Marine Le Pen : a extrema-direita chega ao segundo turno.| Foto: Alain Jocard/AFP

A confusa eleição francesa de 2017 ficou muito mais clara após o fechamento das urnas no primeiro turno: os eleitores escolheram dois nomes externos à disputa entre os partidos que dominam o cenário político nacional desde a Segunda Guerra, deixando evidente a insatisfação com os últimos governos. Agora, a disputa fica entre Marine Le Pen, uma radical de extrema-direita; e Emmanuel Macron, um novato com discurso moderado.

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Seis coisas para você saber sobre o segundo turno na França

Eleições francesas: o que pensam Macron e Le Pen, os candidatos que vão para o 2.º turno

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O segundo turno francês agora tende a se parecer muito com as duas últimas votações que o mundo acompanhou de perto – a disputa pela Presidência americana e o plebiscito sobre a saída do Reino Unido da União Europeia. Nos dois casos, a direita saiu vencedora com propostas isolacionistas que colocaram os interesses locais acima da comunidade internacional. Na França, a aposta até aqui é de que isso não se repetirá, em parte devido ao posicionamento radical de Le Pen. Mas, como mostrou a derrota de Hillary Clinton, é difícil prever o resultado de eleições em que propostas extremas estão postas.

Macron, um ex-executivo do setor bancário com pouca experiência política, é considerado o favorito para o segundo turno da eleição presidencial de 7 de maio, depois de receber 23,75% dos votos no primeiro turno e ficar à frente da líder da Frente Nacional (FN), que recebeu 21,53%, de acordo com resultados definitivos.

Marine Le Pen é a herdeira da Frente Nacional, um partido xenófobo que chegou a levar seu pai, Jean-Marie, ao segundo turno de 2002 contra Jacques Chirac. Marine tenta dissociar o partido de declarações antissemitas de seu pai, que menosprezava o Holocausto e tinha nítidas tendências antissemitas. Mesmo assim, seu programa é de confronto com estrangeiros e migrantes e sua candidatura defende que a França siga o caminho inglês e abandone a Europa.

O extremismo da candidatura fez com que toda a política tradicional pendesse para o lado de Macron assim que os resultados do primeiro turno ficaram claros. François Fillon, o candidato da centro direita que foi primeiro-ministro na era Sarkozy, terminou a disputa em terceiro lugar com 19,91% dos votos, deixou claro que irá apoiar Macron. “O extremismo só pode trazer infelicidade e divisão à França. A única opção é votar contra a extrema-direita”, disse o candidato.

Candidato pelo outro grande partido francês, o socialista Benôit Hamon, que teve apoio do atual presidente François Hollande, fez um pedido “solene” de votos para Macron para que a França “derrote a Frente Nacional e impeça o projeto desastroso de Marine Le Pen que seria um retrocesso para a França e dividiria seu povo”. Hamon admitiu um “desastre” eleitoral, com apenas 6,35% dos votos. O radical de esquerda Mélenchon, quarto colocado com cerca de 19,5% dos votos, foi um dos poucos que ainda não se manifestou até o momento.

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Pronunciamentos

“Em um ano mudamos a face da política francesa”, declarou Macron aos simpatizantes, que comemoraram o resultado de domingo nas ruas de Paris.

“Estamos vivendo um momento histórico, com um candidato que sai do bipartidarismo, que vai renovar a classe política e que é uma boa notícia para a Europa”, afirmou Quentin, um fervoroso eleitor de Macron.

Le Pen também celebrou um “momento histórico”, com um recorde de 7,6 milhões de votos. “Superamos a primeira etapa”, disse a candidata da extrema-direita, que repete 15 anos depois a façanha do pai.

“Há muitos anos esperava por isto, anos em que nos cuspiam, nos chamavam de nazistas. Mas no fim as pessoas abriram os olhos”, afirmou Aldric Evezard, 36 anos, militante da FN.

As manchetes dos jornais resumem o terremoto político registrado no domingo e o que está em jogo no segundo turno. “A direita sofre nocaute”, afirma o conservador Le Figaro. O esquerdista Libération publica uma foto de Macron com a manchete: “A um passo”. “Jamais!”, exclama o comunista L’Humanité, com uma imagem de Marine Le Pen.

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Em jogo

O que está em jogo no segundo turno foi destacado logo de início pelos dois candidatos: Europa e globalização.

Diante de seus eleitores reunidos na zona sul de Paris, Macron afirmou que levaria a “voz da esperança” para a França e a Europa.

“O que está em jogo nesta eleição é a globalização selvagem que coloca em perigo nossa civilização”, afirmou Le Pen, que defende o abandono do euro e propõe um referendo sobre a permanência da França na União Europeia, o que representaria um golpe fatal a um bloco já fragilizado pelo Brexit.

Macron e Le Pen dispõem de 15 dias para convencer os 47 milhões de eleitores. O vencedor do segundo turno terá em seguida a complexa missão de negociar alianças para as eleições legislativas de junho.

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Seis coisas para você saber sobre o segundo turno na França

“Frexit”

Depois do “Brexit”, a saída da Grã-Bretanha da União Europeia, a França poderia ser a nova potência a deixar o bloco. Marine Le Pen deixa clara sua posição contra a permanência do país no bloco, ao contrário de Macron. Caso a França saísse, apenas a Alemanha, dentre os países mais fortes da Europa seguiria na UE, o que poderia levar a uma dissolução completa do grupo.

Quem tem maioria?

Ao contrário do que acontece no Brasil, as eleições para o Parlamento não acontecem no mesmo dia da votação para o Executivo. Os deputados serão eleitos após a decisão da Presidência, e a ideia é que os eleitores possam saber assim se estão escolhendo alguém que apoiará o Executivo ou que fará oposição. Analistas dizem ser difícil que Le Pen consiga maioria congressual.

Imigrantes

Como em toda eleição europeia recente, o tema da imigração é central. Marine Le Pen representa os eleitores que acreditam que o país está aberto demais à entrada de estrangeiros e que o país deveria tomar uma guinada contra o multiculturalismo.

Putin

Jornalistas que cobrem a Rússia dizem que é evidente a preferência de Vladimir Putin pela candidatura de Marine Le Pen. Os dois têm uma boa relação. Já a possível vitória de Macron é considerada um revés para o projeto do presidente russo.

Ponto de virada

A eleição francesa de 2017 já é um marco histórico: pela primeira vez desde a Segunda Guerra os dois partidos tradicionais da direita e da esquerda ficaram de fora do segundo turno presidencial. Até hoje, só Jean-Marie Le Pen tinha conseguido passar para o segundo turno em um terceiro partido, em 2002. Mas foi derrotado por Chirac.

Apoio europeu

Macron recebeu apoio dos defensores da União Europeia. Steffen Siebert, porta-voz de Angela Merkel, disse ser bom que Macron “tenha tido sucesso com suas posições de defesa de uma União Europeia forte”. Martin Schulz, ex-presidente do Parlamento Europeu, pediu a “todos os democratas franceses que se unam para que a nacionalista não se torne presidente.”