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O alto comissário da ONU, Volker Turk, disse no discurso de abertura da 54ª sessão do Conselho de Direitos Humanos nessa segunda-feira (11), em Genebra, que apoia a discussão para incorporar o "ecocídio", entendido amplamente como a destruição do meio ambiente, como um crime que pode ser julgado pelo Tribunal Penal Internacional (TPI).
O uso do termo não é uma novidade nos encontros de representantes mundiais. Sua primeira aparição aconteceu ainda na década de 1970, ocasião na qual os EUA foram acusados na Conferência das Nações Unidas sobre o Ambiente, em Estocolmo, de usarem o agente laranja, um produto químico desfolhante que destruiu florestas do Vietnã durante a guerra e deixou vastas áreas estéreis.
A partir disso, os debates sobre o assunto ganharam força e levaram os Estados signatários do Estatuto de Roma, que futuramente criariam o TPI ou Tribunal de Haia, a considerar a possibilidade de "ações violentas" contra o meio ambiente em larga escala serem um crime passível de punição.
No entanto, a proposta não foi incluída no texto oficial de 1998, que até hoje só engloba quatro tipos de violações que podem levar a condenações: genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e de agressão.
Em 2017, 19 anos depois da criação do TPI, o órgão conseguiu "abrir um caminho" para incluir o ecocídio como um delito contra a humanidade.
O tribunal afirmou na ocasião que passaria a interpretar certas ações que atingem populações, como a grilagem de terras, desmatamento e mineração desenfreada, como violações que destroem as condições básicas de existência da humanidade e podem provocar o genocídio.
Nestes casos, os interessados em denunciar os ataques ambientais teriam que apresentar provas que encaixariam a situação em um dos crimes já tipificados pelo Tribunal Penal Internacional e as pessoas atingidas teriam a possibilidade de entrar com um recurso internacional no tribunal para obrigar os autores do crime a pagar indenizações morais ou econômicas.
Dois anos depois, em 2019, uma nova tentativa surgiu entre ambientalistas, cientistas e acadêmicos para transformar a expressão em um crime internacional. No entanto, mais uma vez, o plano não saiu do papel e o tema continuou restrito às legislações nacionais de cada país.
Segundo o jornal espanhol El País, com o movimento crescente do ativismo ambiental, um grupo de 12 advogados especialistas em direito internacional, impulsionado pela sociedade civil, apresentou uma definição em novembro de 2020 para o Estatuto de Roma.
“Para os efeitos do presente Estatuto, entender-se-á por ecocídio qualquer ato ilícito ou arbitrário perpetrado com consciência de que existem grandes probabilidades de que cause danos graves que sejam extensos ou duradouros ao meio ambiente”, diz o documento.
A proposta foi apresentada aos Estados-membros e teve apoio de países signatários, como França, Bélgica e Espanha, segundo afirmou a presidente da Fundação Stop Ecocide, Jojo Mehta. Além disso, o projeto também contou com a defesa do papa Francisco, o que mostra um interesse de autoridades de "alto escalão" nesse processo de igualar a destruição humana à devastação ambiental.
Críticos da medida afirmam que a definição é genérica e ampla, passível de interpretações ideológicas e questionamentos. Um artigo do portal da revista National Review, de Wesley Smith, membro sênior do Centro de Excepcionalismo Humano do Discovery Institute, afirma que “ambientalistas que detestam atividades empresariais não estariam interessados em saber se houve ou não intencionalidade em determinada ação” para denunciar o caso e torná-lo potencialmente criminoso.
Para ser incluído no TPI, dois terços dos países-membros precisam aprovar a decisão, o que envolve concordância dos signatários com as punições, caso um deles cometa alguma violação ambiental. Após anos de tentativas frustradas, a tipificação do crime não parece estar perto de acontecer.
Um artigo de Smith também publicado pela National Review apresentou algumas questões negativas sobre o conceito.
Segundo o texto, o “ecocídio” tem potencial de se tornar uma ferramenta de acusação criminal entre os países-membros, incluindo o Brasil, que possui a maior parte do território amazônico em sua posse e pode se tornar um alvo.
O artigo também afirma que, apesar dos países governados pela esquerda possuírem graves problemas ambientais como, por exemplo, o derramamento de petróleo nos oceanos, como a Venezuela, a defesa da pauta é impulsionada pela ideologia contrária ao livre mercado, portanto, as condenações no TPI virariam atos políticos de defesa dos socialistas.
"Um dos problemas dos 'direitos da natureza' é que permitiriam a qualquer pessoa entrar com um processo para impedir qualquer uso significativo da terra ou extração de recursos por violar o suposto 'direito' da 'natureza' de 'existir', persistir, manter e regenerar seus ciclos vitais, estrutura, funções e seus processos em evolução'", afirmou o autor.
"Pense nos 'direitos da natureza' como um 'escudo' contra empresas de grande escala", disse ainda.