A palavra “reconciliação” não foi incluída no discurso vitorioso de Keiko Fujimori, candidata mais votada no primeiro turno da eleição presidencial peruana, por acaso. Para passar dos 39,55% obtidos domingo passado (com 82,6% dos votos apurados) aos 50% mais um dos votos no próximo dia 5 de junho, a filha do ex-presidente Alberto Fujimori (1990-2000) — preso desde 2007 condenado por corrupção e crimes de lesa-Humanidade — precisará convencer eleitores que repudiam o governo de seu pai. Analistas consideram que um a cada dois peruanos é antifujimorista, e representar esse sentimento será, justamente, a principal jogada do adversário de Keiko, o ex-ministro da Economia Pedro Pablo Kuczynski, que ficou em segundo lugar, com 22,11%.
Mas, se para a candidata do partido Força Popular não será fácil aumentar em pouco mais de dez pontos percentuais os votos necessários para eleger-se sucessora do presidente Ollanta Humala — que a derrotou no segundo turno das presidenciais de 2011 — tampouco o ex-ministro terá uma tarefa fácil. Para Kuczynski, será complicado explicar seu perfil antifujimorista, quando há cinco anos subiu no palanque de Keiko contra Humala.
Disputa pelos eleitores esquerdistas
O candidato de “Peruanos pela Mudança” deverá, ainda, encontrar a maneira de captar os votos da esquerdista Verónika Mendoza (que ficou em terceiro lugar, com 18,27%), a quem atacou duramente durante a primeira etapa da campanha e com quem diverge praticamente em tudo.
“Para Keiko, este segundo turno será um pouco mais fácil do que enfrentou em 2011. São dois candidatos de direita e há cinco anos Humala era o antifujimorismo em pessoa, algo que Kuczynski não pode ser”, explicou Arturo Maldonado, professor da Universidade Católica de Lima.
Está claro que ambos os candidatos têm pela frente um caminho com vários obstáculos. A questão é saber quem será mais habilidoso para superá-los.
“Em pesquisas prévias, quando se colocava uma queda de braço entre Keiko e Kuczynski, o resultado era praticamente um empate técnico. Para os eleitores de esquerda, o dilema será grande”, comentou o jornalista Fernando Vivas, colunista do “El Comercio”.
Essa é uma das grandes incógnitas do momento. O que farão os eleitores de Verónika, que votaram por uma mudança de modelo econômico, reforma da Constituição, casamento gay e outras iniciativas de vanguarda e progressistas. Tanto Keiko como Kuczynski são, claramente, candidatos que não pretendem mexer nos pilares da economia e da política peruana.
“O fujimorismo representa uma grande ameaça para a esquerda, porque é um movimento muito forte nos bairros mais humildes e populares, é uma direita popular”, disse Vivas.
De fato, a principal base de apoio de Keiko, de 40 anos, é de eleitores de baixos recursos de Lima e das regiões mais pobres do Peru. Nesses setores, a filha de Fujimori enfrentou a dura concorrência de Verónika, considerada, aos 35 anos, a grande revelação da eleição presidencial.
Para aproximar-se dos ideologizados eleitores de Verónika, o ex-ministro da Economia deverá esquecer os insultos ditos no passado (entre eles o de “terrorista vermelha”) e estender a mão a setores que esperam grandes mudanças no Peru.
Kuczynski deverá, basicamente, moderar seu discurso e tentar mostrar-se mais aberto ao diálogo e menos veemente em suas opiniões. O ex-ministro da Economia, de 77 anos, tem certa dificuldade em comunicar-se com os mais jovens e, principalmente, com os moradores das regiões interiores. Ninguém se esquece quando Kuczynski, sendo ministro do governo de Alejandro Toledo (2000-2006), afirmou que na região andina do país “a altura impede que o oxigênio chegue ao cérebro”.
“Kuczynski apoiou Keiko em 2011 e chegou a dizer que o fujimorismo foi importante para o país”, lembrou a analista Adriana Urrutia.
O mais provável, diz ela, é que sejam organizadas novas marchas contra o retorno do fujimorismo ao poder.
“Keiko deverá redobrar esforços para mostrar-se moderada e como a representante de um novo fujimorismo, sem perder o respaldo de sua base mais importante”, frisou Adriana.
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