O Chile tem desempenho estelar segundo quase qualquer padrão. Sua renda per capita multiplicou-se por quatro no último quarto de século, e muitos chilenos acham que seu país está muito perto de fazer parte do mundo industrial avançado.
Mas as favelas na periferia desta capital andina revelam que o país ainda não se livrou da maldição que assola a América Latina: a enorme disparidade entre ricos e pobres.
De acordo com o Banco Mundial, os 10% mais ricos dos chilenos ficam com US$ 42 de cada US$ 100 de renda disponível. Na Espanha, onde a renda média é 30% mais alta que a do Chile, a cifra comparável é US$ 25.
"Não conseguimos romper com o modelo de crescimento que gera a dinâmica da exclusão", disse Juan Carlos Feres, presidente da Fundação para a Superação da Pobreza, em Santiago.
Mesmo assim, como boa parte da América Latina, o Chile é uma das poucas partes do mundo onde a disparidade de renda vem diminuindo, em vez de crescer.
Usando o "índice Gini", pesquisadores da Universidade Tulane, em Nova Orleans, do Banco Mundial e do Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas concluíram que a desigualdade foi menor em 2012 que em 2000 em 16 dos 18 países latino-americanos para os quais existem dados com os quais rastrear a tendência.
O índice vai de zero uma utopia onde todos ganham o mesmo a cem, em que uma só pessoa é dona de cada centavo.
A disparidade encolheu em países com governos populistas de esquerda, como Venezuela e Argentina, e em países com governos mais à direita e favoráveis ao mercado, como Peru e Colômbia.
Estudiosos podem apontar para programas que contribuíram para reduzir a disparidade como a elevação do salário mínimo brasileiro ou a ampliação das pensões na Argentina, mas ninguém entende o que está por trás da dinâmica regional.
Líderes latino-americanos começam a congratular-se pelo avanço. Mas é possível que a redução seja um sintoma não de sucesso no combate à pobreza, mas de vulnerabilidade econômica.
A redistribuição governamental parece ter ajudado a reduzir a disparidade de renda. Mas Nora Lustig, na Universidade Tulane, e seus colegas pesquisadores concluíram que mudanças nas pensões e novas transferências de renda promovidas por governos foram responsáveis por apenas 30% da redução da desigualdade.
Para Jaime Ruiz-Tagle, da Universidade do Chile, a redução da desigualdade pode ser fruto do aumento na oferta de profissionais com formação universitária na América Latina.
Ele teme que a queda na disparidade também esteja relacionada à queda na demanda por mão de obra qualificada.
A demanda chinesa de matérias-primas elevou o valor das moedas da região, ao mesmo tempo em que as importações de produtos chineses baratos debilitaram a base industrial já fraca dos países latino-americanos, reduzindo sua demanda por trabalhadores qualificados.
"Nesse caso, a redução da desigualdade será má notícia, no longo prazo", disse Augusto de la Torre, do Banco Mundial. "Se for esse o caso, estamos nos especializando em setores que exigem menos conhecimento."
O Banco Mundial argumenta que o único caminho viável é investir em indústrias que requerem mão de obra qualificada.
Faz sentido. Mas, fazendo isso, a América Latina pode ter que se juntar ao mundo desenvolvido, enfrentando o desafio de crescer sem ampliar a disparidade.