No livro Paralelo 10, a jornalista Eliza Griswold descreve uma região latitudinal que passa pela África e pela Ásia como um espaço de intensa disputa religiosa. Trata-se da "Janela 10/40", um limite geográfico que, segundo evangelizadores, é considerado o local em que vivem os povos mais necessitados da Terra. A região também tem a maior concentração de países muçulmanos, budistas e hindus do mundo.
O conceito espacial delimitado pelo meridional 10 e pelo setentrional 40 foi imaginado pelo evangelista norte-americano Luis Bush, em 1990. Sua intenção era estabelecer um ponto estratégico, no qual os missionários cristãos de igrejas pentecostais, batistas e protestantes pudessem concentrar esforços para evangelizar. Os voluntários para o trabalho são, em sua maioria, americanos.
"A Janela 10/40 é vista pelos evangélicos como uma maneira de levar o cristianismo para locais em que ele é rarefeito e, muitas vezes, perseguido", explica o sociólogo Ricardo Mariano, que pesquisa o tema na Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). A ONG brasileira Portas Abertas registrou 434 perseguições, nos últimos anos, aos missionários cristãos que atuam nos países da região.
Choque
Para o cientista político Heni Ozi Cukier, da Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM), a Janela 10/40 é uma síntese da tese sobre o choque de civilizações, proposta pelo autor Samuel P. Huntington. "A religião é uma característica essencial de uma identidade coletiva. Os valores e princípios religiosos, em vários casos, são inconciliáveis de uma crença para a outra", diz.
Esses países como o Sudão e o Sudão do Sul sempre tiveram problemas para definir suas fronteiras políticas, étnicas e religiosas, diz Cukier.
Política
Para Gamal Oumari, diretor da Sociedade Islâmica de Curitiba e com parentes no Senegal, as missões na Janela 10/40 soam como dominações territoriais. "Existe uma vontade dos cristãos de tirarem território dos muçulmanos. Especialmente as redes evangélicas", diz.
O pastor Eliezer Magalhães, da Primeira Igreja Batista de Curitiba, realiza missões duas vezes por ano no Nepal e na Índia. Ele diz que o trabalho de evangelização, além de transmitir dogmas cristãos, também tem um forte apelo social. "Ajudamos as comunidades a se reerguerem, capacitando profissionais para trabalhar", conta.
As perseguições feitas aos cristãos são uma consequência da falta de liberdade religiosa de alguns desses países. Em Paralelo 10, Eliza afirma que a desigualdade social que existe na maioria deles só agrava as rivalidades religiosas, impossibilitando a tolerância.