Com seu retorno à Casa Branca em 2025, Donald Trump deverá herdar uma série de questões geopolíticas complexas, incluindo as tensões persistentes no Oriente Médio, agravadas pela influência do Irã e seus aliados terroristas.
Durante seu primeiro mandato, Trump adotou uma postura agressiva contra o regime iraniano, restabelecendo sanções e retirando os EUA do acordo nuclear de 2015, decisão que afetou drasticamente a economia do Irã e reforçou seu isolamento internacional. Agora, nesta segunda administração Trump, especialistas preveem novamente intensificação das pressões sobre o regime de Teerã.
Brian Hook, ex-enviado especial para o Irã no primeiro governo Trump, afirmou recentemente que o presidente eleito vê o regime iraniano como “o principal motor da instabilidade” no Oriente Médio, responsabilizando-o pela crise contínua e pela escalada de conflitos envolvendo Israel e seus vizinhos. Hook defende que, ao contrário da atual abordagem de “acomodação” adotada pelo ainda presidente Joe Biden, o novo governo deve restaurar a dissuasão contra o Irã, enfatizando a necessidade de uma postura mais agressiva que inclua sanções mais rígidas e isolamento diplomático.
Trump possui uma base de apoio considerável entre os líderes de países do Golfo, como Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, que também consideram o Irã uma ameaça. Esses países árabes, apesar de terem buscado um certo grau de conversa com o regime islâmico, não descartam reforçar suas alianças com Washington para limitar a influência de Teerã na região.
Fred Fleitz, ex-membro do Conselho de Segurança Nacional dos EUA sob a administração Trump, afirmou ao site Middle East Eye que, neste segundo mandato, o republicano deve intensificar a aplicação de sanções sobre o petróleo iraniano, aumentando a pressão sobre a economia do país. Segundo Fleitz, a ideia é inviabilizar financeiramente o regime iraniano, forçando outras nações que compram petróleo do país, como a China, a reconsiderarem suas relações comerciais com Teerã. Fleitz acredita que Trump pretende “falir o Irã” e impor sanções secundárias contra países que violarem essas restrições, uma iniciativa que busca de fato isolar ainda mais o país persa no mercado global.
Com o apoio de uma maioria republicana no Congresso, uma Suprema Corte predominantemente conservadora e uma maioria de governadores do seu partido, Trump terá uma posição fortalecida para implementar suas políticas de forma mais incisiva, analisa Alexandre Pires, professor de relações internacionais e economia do Ibmec-SP.
Neste contexto, espera-se, na visão dele, realmente um endurecimento nas políticas externas dos EUA, especialmente em relação ao Irã, que, segundo Pires, se aproximou nos últimos anos de China e Rússia.
Em entrevista à Gazeta do Povo, Pires cita que medidas como o aumento de tarifas, sanções mais severas e o bloqueio de comércio de petróleo seriam algumas das ferramentas de pressão que Washington, sob o comando de Trump, utilizaria para desestabilizar o país. O impacto dessa abordagem poderia afetar também outras nações que têm mantido relações mais estreitas com China e Rússia, incluindo o Brasil, forçando-os a reconsiderar seu posicionamento geopolítico.
“Esse segundo mandato ele [Trump] terá a maioria das duas casas do Congresso, ele tem uma maioria de governadores republicanos, a Suprema Corte é hoje republicana, então a capacidade de Trump de implementar suas políticas aumentou exponencialmente. Há um endurecimento com relação à política externa, ele já sinalizou aumento de tarifas. Os países que estão se alinhando a China, nesse bloco econômico em informação liderado por Rússia e China terão problemas, o Irã tem se aproximado da China buscando um alívio para as sanções, haverá um endurecimento dessas sanções. Uma pressão muito forte, sobretudo com o impedimento do comércio de petróleo do Irã. E essa pressão toda deve levar a um novo contexto em que esses países terão que tomar posições. Países também que estão próximos desse bloco terão que decidir se continuarão assim. O Brasil é um deles que tem feito essa aproximação”, disse Pires.
Para Michael Mulroy, ex-vice-secretário assistente de Defesa para o Oriente Médio durante o primeiro governo de Trump, neste segundo mandato, o republicano “provavelmente adotará uma postura muito mais firme em relação ao Irã, tanto bilateralmente com Israel quanto de forma unilateral”.
“Também deve ser destacado, como amplamente reportado, que o Irã mantém uma operação contínua para assassinar o presidente Trump e muitos de seus ex-assessores seniores. Esse esforço provavelmente não ficará sem resposta”, acrescentou Mulroy ao site The National.
O analista Igor Lucena, PhD em Relações Internacionais, argumenta que Trump intensificará a pressão dos EUA sobre o Irã, com a imposição de sanções e a tentativa de isolar o regime de alianças com a China e Rússia. Lucena acredita que Trump vê o Irã como parte do chamado "eixo do mal" e deve apostar nos Acordos de Abraão para fortalecer a cooperação entre Israel e Arábia Saudita, isolando ainda mais Teerã no cenário internacional.
“Trump deve usar sua principal arma internacional, que foi os Acordos de Abraão, para tentar avançar com a Arábia Saudita e Israel num novo acordo”, disse ele em entrevista à Gazeta do Povo.
Lucena também considera que Trump poderá adotar uma postura de maior tolerância em relação às ações de Israel contra o Irã, evitando críticas ao premiê Benjamin Netanyahu. Segundo o analista, Trump deseja que qualquer conflito envolvendo Israel termine antes de sua posse, para que ele inicie seu mandato com uma vitória.
“O que significa uma vitória? Destruir o Hezbollah, destruir o Hamas, impedir que o Irã consiga avançar nas suas políticas de transporte de equipamentos e dinheiro para os grupos terroristas”, afirmou.
Sufocando os satélites terroristas
O Eixo da Resistencia liderado pelo Irã, composto por grupos terroristas como o Hamas e o Hezbollah, miliciais no Iraque e os Houthis no Iêmen, será outro ponto para o republicano resolver. O Hamas e o Hezbollah estão enfraquecidos após Israel eliminar praticamente todos os seus líderes, no entanto, ainda representam uma ameaça para a região, bem como os Houthis, que seguem atacando navios comerciais do Ocidente.
Em artigo escrito para o Instituto de Estudos sobre Segurança Nacional da Universidade de Tel Aviv, os autores Avishay Ben Sasson-Gordis (doutor em governo pela Universidade de Harvard), Ted Sasson (sociólogo e professor na Middlebury College) e Jesse Weinberg (cientista político e pesquisador da Universidade de Tel Aviv), analisam que o Eixo da Resistência do Irã enfrentará uma postura dura do novo governo americano.
Durante seu primeiro mandato, os autores apontam que Trump apoiou medidas de pressão máxima sobre o Irã e também autorizou o ataque que matou Qasem Soleimani, o poderoso comandante da Força Quds, a divisão da Guarda Revolucionária Islâmica que realiza operações externas, ação que foi vista como um golpe direto ao “eixo do mal” iraniano.
Neste novo governo, é esperado que Trump reforce as sanções econômicas contra o Irã, enfraquecendo assim o apoio financeiro do regime islâmico aos grupos terroristas aliados na região. No entanto, a probabilidade de uma intervenção militar direta dos EUA contra o Irã e seus grupos terroristas permanece incerta, pois, segundo os autores, Trump quer evitar ao máximo a escalada de novos conflitos no Oriente Médio. Em vez disso, afirmam, o republicano pode optar por seguir apoiando as operações israelenses contra os terroristas do Irã, bem como contra o próprio regime islâmico, permitindo que o país de Netanyahu atue com um pouco mais de liberdade contra o Hezbollah e o Hamas, sem interferência direta da Casa Branca.
“Sobre o Irã, espera-se que Trump intensifique a retórica e restaure sanções econômicas significativas. Ele também pode apoiar o uso de força contra figuras iranianas envolvidas em atividades terroristas regionais”, cita a publicação.
Para Pires, Trump “tentará secar as fontes de recursos do Irã e, assim, dificultar a ação geopolítica e terrorista” do país. O analista diz que, neste momento, os houthis são mais um problema da Arábia Saudita do que diretamente dos Estados Unidos”, contudo, Trump “pode pressionar Riade a estabilizar a Península Arábica, sinalizando as salvaguardas que levariam os sauditas a agir” novamente contra o grupo iemenita.