Deslizes morais, segredos fiscais, contradições e excessos dos pré-candidatos do Partido Republicano à Presidência dos EUA são expostos nos debates transmitidos pela televisão. O curioso é que essas discussões, que estão conquistando cada vez mais espaço na mídia americana (e estrangeira), servem apenas para a escolha de um candidato que vai enfrentar Barack Obama em novembro.
Na última quinta-feira, o site da CNN publicou um artigo do colunista John Avlon em que é destacado o fato de os candidatos estarem diante de seus concorrentes e serem julgados pelo "conhecimento prático da política e sua capacidade de pensar e falar por si mesmos". Avlon acrescenta: "É um bom teste de coragem presidencial e o caráter é revelado, assim como o intelecto, ao longo dos debates".
A Gazeta do Povo entrevistou pesquisadores de política dos EUA sobre a importância desses debates. O analista político João Augusto de Castro Neves, da Eurasia consultoria em Washington, diz que há temas polêmicos que os candidatos até conseguem contornar durante a campanha, mas, quando chegam aos encontros com seus rivais, precisam declarar suas posições. "Por mais caótico que seja, o sistema das prévias incentiva o debate", diz Neves, ao lembrar que a participação dos eleitores na escolha do candidato do partido alimenta o embate entre os republicanos.
O cientista político Ole Holsti, da Universidade de Duke, nos EUA, considera que os debates costumam ser mais decisivos para eliminar candidatos, como no caso de Rick Perry, que abandonou a corrida. "Ele foi muito mal nos debates. Quase todos que assistiram tiveram sérias dúvidas sobre sua real capacidade de ser um forte candidato presidencial", diz Holsti.
Espetáculo midiático
Na semana passada, o jornal The New York Times publicou uma reportagem em que descrevia o clima nos bastidores dos debates. Minutos antes do início da transmissão na Carolina do Sul, no dia 21, um apresentador pediu ao público que demonstrasse mais entusiasmo, conforme descreve o jornal.
Minutos depois, o debate começaria com uma pergunta sobre a vida pessoal de Newt Gingrich. A sua ex-esposa, Marianne Gingrich, havia feito declarações à rede de televisão ABC em que afirmava que o candidato, notório por ser muito conservador, propôs a ela um casamento aberto a fim de manter relações com a então amante (e atual esposa) Callista Bisek.
Gingrich ficou furioso com a escolha da CNN de começar o debate com ataques pessoais e recebeu o apoio da plateia com aplausos. Esse tipo de pergunta pode ser considerado golpe baixo, mas é interessante observar a reação de Gingrich e lembrar que ele liderou a campanha pelo impeachment de Bill Clinton como punição ao caso com a estagiária Monica Lewinsky. No entanto, o lembrete do falso moralismo de Gingrich no debate parece não ter abalado sua campanha, já que ele saiu vitorioso na Carolina do Sul.
O professor de Ciência Política Mark Miller, da Universidade de Delaware, nos EUA, conta que prefere jogos de basquete aos debates do Partido Republicano. Amigos de Miller que estão acompanhando os encontros políticos com mais frequência os definem como "espetáculo". "O Estado da política americana é muito triste. Como a maioria das pessoas, eu acho deprimente essa situação [atual]", diz o acadêmico.
Na última quinta-feira, em Jacksonville, na Flórida, Mitt Romney conseguiu se destacar e, de acordo com analistas, saiu do debate melhor do que Newt Gingrich, que ficou mais na defensiva. O desempenho de Romney foi considerado uma reação à derrota na Carolina do Sul e um novo impulso para as primárias da Flórida, na próxima terça-feira.
Como agora são apenas prévias, é bom que o rival de Barack Obama se prepare. O professor Holsti diz que, nas eleições presidenciais, os debates são ainda mais determinantes e lembra: "John Kennedy se saiu muito melhor que Richard Nixon em 1960 e isto provavelmente foi decisivo".