A Conferência do Clima (COP21), que ocorre em Paris até o próximo final de semana, tem vários desafios além os de conciliar os interesses das diversas nações presentes. Um dos mais importantes é tirar o debate do espectro meramente ambiental e comprovar que esta é uma questão de desenvolvimento econômico.
Essa visão sobre o clima vem sendo construída lentamente, mas várias iniciativas já se inserem nas atividades do mercado financeiro. Um exemplo é a atitude da agência de classificação de risco Standard & Poor’s, que reconhece e considera o risco ambiental na elaboração dos ratings de companhias. Recentemente, a agência rebaixou a nota da Volkswagen após o escândalo da manipulação do software dos carros movidos a combustível fóssil. O mesmo ocorreu com a Samarco, após o acidente em Mariana (MG).
Ao mesmo tempo, organismos internacionais de fomento, como Fundo Monetário Internacional (FMI), Banco Mundial (Bird) e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) estão orientados a priorizar investimentos e incentivar projetos de baixo carbono. Em outra frente, 101 grandes fundos globais, como o soberano norueguês, são signatários do acordo Montréal Carbon Pledge, que recomenda encontrar ativos financeiros com baixo risco ambiental.
No Brasil, o Banco Central possui uma norma que exige que as instituições financeiras tenham uma política e governança sobre risco ambiental e grandes gestoras de investimento estão fazendo o valuation dos ativos em que investem considerando os riscos ambientais, sociais e de governança (ASG).
Além disso, há a criação e desenvolvimento de ativos diretamente associados a preocupações ambientais, como os créditos de carbono – que permitem a comercialização de cotas de emissões de gases de efeito estufa – e os “green bonds”, títulos de renda fixa atrelados a projetos voltados à questão ambiental. Uma das iniciativas mais conhecidas e antigas do mercado financeiro nacional que consideram a preocupação ambiental é o Índice de Sustentabilidade Empresarial, criado pela Bolsa há dez anos.
Curva de crescimento
Em Paris, as expectativas para um resultado positivo são maiores do que nos últimos anos, embora os ataques do Estado Islâmico no último dia 13 de novembro tenham afastado da cidade boa parte dos representantes da sociedade civil, que historicamente “são importante fator de pressão para a obtenção de boas conclusões”, como avalia o professor titular do Instituto de Relações Internacionais na Universidade de Brasília, Eduardo Viola. Ele mesmo cancelou sua ida ao evento, após os ataques.
De acordo com o especialista, a pretensão da COP21, em uma visão resumida, é que cada um dos países participantes apresente sua própria proposta de redução das emissões ou, em caso de nações em desenvolvimento, de diminuição da curva de crescimento dessas emissões. A ideia é que essas nações assumam o compromisso de colocar a proposta em prática e submetê-la a avaliação e revisão feitas pela conferência a cada cinco anos. “Isso daria um sinal efetivo de que existe uma dinâmica de transição para uma economia de baixo carbono”, afirma Viola.
A Organização das Nações Unidas (ONU) ainda pretende alcançar no encontro deste ano um acordo “legalmente vinculante”, o que pressupõe um marco jurídico internacional para o combate ao aquecimento da Terra. Porém, outra vertente, que reúne diversos especialistas e predomina entre os participantes brasileiros, considera que insistir nesse objetivo pode prejudicar avanços mais modestos, mas importantes neste momento. Principalmente porque um tratado obrigatório tenderia a deixar de fora os Estados Unidos.
Baixo carbono
Viola destaca três ações no âmbito da economia fundamentais para permitir que as ambições da COP21 se tornem realidade. A primeira, chamada precificação de carbono, seria a criação de impostos punitivos sobre atividades fortemente emissoras. Boa parte dos especialistas acredita que uma taxa mundial é impossível no momento, mas lembra que a medida já vem sendo tomada em alguns países e aposta em evoluções durante as negociações das próximas duas semanas. Paralelamente, haveria a criação de incentivos para quem optasse por processos produtivos de baixo carbono.
A opção pela energia limpa é outro fator relevante. Nesse ponto, Viola aponta que o Brasil deu passos atrás nos últimos anos. Embora o país tenha uma matriz energética limpa em relação à maior parte das demais nações, as condições pioraram muito quando houve uma opção pelo uso das termelétricas em detrimento da energia eólica como alternativa às hidrelétricas.
O professor da UnB criticou também a política de incentivo à indústria automotiva e as expectativas depositadas no programa de exploração do pré-sal como impulsionador do desenvolvimento do país. “As baixas emissões relativas do Brasil atualmente não significam baixas emissões futuras”, completa Branca Americano, do Instituto Clima e Sociedade.
Por fim, Viola destaca a importância dos mecanismos de financiamento para a transição dos diversos países para uma economia de baixo carbono, incluindo produtos financeiros como o mercado de carbono. As perspectivas para a negociação de créditos de carbono eram grandes anos atrás, mas o crescimento do mercado patinou diante da crise financeira que eclodiu em 2008 e do fracasso do Protocolo de Kyoto – que determinava compromissos obrigatórios de redução para países desenvolvidos, mas não foi adotado por países importantes como EUA e China. A depender dos resultados da COP21, há chance de uma nova onda de crescimento nesse segmento de mercado.