Com um comparecimento abaixo de 49% de seus eleitores (o menor deste século), o Irã escolheu o novo presidente do país: Ebrahim Raisi. O processo eleitoral no país é bastante controverso, a candidatura à Presidência depende da aprovação do chamado Conselho dos Guardiões, que é o principal órgão decisório do país e tem forte influência do Líder Supremo do Irã, o aiatolá Ali Khamenei. Raisi era chefe do judiciário iraniano desde 2019.
Raisi prometeu durante sua campanha eleitoral reviver o acordo nuclear de 2015, com a expectativa de suspender as punições dos Estados Unidos. Mas o novo presidente do Irã tem sombras em seu passado, por sua atuação na revolução iraniana durante os anos 1980, e que talvez possam comprometer seus planos.
Naftali Bennett, o novo primeiro-ministro de Israel, por exemplo, exortou os líderes mundiais a evitar o novo presidente do Irã, acusando-o de “carniceiro”, por alegações de que ele foi cúmplice do massacre de milhares de prisioneiros políticos em prisões iranianas em 1988.
“A eleição de Raisi é, eu diria, a última chance para as potências mundiais acordarem antes de retornar ao acordo nuclear e entender com quem estão negociando”, disse Bennett em uma reunião de gabinete em 20 de junho deste ano.
O papel de Ebrahim Raisi na revolução
Ebrahim Raisi, que hoje com 60 anos, soube crescer gradualmente nos bastidores da política iraniana desde a revolução de 1979 e soube durante sua carreira estreitar seus laços com o Supremo Líder e o Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica. Durante a guerra revolucionária, ele estava sendo treinado para ser um clérigo na cidade sagrada de Qom.
O novo presidente do Irã também casou-se, em 1983, com a filha do bem relacionado líder de orações de Meshed, Ahmad Alamolhoda.
Em 1988, Raisi era um jovem promotor comprometido com a consolidação da revolução iraniana que havia se iniciado em 1979. Foi nesse ano que Raisi teria facilitado a morte de 3 mil membros do movimento de resistência Mujahedin-e Khalq (MEK), também conhecido como Organização dos Mujahidin do Povo Iraniano, após o fim da guerra com o Iraque. Ele tinha 28 anos à época.
A sua atuação no chamado “comitê da morte” foi denunciada pela Anistia Internacional em 2018. Segundo o relatório da ONG, as execuções teriam acontecido entre o final de julho e o início de setembro de 1988. Os corpos das vítimas, enterrados em valas comuns não identificadas.
Em 2000, Hossein Ali Montazeri, um dos líderes da revolução iraniana, publicou suas memórias e revelou nelas uma cópia da fatwa secreta (ordem religiosa) que o ex-aiatolá Rouhollah Khomeini havia emitido no final de julho de 1988, ordenando a execução de todos os prisioneiros que permaneciam "firmes" em seu apoio ao MKO.
O relatório da Anistia Internacional afirma que "a revelação da fatwa de Rouhollah Khomeini confirmou os testemunhos dos sobreviventes sobre a composição dos comitês e que eles foram instruídos a serem implacáveis em sua abordagem".
Raisi sempre se manteve silencioso sobre o assunto, mas em uma palestra em 1.º de maio de 2018, analisada pela Anistia Internacional, defendeu as mortes em massa em linguagem velada, classificando-as de “confrontação”. Raisi também elogiou o ex-aiatolá Rouhollah Khomeini como um “herói nacional”.
O relatório conclui que: “Os desaparecimentos forçados e as execuções extrajudiciais de milhares de dissidentes políticos no Irã em 1988, bem como as décadas de acobertamento envolvendo a negação da verdade e os maus tratos às famílias das vítimas, fazem parte de um ataque generalizado e sistemático contra civis por parte das autoridades iranianas que visavam perseguir e eliminar dissidentes políticos, silenciar opositores e apagar todas as vozes que promovessem uma visão política diferente para o Irã pós-revolucionário.”
Além de Raisi, outros membros ou ex-membros proeminentes do governo iraniano, faziam parte do comitê, como Alireza Avaei, Hossein Ali Nayyeri, Mohammad Hossein Ahmadi e Mostafa Pour Mahammadi.
Este último afirmou em entrevista à BBC em 2016, quando era Ministro da Justiça: “Estamos orgulhosos de ter cumprido o mandamento de Deus em relação aos monafeqin [termo pejorativo para se referir a MEK, e significa algo como “hipocritas”] e de ter defendido com força e lutado contra os inimigos de Deus e do povo... Estou em paz e não perdi o sono [com isso] por todos esses anos porque agi de acordo com a lei e o Islã.”
Apesar de a vitória eleitoral de Raisi chocar os países ocidentais -- um editorial do jornal britânico The Telegraph afirmou literalmente que o novo presidente do Irã deveria estar na prisão e não no poder --, no Irã, seu papel no morticínio nunca foi discutido, sobretudo durante a campanha eleitoral. O jornal France24 relata que “os assassinatos de 1988, que ocorreram de julho a setembro daquele ano, supostamente por ordens diretas do líder revolucionário aiatolá Ruhollah Khomeini, permanecem quase um tabu no Irã moderno”.
Em novembro de 2019, Raisi foi incluído pelo Tesouro dos EUA nas sansões contra membros do círculo íntimo de Ali Khamenei. Ainda não se sabe, contudo, de que forma a eleição de Raisi afetará a retomada de um acordo nuclear dos EUA com o Irã, dado que a decisões mais importantes do país dependem muito mais do aiatolá Khamenei.
Menos é mais? Como são as experiências de jornada 4×3 em outros países
Banco americano rebaixa Brasil e sobe classificação das ações da Argentina
Ministro da Defesa diz que investigação vai acabar com suspeitas sobre Forças Armadas
Janja “causa” e leva oposição a pedir regras de conduta para primeiras-damas
Deixe sua opinião