A família de uma aldeia vizinha chegou ao pequeno hospital vomitando e com uma diarreia muito forte. À primeira vista, talvez um típico caso de consumo de comida estragada ou água contaminada.
Mas a perda de fluidos era enorme e incontrolável; dois dos três irmãos já estavam à beira da morte, e em algumas horas toda a família estaria morta. Enquanto isso, um assustador fluxo de pacientes preenchia a pequena sala da recepção, enquanto médicos e enfermeiras corriam para reidratá-los.
Era a noite de 15 de outubro de 2010. A cólera, como logo seria confirmado pela missão médica de Cuba que trata a maioria dos pacientes daqui, havia chegado ao Haiti.
"Recorremos aos nossos livros para conferir se isso poderia realmente ser cólera, e reportamos a situação imediatamente", disse Jorge Luis Quinones, médico membro da missão cubana que está no centro da epidemia.
Mais de um ano depois, a cólera matou 6,6 mil pessoas e atingiu mais de 476 mil quase 5 por cento dos 10 milhões de habitantes do país , no que autoridades da Organização das Nações Unidas (ONU) descrevem como a maior incidência mundial de cólera.
Em outubro, a Partners in Health [Parceiros na Saúde], uma organização não governamental, anunciou que começaria a testar uma vacina em janeiro, junto ao Ministério da Saúde e a uma organização de saúde haitiana.
À medida que a epidemia avança, a missão médica cubana que desempenhou um importante papel em sua detecção continua no Haiti, ganhando elogios de doadores e diplomatas por permanecer na linha de frente e assumir um esforço mais amplo para refazer o devastado sistema de saúde deste país.
Paul Farmer, enviado especial da ONU ao Haiti e um dos fundadores da Partners in Health, que trabalhou extensivamente na saúde do Haiti, declarou que os cubanos soaram um importante alarme inicial sobre a epidemia, ajudando a mobilizar funcionários da saúde e atenuar o número de mortos.
Além disso, enquanto a taxa de mortalidade atingiu seu pico em dezembro último e a atenção do mundo basicamente seguiu adiante, "metade das ONGs já foi embora, e os cubanos continuam lá", completou ele.
Médicos cubanos trabalham no Haiti desde 1998, quando 100 deles chegaram após um furacão como parte de um programa de cinco décadas de Cuba para estabelecer missões médicas internacionais. Desde então, Cuba trabalhou com Haiti, Venezuela e, recentemente, Brasil, Noruega e outros países para treinar profissionais e produzir equipamentos, fornecendo-os a dezenas de pequenos hospitais comunitários, clínicas e outros centros de tratamento.
Os cubanos enviam médicos ao estrangeiro desde a década de 1960, como uma forma de "diplomacia médica" que leva médicos extremamente necessários a áreas remotas de países pobres, principalmente na África, além de países aliados como a Venezuela, enquanto semeia a solidariedade internacional, afirmou Katrin Hansing, professora do Baruch College que está escrevendo um livro sobre a ajuda cubana a outros países.