Enquanto os EUA promovem o aumento de tropas para combater os talebans do Afeganistão aliados dos terroristas da organização responsável pelo 11 de Setembro de 2001 e pelo atentado ao metrô de Madri de 2004, a Al Qaeda a Europa tenta se desvencilhar da batata quente.
Como formadores da Otan, os países europeus respondem por cerca da metade dos homens que integram a Força de Assistência para a Segurança (Isaf) no Afeganistão. O contexto agora é desfavorável para a retirada de tropas, com a intensificação da violência um atentado suicida do Taleban matou civis na sexta-feira, em Cabul e a proximidade da tensa eleição presidencial de 20 de agosto. Mas a recessão econômica fala mais alto e serve de argumento para as vozes que pedem a redução das tropas enviadas para contribuir com a invasão iniciada pelos EUA em 2001.
"A crise internacional agravou as dificuldades de todos os Estados, principalmente dos desenvolvidos, que tinham diversos investimentos em subprime (créditos de risco). E a necessidade de corte de custos obriga diversos deles a acelerar a retirada de tropas", diz o professor de Relações Internacionais da Universidade Católica de Brasília, Juliano Cortinhas.
O argumento financeiro vem bem a calhar aos partidos que pleiteiam a retirada. "Os europeus têm consciência de que a saída da guerra é menos política e mais econômica", explica a professora de geopolítica do Curso Positivo, Luciana Worms.
No Reino Unido, uma pesquisa publicada pelo jornal inglês The Independent revelou que 52% dos britânicos querem a saída imediata das tropas. Para 58%, será impossível ganhar a guerra contra os talebans.
O ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, David Miliband, propõe que a estratégia adotada até agora pelas forças conjuntas da Otan seja revista para aliar diplomacia e estímulo do desenvolvimento à ação militar na qual, só em julho, morreram 20 britânicos.
Na Alemanha que, teoricamente, comporia uma força de paz, mas, na prática, enfrenta os talebans , a veiculação de vídeos de ameaça terrorista aquece o já acalorado debate sobre a retirada das tropas. Em campanha para as eleições federais de 27 de setembro, partidos de oposição utilizam o tema, enfatizando a opinião de dois terços da população, que não acreditam na manutenção do projeto original de participação pacífica.
Na Itália, que tem a sexta maior força na operação "Enduring Freedom" ("liberdade duradoura"), com quase 2.800 homens, a pressão pela retirada das tropas nacionais do país dos talebans passa pela oposição entre partidos de centro-esquerda e aqueles de extrema direita, mais conhecido pela posição crítica à imigração. O ministro sem pasta Roberto Calderoli, que integra a xenófoba Lega Nord, pressionou na semana passada pela saída das tropas. O pedido foi refutado pelo ministro de Relações Exteriores, Franco Frattini: "Estamos trabalhando pela segurança da Itália, inclusive aquela de Calderoli. Vamos ficar", disse.
Mesmo em países europeus com pouca representação na guerra a discussão é acalorada. Portugal, com 90 homens combatendo no Afeganistão no momento, enviou mais 40 neste mês sob críticas nacionais. O pesquisador e coronel David Martelo, por exemplo, afirmou ao Jornal de Notícias que "aquilo que leva Portugal ao Afeganistão é tão ilógico como os impostos dos alemães e dos holandeses servirem para construir autoestradas lusas. No fundo, temos de mostrar solidariedade com eles. Se Portugal não se alinhasse nestas missões, a opinião pública desses países começaria a questionar por que têm de contribuir para o nosso bem-estar. Ou queremos ser sócios desses clubes e pagamos a quota, ou então deixamos de ter direito às suas benesses". O militar se refere às vantagens trazidas pela adesão de Portugal à União Europeia, em 1986.
Ameaça
Apesar das críticas, se depender do líder da operação, o comandante em chefe Barack Obama, ninguém arreda o pé. "A missão no Afeganistão é uma daquelas em que os europeus têm tanto em jogo como nós, ou mesmo mais", declarou à Sky News, nas proximidades de Acra, capital de Gana, há duas semanas. E isso por uma razão muito palpável: "A hipótese de um ataque terrorista em Londres é tão provável, senão mesmo mais, quanto a de um ataque nos EUA", disse Obama.
O representante dos EUA na Otan, Ivo Daalder, faz coro ao chefe e pede que a Europa desembolse homens e fundos para a operação. "O reforço de tropas enviado para as eleições deve permanecer lá", disse.
"O argumento de Obama é que existe grande possibilidade de Osama Bin Laden ainda estar por lá", diz a professora Luciana Worms, lembrando da promessa de capturar o mentor do ataque às Torres Gêmeas.