agitação social, cultural e política em uma das mais poderosas plataformas da Web. Com a ajuda de ferramentas do Facebook, eles direcionaram a desinformação para categorias específicas de usuários, desde negros e gays a fãs da Fox News.
Ao fazê-lo, o exército online russo atingiu, pelo menos, 146 milhões de pessoas no Facebook e no Instagram, seu serviço de compartilhamento, com anúncios e outros posts. Às vezes, russos tentaram alimentar protestos, esforçando-se, por exemplo, para colocar fãs e críticos da Beyoncé, uns contra os outros, em 2016, em Nova York.
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A apresentação dos anúncios acontece meses após executivos do Facebook, Google e Twitter terem testemunhado em audiências no Congresso sobre as ações de propaganda russa, uma campanha detonada pela Agência de Pesquisa na Internet, que é patrocinado pelo Kremlin. Estas companhias, desde então, se comprometeram a examinar os anúncios políticos de maneira mais agressiva, e o Facebook, em particular, disse que começaria a rotular anúncios sobre candidatos.
O deputado Adam Schiff, da California, o principal democrata no Comitê de Inteligência da Câmara, disse que os parlamentares iriam continuar a provar os esforços de desinformação feitos de forma online pela Rússia. Em fevereiro, Robert Mueller, o conselheiro especial que investiga a Rússia e a interferência nas eleições de 2016, indiciou pessoas ligadas à agência russa por tentar interferir nas eleições presidenciais.
“Eles procuraram aproveitar as frustrações e a raiva dos americanos sobre temas sensíveis para poder influenciar a forma de pensar, a votação e o comportamento”, disse Schiff em um anúncio. “A única forma de começarmos a nos prevenir de um ataque futuro é ver, em primeira mão, os tipos de mensagens, temas e imagens que os russos usaram para nos dividir.”
Por sua vez, o Facebook frisou em um anúncio: “este nunca será um problema resolvido porque estamos enfrentando adversários determinados, criativos e bem financiados, mas estamos fazendo progressos constantes.”
Anúncios são parte da história
No total, anúncios adquiridos por agentes ligados à agência apoiada pelo Kremlin alcançaram cerca de 10 milhões de usuários nos Estados Unidos ao longo da eleição de 2016, de acordo com estimativas do Facebook. Mas os anúncios são apenas uma parte da história: eles procuraram fazer com que os eleitores americanos clicassem em “curtir” ou acompanhassem perfis e páginas do Facebook criados pela Rússia, que publicavam conteúdos orgânicos, como atualizações de status, vídeos e outras postagens, que mais tarde apareceriam nos feeds de notícias dos usuários.
Facebook tinha previamente estimado que perfis e páginas ligados à Rússia geraram 80 mil conteúdos sobre a eleição de 2016, diretamente em seus news feeds ou porque seus amigos os compartilharam. Outras 20 milhões de pessoas viram conteúdo gerado pela agência russa no Instagram. Schiff disse que democratas estão trabalhando com o Facebool para fornecer a maior quantidade de dados possíveis.
“Nós pretendemos ser capazes de mostrar o alcance do que os russos fizeram nas mídias sociais para influenciar o eleitorado norte-americano”, disse.
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Em muitos casos, os anúncios pró-Kremlim mostram vários lados de um mesmo tema. Contas como a dos Muçulmanos Unidos da América pediam, em março de 2016, o fim da islamofobia e do medo dos muçulmanos. A mesma conta, dias depois, criou uma carta aberta em outro anúncio e acusava o ex-presidente Bill Clinton de não apoiar os muçulmanos antes da eleição.
Em outras contas ligadas à agência pró-Kremlin procurava-se atingir os muçulmanos: um anúncio destacado pelo Comitê de Inteligência da Câmara chamou o presidente Barack Obama de traidor, porque agiu como peão na mão dos xeques árabes. Por dois anos, os agentes russos ofereceram anúncios similares sobre questões como racismo. Eles confiaram nos recursos do Facebook para segmentar categorias específicas de usuários.
Influência em atividades externas
De tempos em tempos, agentes russos tentavam influenciar as atividades externas dos usuários do Facebook: um anúncio da página Black Matters – desenvolvida pela agência russa – promoveu, em 26 de março de 2016, uma manifestação contra a herança confederada, na qual 161 pessoas disseram que iriam comparecer. Outra, do Heart of Texas sugeria os internautas a “honrarem seus ancestrais” e unirem-se a uma manifestação pedindo a independência do Estado, um post que foi compartilhado por 266 pessoas antes que o Facebook removesse conteúdos gerados pela Rússia.
No Instagram, um dos anúncios publicados em fevereiro de 2016, visava pessoas como policiais, bombeiros e militares, recomendando-os a comparecer a um protesto de Beyonce. Ao mesmo tempo, outra conta – direcionada ao público negro – direcionou pessoas para um protesto pró-Beyonce no mesmo local. Nenhum dos esforços pareceu ganhar força, de acordo com dados fornecidos pelo Facebook aos parlamentares democratas. Mas deu um bom exemplo da medida em que os trolls russos procuravam explorar os dois lados de grandes debates nacionais.
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Os documentos apresentados na quinta mostram que agentes russos continuaram fazendo publicidade após a eleição presidencial. Até agosto de 2017, páginas e perfis alinhados à Rússia manifestavam oposição à imigração, atingindo uma ampla variedade de usuários, inclusive aqueles que aparentavam gostar da Fox News. Eles comercializaram uma página chamada Born Liberal para prováveis defensores do senador Bernie Sanders. Os dados mostram que um anúncio teve mãos de 49 mil impressões em 2017. Juntos, os anúncios mostravam os temores de alguns parlamentares, incluindo republicanos, de que os agentes russos continuaram tentando influenciar a política dos Estados Unidos mesmo depois da eleição de 2016.
Agentes russos também criaram milhares de contas no Twitter, e, em janeiro, a empresa revelou que descobriu mais de 50 mil contas automáticas ou bots com ligações com a Rússia; Também notificou que cerca de 1,7 milhões de usuários foram vítimas da propaganda russa durante as eleições de 2016. E o Google descobriu um pequeno número de anúncios comprados pela agência russa na plataforma de vídeos You Tube.