Lima Na visão do sociólogo peruano Julio Cotler, um dos intelectuais mais respeitados do país, a disputa que ocorre entre o ex-presidente Alan García e o líder nacionalista Ollanta Humala pela Presidência reflete a profunda fragmentação social existente no Peru. "Humala representa uma grande advertência para todos, ele despertou a consciência de alguns setores sobre a desigualdade social", explicou Cotler, que atua como diretor do Instituto de Estudos Peruanos e é autor de livros como Classes, Estado e Nação no Peru (uma espécie de bíblia dos sociólogos locais).
Alan García governou o Peru entre 1985 e 1990, na época um país em guerra contra o terrorismo e mergulhado na hiperinflação. Como se explica que seja o favorito nesta eleição? Para Cotler, no governo de García, o país era cenário dos ataques da guerrilha do Sendero Luminoso, o narcotráfico era muito poderoso e também havia a hiperinflação. Muitos sindicatos desapareceram e a classe média foi arruinada. Por isso, explica o sociólogo, as pessoas buscaram um salvador e elegeram Alberto Fujimori como presidente. As pessoas queriam uma salvação e, do outro lado, estava Mario Vargas Llosa, que prometia ajuste econômico, privatizações, enfim, o modelo neoliberal. García dizia que um eventual governo de Vargas Llosa provocaria um clima de violência no país. Já Fujimori dizia que não haveria ajuste, que resolveria os problemas dos pobres, que em seu governo haveria consenso e assim conseguiu os votos da esquerda. Era uma aliança contra o neoliberalismo.
Hoje, aponta Cotler, há 30% de humalistas e 25% de apristas. Mas a questão é que se formou uma frente anti-Humala que favoreceu a candidatura de García. Apesar das suspeitas de corrupção em seu governo e do fantasma da hiperinflação.
Para Cotler, a corrupção é sistêmica no Peru. "Todo mundo sabe e aceita que os políticos roubam. Senão como você explicaria que a filha do ex-presidente Alberto Fujimori (1990-2000) tenha sido a candidata mais votada nas eleições legislativas? Quem se interessa pela democracia no Peru? Os pobres querem assistência. Fujimori viajava todos os dias ao interior do país, chegou a lugares onde ninguém chegou. Não interessam as denúncias de violação dos direitos humanos, muitas pessoas até afirmam que quem morreu tinha motivos para ser assassinado", afirma.