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Crise humanitária

Como Maduro utiliza o sofrimento dos migrantes venezuelanos como arma política

Migrantes venezuelanos embarcam em Arica, no Chile, no avião que os levaria de volta ao seu país natal no último domingo (7) (Foto: EFE/Lucas Aguayo Araos)

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No último domingo (7), a Venezuela iniciou o processo de repatriação de cidadãos do país retidos na fronteira entre o Chile e Peru, com um voo que levou 115 migrantes venezuelanos de volta à nação governada pelo ditador Nicolás Maduro.

A crise migratória no Peru se tornou notícia internacional no final de abril, quando o governo peruano decretou emergência e anunciou a militarização das suas fronteiras pelo prazo de 60 dias, devido ao grande número de venezuelanos e haitianos no país.

Muitos migrantes ilegais da Venezuela que tentavam voltar do Chile para o seu país atravessando o território do Peru ficaram retidos na região de fronteira. Além do realizado no domingo, mais voos de repatriação devem ocorrer nos próximos dias.

Os motivos principais para esse desejo de sair do Chile têm sido a crise econômica no país governado por Gabriel Boric (embora a situação venezuelana seja muito pior) e as novas políticas migratórias rígidas implantadas pelos chilenos, como, por exemplo, a facilitação das expulsões administrativas de migrantes ilegais.

O episódio mostrou como Maduro utiliza o sofrimento dos migrantes venezuelanos para fazer política: o voo de domingo foi inserido no programa Volta à Pátria, criado em 2018 com o objetivo de repatriar cidadãos que deixaram o país devido à crise política, econômica e social.

O chanceler venezuelano, Yván Gil, apontou que a repatriação do último fim de semana foi “uma operação 100% apoiada pelo Governo Bolivariano da Venezuela”. Entretanto, em termos gerais, o Volta à Pátria é um fracasso, já que uma porcentagem mínima dos mais de 7 milhões de venezuelanos que deixaram o país devido ao chavismo retornou por meio do programa.

“Não há números recentes. Os números anteriores à pandemia apontavam que cerca de 30 mil pessoas retornaram à Venezuela por meio do plano. Ou seja, nem 1% da população que saiu do país retornou pelo plano Volta a Pátria”, afirmou a socióloga venezuelana Ligia Bolívar, em entrevista ao jornal chileno La Tercera.

Há relatos que apontam que muitos dos venezuelanos retidos querem deixar o Chile, mas não necessariamente voltar à Venezuela. Bolívar concorda e citou que, durante a pandemia de Covid-19, de 200 mil a 250 mil pessoas regressaram à Venezuela por não terem redes de apoio social nos países onde estavam. Porém, grande parte voltou a emigrar.

“Quando voltaram ao país, foram recebidas por um governo hostil, um governo que não apenas os prendeu, mas os acusou de bioterrorismo. Essas foram as palavras do governo. Elas foram processadas ​​por bioterrorismo, porque foi dito que o governo colombiano estava infectando venezuelanos propositalmente e os enviando de volta para a Venezuela na pandemia, o que era completamente falso”, explicou Bolívar.

Em uma manifestação clara do uso da migração como arma política, Maduro fez essas acusações quando a Colômbia era presidida por um desafeto, Iván Duque.

No mesmo domingo em que foi realizado o primeiro voo dos venezuelanos retidos entre o Chile e o Peru, a ditadura chavista utilizou o sofrimento de compatriotas em outra parte do mundo para alfinetar um notório inimigo geopolítico: os Estados Unidos.

Após oito estrangeiros, alguns deles venezuelanos, serem mortos por atropelamento em frente a um centro de migrantes no Texas, o governo Maduro pediu em nota que as autoridades americanas investigassem se o episódio teve relação com “as práticas de ódio e xenofobia contra o povo venezuelano que já foram expressados no passado, produto de uma cultura de violência e intolerância promovida por setores extremistas da política e da sociedade estadunidenses (sic)”.

Não foi mencionada no comunicado qualquer ajuda aos feridos e aos parentes dos mortos: a ditadura chavista apenas falou em “sinceras condolências”.

Invisibilidade

Uma indiferença ainda pior havia sido registrada após outra tragédia recente na América do Norte: no final de março, um incêndio ocorrido em um posto do Instituto Nacional de Migração (INM) do México em Ciudad Juárez, na fronteira com os Estados Unidos, deixou 40 mortos e dezenas de feridos.

Entre as vítimas, estavam imigrantes colombianos, equatorianos, salvadorenhos, guatemaltecos, hondurenhos e venezuelanos.

“Todos os governos de todos os países cujos cidadãos estiveram envolvidos nesta tragédia responderam imediatamente: Guatemala, Honduras, El Salvador, Colômbia. O único país que não respondeu foi a Venezuela. Nunca, em nenhum momento, houve uma atitude de empatia por parte das autoridades venezuelanas no Ministério das Relações Exteriores, no consulado ou na embaixada da Venezuela no México”, destacou Ligia Bolívar.

“O governo não tem absolutamente nenhum interesse no plano Volta à Pátria, na proteção dos direitos e garantias dos venezuelanos. Eles são usados ​​simplesmente para fins de propaganda”, acrescentou.

Rafael Uzcátegui, coordenador do Programa Venezuelano de Ação e Educação em Direitos Humanos (Provea), disse à Voz da América que o governo venezuelano não possui qualquer política pública de acompanhamento e proteção dos cidadãos que deixaram o país devido à tragédia do chavismo.

“As autoridades não reconhecem a situação porque seria reconhecer que existe um modelo econômico, social e político que não está respondendo às necessidades dos venezuelanos”, comentou. Invisíveis, os migrantes venezuelanos só passam a existir para Maduro no momento de fazer política.

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