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Acidente marítimo

Como o sumiço da tripulação de um navio revelou um escândalo na Marinha colombiana

Ilustração do El Espectador sobre o náufrago que sobreviveu ao ARC Caldas | Reprodução/El Espectador
Ilustração do El Espectador sobre o náufrago que sobreviveu ao ARC Caldas (Foto: Reprodução/El Espectador)

Sensores do mundo todo detectaram uma forte explosão no Atlântico Sul, no que foi o último sinal do ARA San Juan. Pouco se sabe sobre o que ocorreu com o submarino argentino, que levou um ano para ser encontrado. Há seis décadas, outro sumiço de uma tripulação militar levou a Marinha de um país latinoamericano do céu ao inferno em questão de semanas. No lugar da Patagônia argentina, o cenário desta história foi o Mar do Caribe — em plena ditadura colombiana.

Em 28 de fevereiro de 1955, o governo da Colômbia revelou que oito tripulantes de uma embarcação militar haviam sumido durante o trajeto entre o Mobile (EUA), no Golfo do México, e Cartagena (Colômbia). A tripulação do “Caldas” teria sido surpreendida por uma tempestade, no Mar do Caribe, e a embarcação chegou a Cartagena com duas horas de atraso — e com oito pessoas faltando.

De imediato, a Marinha colombiana foi atrás dos sobreviventes. Os Estados Unidos enviaram forças do Canal do Panamá para ajudar nas buscas. Passados quatro dias, os tripulantes foram declarados oficialmente mortos.

Uma semana depois, um marinheiro surge em uma praia deserta, no norte da Colômbia. Era um sobrevivente da tragédia. Luis Alejandro Velasco virou um herói nacional e garoto propaganda da Marinha.

A Colômbia vivia uma ditadura militar (o general Gustavo Rojas Pinilla governou o país de 1953 a 1957) e vender a imagem de Velasco, um marinheiro, como herói nacional, caiu como uma luva. Durante o período em que ficou internado, o náufrago só conversou com jornalistas oficiais do regime.

Reviravolta

A história começou a mudar um mês depois, quando o marinheiro topou conversar com Gabriel Garcia Marquez (aquele mesmo, dos Cem Anos de Solidão), à época um jovem repórter.

Mas o que parecia uma mera história de heroísmo virou um escândalo. Velasco confirmou o que os institutos meteorológicos já haviam adiantado: não havia nenhuma tormenta no Mar do Caribe. Os tripulantes caíram porque havia excesso de peso.

Navios de guerra eram proibidos de transportar carga, pelas leis colombianas, e o ARC Caldas descumpriu esta regra. Pior: era mercadoria de contrabando. Refrigeradores, televisões, máquinas de lavar roupa que entravam na Colômbia de forma ilegal, por meio de um navio da Marinha.

Foi um escândalo. Em nota oficial, o governo ditatorial garantiu que não havia nenhum contrabando no navio militar. O El Espectador chegou a fechar as portas. Não sem antes publicar uma série de fotos da tripulação que comprovavam a presença de contrabando na embarcação.

O relato detalhado de como Luis Alejandro Velasco sobreviveu em alto mar em uma pequeno bote de emergência, enfrentando a sede, fome e até tubarões foi publicada em uma série de artigos no El Espectador, de Bogotá. Anos mais tarde foi compilada no livro “Relato de um Náufrago” (disponível em português).

ARA San Juan

Ao todo, 43 homens e uma mulher integravam a população do ARA San Juan, desaparecido por um ano no litoral argentino. Pouco se sabe sobre as causas do acidente. Horas antes da explosão, detectada na altura em que a embarcação foi encontrada, o capitão Claudio Javier Villamide enviou oito comunicações para seus superiores.

Ele informou falhas nas baterias do submarino, e que havia entrado água no sistema de ventilação. Isso teria ocorrido quando o submarino estava próximo da superfície e houve uma grande ondulação marítma.

Durante as investigações da justiça federal argentina foram identificados indícios de imprudência por parte da Marinha. O comando militar teria permitido que a missão do submarino seguisse por um tempo prolongado, apesar de relatos de avarias mecânicas na embarcação.

Sem meios para retirar o submarino de onde ele foi encontrado, a Marinha deve seguir as investigações com base em medições, fotos e vídeos registrados no local. A medida também é uma forma de garantir a segurança dos investigadores.

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