Perseguidos por um grupo de extremistas muçulmanos, um empresário cristão e seu sobrinho escalaram até o telhado de uma casa e correram, pulando de prédio em prédio, para tentarem se salvar no vilarejo egípcio em que moravam. Contudo, os telhados acabaram e os dois foram forçados a descer para a rua.
Já no chão, eles foram encurralados por uma dezena de homens, que os agrediram com machados e os golpearam com pedaços de paus e galhos de árvores. O empresário Emile Naseem, de 41 anos, foi morto naquele dia. Contudo, seu sobrinho sobreviveu com ferimentos nos ombros e na cabeça e relatou a perseguição.
A fúria do grupo pelas ruas do vilarejo de Nagaa Hassan em que dezenas de casas de cristãos foram queimadas e três outros cristãos foram esfaqueados até a morte ocorreu no início de julho, dois dias após o golpe militar que derrubou o então presidente Mohammed Mursi. Não foi por acaso que os agressores concentraram os ataques contra Naseem e sua família: ele era um dos ativistas mais conhecidos do vilarejo a pedir o afastamento de Mursi. Nas semanas que se seguiram, alguns cristãos pagaram o preço pelo ativismo contra Mursi e seus aliados islâmicos.
Desde o golpe militar, uma série de ataques contra cristãos tem ocorrido nas províncias conhecidas por serem redutos de muçulmanos linhas duras. Na Península do Sinai, onde grupos agem com quase nenhum limite, os militantes mataram um padre a tiros quando ele caminhava em um mercado público.
Minoria
A minoria cristã do Egito, cerca de 10% da população, evitou a política por muito tempo pelo temor às represálias. Os cristãos confiavam apenas em suas igrejas para se manifestar contra quem estava no poder. Isso mudou em meio ao fervor revolucionário quando o ditador Hosni Mubarak foi derrubado em 2011.
Os cristãos passaram então a exigir que suas vozes fossem ouvidas sobre a direção do país. E intensificaram ainda mais seus esforços durante o ano em que Mursi estava na presidência e seus aliados islâmicos no poder. O papa cristão copta, Tawadros II, criticou abertamente o presidente. Ele disse aos cristãos que eles eram livres para participar ativamente da política e que a igreja não iria desencorajá-los.
"Os cristãos saíram de baixo das vestes do clero e nunca voltarão", disse Ezzat Ibrahim, um ativista de Minya, província do sul do país com uma grande comunidade cristã. Era uma aposta arriscada para uma minoria que há muito tempo se sentia vulnerável.
Irmandade ataca "inimigos do Islã"
Durante o ano em que Mohammed Mursi esteve na Presidência, alguns de seus aliados falavam, cada vez mais, sobre os cristãos como inimigos do Islã e alertavam que eles são uma minoria. Quando a onda de protestos contra Mursi começou, em 30 de junho, a Irmandade Muçulmana retratou a mídia como dominada por cristãos. Para os extremistas, a Irmandade rotulou as manifestações como protestos de cristãos contra um governante muçulmano.
A pior reação anticristã desde a queda do ex-presidente, em 3 de julho, foi o ataque em Nagaa Hassan, um vilarejo empoeirado às margens do Rio Nilo, não muito longe dos majestosos sítios arqueológicos egípcios na cidade de Luxor.
O chefe das forças de segurança de Luxor, Khaled Mamdouh, disse que 17 moradores, incluindo oito cristãos, estavam sendo interrogados sobre o assassinato de Emile Naseem e a onda de violência que ocorreu em seguida. Eles disseram que alguns deles foram encaminhados ao Ministério Público para serem oficialmente acusados. Agentes das forças de segurança, enquanto isso, foram posicionados no vilarejo, onde cerca de 20% dos 7 mil moradores são cristãos.
Alvos
Na semana após a queda de Mursi, os extremistas realizaram ataques contra cristãos em pelo menos seis das 27 províncias do país. Em um dos incidentes mais graves, uma multidão atacou casas e lojas de cristãos em Dalaga, um vilarejo na província de Minya, onde os cristãos representam cerca de 35% da população.