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A última aparição pública do ditador da Nicarágua, Daniel Ortega, aconteceu 31 dias atrás. Em meio à pandemia de coronavírus, Ortega foi visto pela última vez em 12 de março, quando participou de uma videoconferência com líderes centro-americanos sobre a pandemia.
Ele estava em El Carmen, a residência oficial do governo, ao lado de sua esposa e vice-presidente, Rosario Murillo, de autoridades do Ministério da Saúde e da Organização Pan-americana da Saúde (Opas).
Desde então, teve início uma onda de especulações sobre o paradeiro do ditador. A imprensa mundial especula sobre a sua situação de saúde e houve até rumores sobre o seu possível falecimento, que poderia ter sido mantido em segredo. O desaparecimento também provocou o compartilhamento de memes que dizem "Faça como Ortega, fique em casa".
O sumiço público de Ortega não é inédito, embora essa ausência que já dura mais de quatro semanas seja um recorde para o ditador. Segundo o jornal nicaraguense Confidencial, o mandatário costuma passar por grandes períodos de ausência sem explicações, e sua agenda registra apenas 84 atividades oficiais em um período de quase dois anos (729 dias).
Nem o falecimento, em 2 de abril, do deputado orteguista Jacinto Suárez, um de seus aliados mais próximos, fez Ortega deixar o confinamento.
A oposição se manifestou dizendo que, diante do vazio de poder e da negligência da ditadura para enfrentar a crise, devem ser reforçados os esforços para "propiciar a saída do regime e preparar-se para governar oferecendo uma transição democrática", relatou o jornal nicaraguense La Prensa.
Regime orteguista contraria autoridades de saúde
As críticas ao regime de Ortega diante da crise mundial têm sido numerosas. O país tem contrariado as orientações dos órgãos internacionais de saúde e não tem implementado medidas para conter o avanço da Covid-19 em seu território, denuncia a imprensa local.
As crianças continuam indo à escola e as fronteiras do país estão abertas, contrariando as recomendações dos especialistas.
A Nicarágua confirmou o seu primeiro caso positivo para Covid-19 em 12 de março. Até esta segunda-feira (13), o país, de 6,2 milhões de habitantes, registra nove casos e uma morte por infecção pelo novo coronavírus; quatro se recuperaram, segundo os dados oficiais.
Já o Observatório Cidadão Covid-19, organizado por especialistas independentes, relatava 184 casos até a quinta-feira passada.
Enquanto a maioria dos países tem cancelado eventos com grande concentração de pessoas, o regime orteguista convocou funcionários públicos e apoiadores a participar de uma marcha em 14 de março, chamada de "Amor em tempos de Covid-19", apesar das recomendações das autoridades de saúde de evitar aglomerações neste momento.
Opositores criticaram a decisão do regime, dizendo que a convocação foi uma "irresponsabilidade" em tempos de combate à propagação do vírus. Ortega e Rosario Murillo não participaram do evento convocado por eles mesmos.
Milhares de simpatizantes sandinistas participaram da marcha na capital, Manágua, e em outras cidades.
E enquanto cidadãos de todo o mundo permaneceram em casa durante a Semana Santa, o regime da Nicarágua chamou a população a participar de diversas festividades durante o feriado. "Mais de 80 atividades serão realizadas na Nicarágua no período da Semana Santa, de 4 a 12 de abril", informou o Ministério do Turismo.
Não é só a ausência do chefe do Executivo que complica a resposta da Nicarágua à pandemia de coronavírus. O país tem três ministras da Saúde, conforme anunciou Rosario Murillo em 1 de abril, o que contribui para a falta de clareza com relação às medidas de combate ao vírus.
Segundo o Infobae, a ministra da Saúde da Nicarágua até 26 de julho de 2019, Sonia Castro, recebeu sanções dos Estados Unidos, em 21 de julho de 2019. Ela foi acusada pelos EUA de "graves violações aos direitos humanos", ao negar atenção médica a opositores durante série de protestos contra o governo. Por causa da sanção, Ortega a destituiu e a nomeou para o cargo de "ministra assessora do presidente sobre temas de saúde", até então inexistente.
Em seu lugar, foi nomeada Carolina Dávila, que foi destituída em meio à crise do coronavírus e designada "ministra assessora" do sistema de Saúde de Manágua.