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Imigração

Domésticas lutam por direitos no difícil mercado de trabalho dos EUA

Manifestação de domésticas por direitos trabalhistas, na Califórnia, em fevereiro | Divulgação
Manifestação de domésticas por direitos trabalhistas, na Califórnia, em fevereiro (Foto: Divulgação)
Natalícia Tracy, brasileira e uma das líderes do movimento em defesa dos direitos trabalhistas das domésticas nos Estados Unidos |

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Natalícia Tracy, brasileira e uma das líderes do movimento em defesa dos direitos trabalhistas das domésticas nos Estados Unidos

Enquanto no Brasil a mudança na Constituição que deu direitos trabalhistas a empregados domésticos balançou o cotidiano da classe média, nos Estados Unidos a luta da categoria se intensificou neste ano em busca de resultados – e conta com brasileiros na linha de frente. Em Massachusetts, estado no leste dos EUA onde as negociações com o Legislativo estão mais avançadas, o movimento das domésticas pressiona para que seja aprovada a carta de direitos específica para os trabalhadores.

A categoria quer regulamentar garantias de proteção contra a falta de benefícios e de segurança, salários baixos, maus-tratos e assédio sexual. Desde janeiro, quando a proposta foi entregue ao governo, foram feitas audiências em Boston e cidades vizinhas. Está agendada para o dia 23 uma manifestação, com panelaço, em frente da sede do governo. O protesto é similar ao que houve em Los Angeles, em março, com a participação de filhos dos trabalhadores e até de famílias que os empregam.

Em cada ato, cartazes contêm frases em seis línguas: inglês, espanhol, criolo (francês caribenho), filipino, chinês e português. Não por menos: o emprego é típico de imigrantes. A estimativa é de que 70% das cerca de 120 mil brasileiras que vivem em Massachusetts trabalhem como domésticas – são babás, cuidadoras e faxineiras.

Por enquanto, a mobilização obteve sucesso no estado de Nova York, onde uma carta de direitos já foi sancionada. No Havaí, os trabalhadores esperam que o governo autorize as normas. Projeto similar começou a tramitar no Oregon neste ano. Enquanto reivindicam, as militantes recebem ameaças por e-mail e telefone – parte do mercado, como agenciadores, não apoiam que os salários sejam regulamentados.

Trabalho duro

Uma das líderes do movimento nos EUA é a paulista Natalícia Tracy, 41 anos, 23 deles morando em Boston. Segundo ela, uma das formas mais comuns de empregadores achatarem o mercado é pagar o empregado por dia ou até mês, em vez da regular remuneração por hora (US$ 10 a US$ 25, ou R$ 20,30 a R$ 50,80).

São rotineiras falhas relacionadas ao pagamento de horas extras, que segundo a lei geral de trabalho deve ocorrer sempre que a carga horária semanal ultrapassar 40 horas na casa da família. As condições de trabalho dos imigrantes estão ligadas à origem do trabalhador. "Depende de como a pessoa veio para os EUA", diz.

Quando chegou ao país, aos 19 anos, Natalícia trabalhou para uma família de domingo a domingo. Emigrou em busca de oportunidades que não vislumbrou no Brasil, mas avalia que a realidade foi bem mais difícil do que achava. Ela recebia cerca de US$ 25 dólares por semana – hoje, o mínimo federal é de US$ 9 dólares por hora.

Agora, por causa da militância, Natalícia rompeu a barreira do subemprego e está prestes a se tornar doutora em Sociologia pela Universidade de Mas­sachusetts. Mas mesmo que tenha deixado de exercer o trabalho que a sustentou quando chegou aos EUA, não abandonou a causa das domésticas.

Brasileira pagou US$ 8 mil para conseguir uma cota de clientes

Quando emigrou para os EUA, em 1984, uma paulista de 52 anos chegou com trabalho certo. Formada em engenharia, L., que pediu para não ser identificada, tinha emprego em uma firma que logo faliu. Foi quando ela, aconselhada por brasileiros, começou a trabalhar com limpeza – ser uma "helper".

Primeiro, foi agenciada por compatriotas que tiravam uma porcentagem da remuneração. Para aumentar o salário, comprou uma cota de 12 clientes de uma brasileira que estava prestes a voltar para o Brasil. O pacote custou US$ 8 mil (R$ 16,3 mil), conseguidos por meio de empréstimo. Na primeira semana, dois clientes desistiram do serviço. E ela nunca conseguiu tirar os US$ 2 mil mensais prometidos quando adquiriu a cota. "São US$ 1,4 mil no máximo", diz.

Essa é uma faceta do trabalho doméstico nos EUA que vem pouco à tona. Agenciadores informais costumam ter controle da clientela, uma vez que as famílias não costumam contratar empregados sem referências. Foi provavelmente um desses agenciadores que enviou, nesta semana, uma mensagem via celular para L., em que ameaçava a família dela. "A pessoa dizia que eu era uma ignorante e me pedia para tomar cuidado com a militância", disse ela, que participa da mobilização dos trabalhadores no leste dos EUA.

Idioma

O mercado difícil é o que resta para imigrantes que não têm fluência em inglês, assim como trabalhar em cozinhas de restaurantes e na construção civil. Para manter o emprego, é comum que domésticos se submetam ao que não querem. "Limpei uma chaminé e fiquei uma semana achando ciscos pretos em mim. Mas precisava agradar ao cliente", diz L. O ritmo de trabalho impede muitas vezes que o trabalhador consiga emprego melhor por meio da qualificação. Não há tempos para estudar. "É um ciclo vicioso. Você trabalha o dia inteiro com serviços pesados. Não consegue ir à aula porque está muito cansada ou porque não tem tempo."

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