Um avião militar americano partiu nesta sexta (noite de quinta do Brasil) de Wonsan, na Coreia do Norte, em direção à base aérea de Onsan, na Coreia de Sul, com o que se supõe ser os restos mortais de integrantes de tropas americanas que participaram na Guerra da Coreia (1950-3).
Por volta das 11h da manhã (23h de quinta-feira no horário de Brasília) a aeronave estava em solo sul-coreano, onde foi recebida por uma multidão de soldados americanos e suas famílias - todos os soldados americanos na Coreia do Sul foram convidados para o evento. Esta sexta-feira marca o 65º aniversário do armistício que encerrou os combates da Guerra da Coreia.
A entrega dos restos foi um dos compromissos assumidos pelo líder norte-coreano Kim Jong-un com o presidente americano Donald Trump, durante o encontro de cúpula realizado em Cingapura, em 12 de junho. Mas, os norte-coreanos chegaram a faltar a uma reunião que iria discutir o assunto.
"As ações de hoje representam o primeiro passo significativo para recomeçar a repatriação de restos mortais e retomar as operações de campo na Coreia do Norte para procurar os cerca de 5.300 americanos que ainda não voltaram para casa", disse Sarah Huckabee Sanders, secretária de imprensa da Casa Branca em uma declaração na noite de quinta-feira.
Na Coreia do Sul, os legistas americanos deverão fazer uma inspeção detalhada dos restos para identificar se há indícios de uniformes militares, placas de identificação ou documentos. O procedimento poderá demorar pelo menos cinco dias. Uma cerimônia de repatriação está prevista para 1º de agosto, quando os restos mortais forem levados para o Havaí, onde serão realizadas análises detalhadas de DNA para saber quantos militares americanos poderão ser identificados.
A Agência de Notícias Yonhap informou na quinta-feira que a Coreia do Norte aceitou 100 caixões de madeira que planeja usar para devolver os restos mortais. O comando militar dos EUA na Coreia do Sul transferiu os caixões para a zona desmilitarizada que divide a península coreana no final de junho.
A esperada repatriação foi recebida com otimismo cauteloso por Rick Downes, diretor executivo de um grupo de famílias cujos entes queridos nunca voltaram para casa após a Guerra da Coreia. Eles assistiram a discussões nas últimas semanas com uma mistura de esperança e cinismo.
“Esses homens desaparecidos ainda estão servindo. A guerra continua e eles estão sendo negociados e usados como uma ferramenta de barganha”, disse Downes.
Um funcionário do governo americano disse ao Washington Post na semana passada que a Coreia do Norte concordou em entregar cerca de 55 conjuntos de restos mortais.
5.300 soldados desaparecidos na Coreia do Norte
O ex-governador do Novo México Bill Richardson, que trabalhou em questões de repatriação e visitou a Coreia do Norte várias vezes, disse que vê a potencial recuperação dos restos mortais como um primeiro passo positivo, mas alertou que Pyongyang poderia tentar entregar outros restos mortais e tentar usar a questão como uma forma de ganhar dinheiro.
"Eles vão dar uma certa quantidade de restos de graça imediatamente", previu Richardson. "Mas eles dirão: 'Os próximos, precisamos encontrá-los, localizá-los, restaurá-los'. E então eles vão começar a cobrar".
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Embora os Estados Unidos tenham uma política de se recusar a pagar pela repatriação de restos mortais, no passado concordaram em fornecer financiamento para as despesas incorridas pelos norte-coreanos.
O Pentágono estima que quase 7.700 soldados dos EUA estão desaparecidos da guerra; entre eles, 5.300 supostamente foram mortos ao norte do paralelo 38, ou seja, na fronteira entre a Coreia do Norte e a Coreia do Sul.
Acredita-se que o governo norte-coreano tenha entre 120 e 200 conjuntos de militares dos EUA em sua posse e prontos para serem entregues, mas ainda há milhares no país, segundo Mickey Bergman, vice-presidente do Richardson Center for Global.
Alguns restos mortais foram enterrados pelas tropas norte-americanas em cemitérios que se pretendiam temporários até que a entrada da China na Guerra da Coreia forçou os EUA a se retirarem para o sul. Outros restos mortais estão em locais onde aviões caíram ou em túmulos não identificados, de acordo com Bergman.
"Uma das coisas que é importante é que o povo americano entenda que este é apenas o começo", disse ele. "Isso vai levar anos. Meu medo é que consigamos esses restos mortais e mais uma vez digamos 'Missão cumprida!' E não é”.
Próximos passos
Depois que os restos mortais forem devolvidos, serão necessários testes científicos para confirmar que eles pertencem a soldados americanos que lutaram na Guerra da Coreia. No passado, a Coreia do Norte foi acusada de incluir deliberadamente ossos não americanos - até ossos de animais - em uma tentativa de enganar as autoridades dos EUA.
Os restos mortais serão enviados para o Havaí, onde a Agência de Contabilidade de Defesa POW/MIA (prisioneiros de guerra/desaparecidos em ação) mantém um laboratório na Base Conjunta Pearl Harbor-Hickam. O processo de identificação pode levar anos, segundo autoridades dos EUA. Geralmente, inclui uma análise das informações que determinam onde certas tropas dos EUA provavelmente desapareceram ou foram enterradas.
Diplomacia entre EUA e Coreia do norte
Após a histórica reunião de cúpula entre os dois líderes no mês passado, Trump e Kim concordaram em trabalhar juntos para recuperar os Estados Unidos que ficaram na Coreia do Norte e para implementar a "repatriação imediata dos que já foram identificados".
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Apenas alguns dias depois de conhecer Kim, Trump retratou o retorno dos restos mortais como algo que já havia acontecido. "Nós recuperamos nossos grandes heróis caídos, os restos mortais", disse ele em uma campanha em Minnesota. "Na verdade, hoje, 200 já foram enviados de volta [aos EUA]".
No entanto nenhum resquício havia sido devolvido e as negociações estavam se arrastando por mais tempo do que muitos esperavam.
"Esta demora é um mau sinal de que a Coreia do Norte pretende se apoiar em sua postura tradicional de negociação", disse Van Jackson, ex-funcionário do Pentágono que leciona na Universidade Victoria de Wellington, na Nova Zelândia.
Era esperado que o secretário de Estado dos EUA, Mike Pompeo, retornasse com restos mortais de sua visita a Pyongyang em 6 de julho, mas depois que sua equipe foi criticada pelo Ministério das Relações Exteriores norte-coreano, sua visita apenas destacou as tensões entre os dois países quanto às negociações dos restos e questões em torno da desnuclearização.
Em 12 de julho oficiais militares norte-coreanos deixaram seus colegas norte-americanos esperando por horas na zona desmilitarizada da Península Coreana, antes de pedir, tardiamente, que remarcassem a reunião. Somente após esse encontro foi feito progresso.
A última vez que militares norte-coreanos devolveram restos de tropas americanas foi em 2005. Em 2007, Richardson visitou a Coreia do Norte em uma missão privada que teve a aprovação do governo Bush e retornou com os restos mortais de seis militares.
A repatriação dos restos mortais ocorre dias depois que imagens de satélite comerciais mostraram que o regime norte-coreano havia destruído parte de uma instalação de testes de satélite, a qual fazia parte do programa de desenvolvimento de mísseis do país. Trump, que disse a repórteres em junho que a Coreia do Norte havia concordado em destruir a instalação, disse na terça-feira que os Estados Unidos apreciaram a decisão.
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