Pela segunda vez em sua história, os egípcios vão escolher um presidente. A data da eleição e os detalhes do pleito serão divulgados neste domingo pela Comissão Eleitoral do Egito. Pelo que se vislumbra, o pleito estará mais para uma consulta popular, que deverá referendar o nome de Abdel Fatah al-Sisi como o novo presidente. Desde a deposição de Mohammed Mursi, primeiro presidente eleito democraticamente no país, a oposição vem sendo sufocada através de leis restringindo protestos, prisões e centenas de condenações à morte. O país se divide entre a expectativa de um recomeço e o temor de que um governo repressor se restabeleça.
Na última semana, Sisi anunciou sua saída das Forças Armadas para se candidatar à presidência. De acordo com a nova Constituição egípcia, aprovada em janeiro, um militar não pode governar o país. Coordenador do golpe que destituiu Mursi em julho do ano passado, Sisi está com a popularidade em alta entre muitos egípcios. No entanto, sua condição de militar e algumas ações do governo interino, como a condenação à morte de 529 ativistas da Irmandade Muçulmana, na última semana, lançam dúvidas quanto à condição democrática do país.
Professor da American University, no Cairo, Emad El-Din Shahin manifestou sua preocupação em um artigo publicado no jornal britânico The Guardian. Para ele, a direção que o Egito está tomando é "uma perigosa mistura de autoritarismo e corrupção, na melhor das hipóteses uma reedição do regime de Hosni Mubarak". Para ele, Sisi tem poucas chances de trazer estabilidade, face à crise na segurança e na economia. "Para restaurar a segurança e a estabilidade, os militares devem ficar longe da política de uma vez por todas", acrescenta.
Essa visão pessimista é compartilhada por Silvia Ferabolli, doutora pela Escola de Estudos Orientais e Africanos da Universidade de Londres e que já morou no Egito de Mubarak. Na sua avaliação, a perseguição à Irmandade Muçulmana e a renovação da frota de guerra pelo governo egípcio são indicativos claros de que a repressão aumentará. "Sisi está evocando o mesmo discurso de Mubarak, segundo o qual, quem não é a favor do governo, é terrorista. Ou seja, haverá ainda mais repressão, qualquer pessoa poderá ser colocada na cadeia", avalia.
Colaborou Matheus Chequim.
Expectativa
Há dois anos no país, paranaense prevê mais insatisfação
Nas ruas do Cairo ainda acontecem manifestações contrárias ao governo, muitas delas terminando em confronto com a polícia. O número é pequeno se comparado ao dos violentos protestos que tomaram o país após a queda de Mohammed Mursi, no ano passado.
O curitibano Luiz Guilherme Mello, professor que vive há quase dois anos no Cairo, afirma que, mesmo com novas eleições em vista, a expectativa é de mais insatisfação popular e possibilidade de tumulto. "A maioria [dos egípcios] entende que o partido vencedor vai sempre buscar promover um determinado grupo da sociedade em detrimento das minorias, incluindo aí aspectos religiosos e de liberdade de expressão", afirmou por e-mail à Gazeta do Povo.
Enquanto as manifestações perderam força, a criminalidade no Egito cresceu nos últimos meses. "O governo recentemente decretou a falência do setor de turismo e o aumento constante da criminalidade é certamente em decorrência da falta de renda. Antigamente, quem não tinha emprego conseguia fazer bico no setor", diz.