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Crítico de Maduro, maior jornal independente deixa de circular na Venezuela

Funcionário caminha ao lado dos rolos de papel restantes na sala de impressão do jornal venezuelano El Nacional, em Caracas, em 6 de Outubro | FEDERICO PARRA/AFP
Funcionário caminha ao lado dos rolos de papel restantes na sala de impressão do jornal venezuelano El Nacional, em Caracas, em 6 de Outubro (Foto: FEDERICO PARRA/AFP)

O único jornal independente de circulação nacional na Venezuela, o El Nacional, deixará de publicar sua versão impressa. A última edição em papel chegou às bancas nesta sexta-feira (14) e a partir de agora o veículo se dedicará somente à versão online.

A decisão não foi estratégica, foi forçada. O El Nacional não conseguia mais ter acesso ao papel-jornal devido às travas impostas pela ditadura socialista. Editor-chefe do jornal, Miguel Henrique Otero, explicou à ABC Internacional, que a “matéria-prima é controlada por um monopólio estatal que antes garantia subsídio aos jornais, mas que depois foi cortado para asfixiá-los”. Isso, somado a uma hiperinflação que já chegou a 1.000.000% em 2018, fez com que o preço do papel se tornasse impraticável. De acordo com o  jornal O Estado de S. Paulo, o diário tinha uma tiragem que não superava 10.000 exemplares e uma edição que passou de 72 para 16 páginas com o agravamento da crise.

Soma-se à ausência do papel, a fuga de anunciantes e a consequente falta de receita para pagar funcionários. O ditador Nicolás Maduro anunciou seis aumentos do salário mínimo somente em 2018 em tentativas de compensar a hiperinflação, dificultando a vida dos empresários, que tiveram que fazer demissões em massa ou encerrar as atividades de vez.

Nossas convicções: O valor da comunicação

O jornal também foi alvo de perseguições das instituições do país, controladas pelo chavismo. A mais marcante em 2018 foi a batalha judicial contra o presidente da Assembleia Nacional Constituinte, Diosdado Cabello, na qual o El Nacional se viu obrigado a pagar uma indenização de um bilhão de bolívares (que na cotação oficial da época equivalia a US$ 12.500 ou US$ 600 no câmbio paralelo) por ter republicado uma matéria do jornal espanhol ABC que vinculava Cabello ao narcotráfico. 

Foi após uma situação semelhante que Otero trocou a Venezuela pela Espanha, em 2015. Ele foi acusado de difamar o governo. Cabello, ameaçou tomar o jornal caso ele não pagasse as multas por "dano moral", no valor de 10 mil euros.  

Um até breve

Além do El Nacional,  que tem 75 anos de história, vários outros diários independentes viram-se obrigados a suspender a publicação impressa ou fechar as portas. Na contagem apresentada pelo El Nacional foram 66 veículos que deixaram de existir nos últimos seis anos, incluindo aí 25 jornais impressos. "Duramos mais que os outros porque havia solidariedade de outros jornais latino-americanos para continuarmos a imprimir, mas no final não conseguimos resistir", lamentou Otero.

A primeira página da edição desta sexta-feira traz a manchete “O Nacional é um guerreiro e continuará a lutar” e o editorial classifica como um descanso o tempo em que a rotativa deixará de trabalhar.

“O El Nacional, hoje, amanhã e sempre estará na luta pela democracia e sempre no coração dos venezuelanos. Este é um regime que usou todas as maneiras para reprimir e acabar com a liberdade de expressão e com os meios independentes, mas não pode com a gente e nem vão poder. Eles vão sair antes. A nossa rotativa está aí e vai imprimir mais adiante”, disse Otero em uma mensagem gravada e publicada no Twitter.

A partir de agora, o El Nacional se dedicará à sua versão web. Mas na Venezuela do ditador Nicolás Maduro essa não será uma tarefa fácil. De acordo com o Instituto Imprensa e Sociedade Venezuela (Ipys, na sigla em espanhol), em 2018, provedores de internet, privados e estatais, aplicaram mecanismos de censura contra portais de notícias que criticam o governo, além das contantes falhas no serviço, que geram desconexão em vários estados.

Nossas convicções: Liberdade de expressão

Para Otero, a Venezuela vive seu pior momento. “Todo dia é pior. Há menos elementos de liberdade de expressão, embora existam algumas pequenas janelas. E você pode chegar ao momento em que a informação só estará nas mãos do povo do Psuv [partido governista] ou como acontece em Cuba”, disse o editor-chefe em entrevista ao El Nacional.

Hegemonia nas comunicações

Desde que Maduro assumiu, em 2013, o chavismo ampliou sua estratégia de hegemonia nas comunicações, iniciada no governo Hugo Chávez. Nos primeiros 14 anos, o foco foi ampliar os veículos públicos alinhados ao governo e o cancelar concessões de canais críticos – como a RCTV, em 2007. 

Agora, sob o atual presidente, empresários aliados do governo compraram veículos com cobertura independente. Foi o caso do canal Globovisión, comprado por Raúl Gorrín, hoje investigado pela Justiça americana por lavagem de dinheiro, e o tradicional diário El Universal. 

A ONG Espaço Público, que trabalha pela liberdade de imprensa, estima que, desde que Maduro assumiu o poder, mais de 50% dos jornais fecharam. Nos últimos dois anos, 52 estações de rádio saíram do ar e canais estrangeiros e correspondentes internacionais foram expulsos do país. A saída encontrada por muitos jornalistas foi fundar novos veículos online focados em investigação. O site Armando.info foi premiado internacionalmente por denunciar esquemas de corrupção. Seus fundadores, no entanto, tiveram de fugir da Venezuela.

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