Bento XVI passa diante de painel com foto de Fidel e a mensagem “rebelde ontem, hospitaleira hoje, heroica sempre”| Foto: Carlos Garcia Rawlins/Reuters

Repressão

Manifestante é detido durante missa

Durante a missa realizada em Santiago de Cuba, na terça-feira, um incidente deu mostras de que a boa vontade do governo com discursos divergentes tem limites definidos. Pouco antes de Bento XVI iniciar a cerimônia, um rapaz gritou palavras de ordem contra o regime, como "abaixo o comunismo" e "abaixo a ditadura". Ele foi agredido e retirado do local com a ação de agentes de segurança.

Em nota, Elizardo Sánchez, da Comissão Nacional de Direitos Humanos e Reconciliação, que funciona como uma espécie de porta-voz informal dos dissidentes na ilha, pediu ao governo que identifique o opositor e forneça informações sobre sua localização.

Segundo a Comissão, mais de 150 dissidentes foram presos por causa da viagem do Papa e cerca de 200 a 300 mendigos e pedintes foram detidos. Há ainda relatos de telefones fixos e celulares de dissidentes e jornalistas independentes desconectados durante a passagem do Pontífice.

Nada disso foi suficiente para desanimar um grupo de exilados cubanos que vivem em Miami. Eles partiram em direção a Cuba, em embarcações que foram vistoriadas pela Guarda Costeira norte-americana para promover a segurança da travessia. Os exilados pretendiam lançar fogos de artifício em homenagem ao Pontífice e realizar um ato com reflexos de luz em espelhos para saudar os compatriotas.

CARREGANDO :)

"Supliquei à Mãe de Deus pelas necessidades dos que sofrem, dos que estão privados de liberdade, separados de seus entes queridos ou que passam por graves momentos de dificuldade."

Papa Bento XVI, em referência aos presos políticos em Cuba.

Poucas horas depois de o Papa Bento XVI pedir à Virgem da Ca­­ridade do Cobre avanços no ca­­minho da renovação e da esperança para a sociedade cubana, um dos principais nomes do go­­verno descartou qualquer hipótese de reforma política no país, afirmando que o sistema da ilha é "inquestionável".

Publicidade

A troca de declarações resume uma viagem em que as autoridades procuram consolidar a imagem de regime aberto aos católicos e impulsionar bandeiras co­­mo o fim do embargo norte-americano, enquanto a Igreja se prepara para ganhar espaço em Cuba e criar as bases para um futuro pós-irmãos Castro.

Em uma entrevista no Hotel Na­­­­­­cional, sede da imprensa es­­tran­­geira credenciada para a visita do Papa, o vice-presidente do Conse­­lho de Ministros e supervisor das reformas, Marino Murillo, deu a primeira resposta direta aos co­­mentários do Pontífice, que an­­tes de chegar ao país já havia dito que o comunismo não servia mais pa­­ra o país. Na ilha, o Pontífice abran­­dou o discurso, mas manteve referências a presos políticos e exilados.

Murillo assegurou que o plano de 300 reformas empreendido pelo presidente Raúl Castro seguirá como a base para assegurar a sobrevivência do ideário marxista no país. "Em Cuba, não haverá uma re­­forma política. Em Cuba, estamos falando da atualização do modelo econômico cubano que faça nosso socialismo sustentável", disse, reiterando que qualquer mudança terá como premissa a permanência do socialismo.

O supervisor das reformas econômicas que deram aos cubanos o direito de comprar e vender ca­­sas e carro disse ainda que o governo está acompanhando as mu­­dan­­­­ças em outros países, como Rússia, Vietnã e China. A ideia, se­­gundo ele, não é copiar fórmulas, mas evitar os mesmos erros.

Presos políticos

Publicidade

Durante cerimônia para homenagear a Virgem da Caridade do Co­­bre, o Papa Bento XVI instou os cubanos a "trabalhar por justiça" e disse estar próximo dos que fo­­ram "privados de liberdade".

"Supliquei à Virgem Santíssi­­ma pelas necessidades dos que so­­frem, dos que estão privados de liberdade, separados de seus entes queridos ou que passam por graves momentos de dificuldade", dis­­se o Papa, em referência aos pre­­sos políticos e exilados.

Durante a tarde, o Papa se en­­controu, em Havana, com o presidente Raúl Castro no Palácio da Revolução.

Igreja dribla a censura

Uma imagem do Papa Bento XVI cobre a fachada da Catedral de Ha­­vana. Mas nem "a capital vestida de gala", como citou a agência oficial, nem as centenas de cartazes alusivos à visita mostram a extensão do espaço público obtido pela igreja nos últimos anos.

Publicidade

Se a força tampouco surge na for­­ma de comparecimento de fiéis, a presença e a influência ca­­tólicas aparecem nas iniciativas editoriais livres da censura direta estatal (Palabra Nueva, Espacio Lai­­cal) e na criação recente de um centro cultural. O Centro Félix Va­­rela, inaugurado em 2011, pro­­mo­­ve inéditos de­­bates e conferências em que con­­vivem integrantes do governo e dis­­sidentes – ainda que críticos di­­gam que apenas os discordantes "mansos" do regime são convocados.

A iniciativa abarca cubanos de fora da ilha. O empresário cubano-americano Carlos Sa­­la­­drigas, milionário e militante anticastrista, participará de debate no centro na próxima sexta-feira. O empresário disse em 2011 à Palabra Nueva querer ajudar as "mudanças so­­ciais" em Cuba.