Um desfile protagonizado por crianças durante o carnaval de Torrevieja, cidade localizada na província espanhola de Alicante, foi alvo de duras críticas de grupos conservadores após as menores de idade usarem trajes que simulam peças íntimas femininas, como cinta-liga, protetores de mamilos e sapatos de salto alto, além de carregarem bandeiras da Espanha e da comunidade LGBT.
A polêmica vestimenta, que se assemelha a de mulheres adultas, também vinha acompanhada de slogans satíricos às principais siglas políticas do país. Por exemplo, "Família tradicional", em referência ao Partido Popular (PP); "Fora a imigração!" e "o feminismo nos oprime", do partido de direita Vox; e "Todes, tudis" e "Só sim é sim", da legenda de esquerda Sumar.
O episódio, organizado pelo grupo Ousadia (em tradução livre), incendiou as redes sociais com acusações sobre a sexualização de crianças e até incitação à pedofilia.
No ano passado, a mesma equipe foi criticada por fantasiar meninas mais novas de freiras, sob o slogan "Quem está livre do pecado...". Um padre de uma comunidade local, Pedro Payá, chegou a exigir que não desfilassem dias depois: “Parece-me uma falta de respeito para com aqueles que consideram os sentimentos religiosos muito importantes”, afirmou na ocasião.
O líder católico explicou que não era contra o evento em si, desde que certos limites não fossem ultrapassados: “A audácia tem a particularidade de ser uma linha muito tênue e quem se atreve a ultrapassá-la assume os riscos”.
O novo caso envolvendo crianças levou a fundação cristã de advocacia Christian Lawyers a apresentar uma queixa por um possível crime de utilização de menores para espetáculos exibicionistas. O grupo está recolhendo assinaturas pedindo a demissão da conselheira de eventos da cidade, Rosario Martínez, que faz parte da equipe de governo de Eduardo Dolón, prefeito pelo Partido Popular (PP).
“É condenável e enquadra-se na categoria de corrupção de menores. Esperamos que a justiça atue para que a inocência das crianças não seja perdida ou utilizada desta forma”, afirma a presidente da Fundação, Polónia Castellanos.
A fundação Christian Lawyers dirige sua denúncia contra a conselheira do festival, o presidente e secretário da Associação Cultural do Carnaval de Torrevieja, Francisco Pizana e Armando Bueno, e os responsáveis pelo grupo Ousadia. A Câmara, que não se pronunciou oficialmente sobre o caso, apoia financeiramente os desfiles, declarados de Interesse Turístico Regional, mas não tem qualquer controle sobre quem participa das paradas.
A organização cristã considera "muito grave" que a equipe do carnaval, responsável por recrutar os menores de idade, tenha recebido 650 euros (aproximadamente R$ 3.400) pelo quarto prêmio na categoria de fantasias.
Após as críticas, a Associação Cultural da cidade e a Câmara Municipal se manifestaram em apoio ao grupo. “A Associação Cultural do Carnaval de Torrevieja apoiará sempre todas as equipes e participantes dos nossos carnavais, defendendo sempre a liberdade nos desfiles".
Já o órgão municipal afirmou em um documento ao qual o jornal El Español teve acesso que apoia “a grande família carnavalesca e a Direção da Associação Cultural Carnavalesca de Torrevieja”.
“Carnaval é crítica, sátira, provocação, diversão, e tirar do contexto e dimensionar um fato como o que está sendo criticado é totalmente equivocado”. Foi assim que a Câmara Municipal de Torrevieja tem defendido os valores de seu grande carnaval.
“Temos a certeza de que a intenção dos pais e mães destas crianças não foi, de forma alguma, hipersexualizar os seus filhos com os seus trajes”, afirmou o órgão, defendendo que o desfile deste ano foi realizado com o intuito de criticar a situação política e social da Espanha.
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