Entrevista
Lei não aceita a alegação de defesa do interesse público
Agência O Globo
Como o senhor recebeu o veredicto de Manning?
O julgamento nunca deveria ter acontecido. Manning admitiu culpa em acusações que dariam 20 anos de prisão. Ou acreditam que 20 anos não é punição suficiente ou queriam estabelecer um precedente perigoso de que vazamento pode ser punido por traição. Podemos ficar aliviados pela rejeição da acusação extrema. Mas continua um problema, o de que a lei não permita que vazadores de informação aleguem defesa do interesse público. O governo só tem que mostrar que a informação era sigilosa e o vazador sabia. A corte militar tem muito poder para fixar a severidade das penas. No processo de sentença, será a oportunidade de ela levar ou não em consideração fatores até então ignorados, como o valor dos documentos para o esclarecimento da sociedade e a democracia. Ainda não acabou.
O governo exagerou na acusação contra Bradley Manning?
O governo fez a alegação de ajuda ao inimigo sem nunca ter acusado Manning de intenção de ajudar a Al-Qaeda, e isso é muito importante. Argumentou que ele deveria saber que, ao colocar a informação na internet, ela estaria disponível ao inimigo e o ajudaria. Essa teoria criminalizaria qualquer militar que falasse com a imprensa ou divulgasse material na internet. Mas, até a opinião da juíza estar detalhada, eu não acho que se deva celebrar muito.
O jornalismo investigativo diminuirá?
As acusações [contra Manning] são sérias e suficientemente perigosas. A intimidação não se esgota aqui. Mas não é o fim do jornalismo investigativo. Sempre haverá jornalistas e fontes corajosas. Uns se assustarão com a agressividade da punição, mas outros se sentirão inspirados.
Ben Wizner, diretor do Projeto de Expressão, Privacidade e Tecnologia da União Americana de Liberdades Civis.
Responsável pelo vazamento de documentos confidenciais do governo americano para o WikiLeaks em 2010, o soldado Bradley Manning, de 25 anos, foi absolvido ontem por uma juíza militar da acusação mais grave que pesava contra ele, a de colaborar com o inimigo, que o levaria à prisão perpétua. Ele foi inocentado, ainda, da acusação de posse de informação de defesa nacional.
Manning, porém, foi considerado culpado por outras 19 acusações. A maior parte delas abrange espionagem e furto. Há também violações de legislação militar e fraudes de informática. A somatória das penas pode alcançar 136 anos de prisão. A etapa para fixar a sentença de cada condenação começa hoje.
Nos tribunais militares americanos, qualquer réu que seja condenado a mais de seis meses de prisão tem automaticamente direito de recorrer, o que deve ocorrer no caso de Manning. Em janeiro, a juíza do processo, coronel Denise Lind, determinou que qualquer pena contra ele seria reduzida em 112 dias devido aos maus tratos que sofreu na penitenciária, onde foi mantido nu em celas sem janelas.
Lind refutou o argumento da acusação de que Manning vazou o material com a consciência de que o conteúdo seria usado por inimigos do país, como a Al-Qaeda, o que animou seus apoiadores.
"Mas não podemos perder de vista que é sem precedentes a possibilidade de alguém ir para a cadeia por divulgar informações para a imprensa", afirmou Elizabeth Goitein, do programa de liberdade e segurança nacional da Universidade de Nova York.
Segundo Goitein, a sentença de Manning será possivelmente a maior que alguém acusado de entregar informações à mídia já recebeu.
O resultado vem no momento em que o governo do presidente Barack Obama tenta abertamente desencorajar o vazamento de segredos governamentais, a exemplo do caso de Edward Snowden, ex-técnico da CIA que revelou a existência do programa de vigilância praticado pela NSA (Agência de Segurança Nacional).
136 anos de prisão é a sentença máxima que o militar Bradley Manning pode receber depois de ter sido considerado culpado em 19 de 20 acusações que pesavam contra ele, a maior parte delas abrange espionagem e furto.