Em um processo relâmpago, o ex-bispo Fernando Lugo foi destituído da Presidência do Paraguai por volta das 18h30 de ontem após o Senado aprovar um pedido de impeachment contra ele. O homem que no passado ficou conhecido como bispo dos pobres e acabou, nas urnas, com a hegemonia de 61 anos do Partido Colorado, o maior do país, deixou o Palácio de López a 14 meses de encerrar o mandato.
Ontem mesmo, o vice-presidente, Federico Franco, do Partido Liberal Radical Autêntico (PLRA), antigo aliado de Lugo, assumiu o comando do país. É a primeira vez em 70 que os liberais chegam ao poder no Paraguai.
Em discurso proferido logo após deixar o cargo, Lugo, que tem 61 anos e nunca havia ocupado sequer um cargo político, disse que aceitava a decisão do Congresso, mas acusou o Senado paraguaio de ferir profundamente a democracia e a história paraguaia, além de transgredir todos os princípios de defesa de maneira covarde e premeditada. Ele agradeceu à população, aos companheiros de partido, às Forças Armadas e aos movimentos sociais. "Hoje saio pela porta maior. Pela porta do coração dos paraguaios".
Votação
Dos 45 parlamentares que compõem o Senado paraguaio, 39 votaram a favor do impeachment, quatro contra e dois não compareceram à sessão. Para o pedido ser aprovado, era necessário a maioria absoluta de dois terços, segundo o artigo 225 da Constituição Paraguaia, ou seja, 30 votos. O presidente foi declarado culpado pelo mau uso das funções públicas. Conforme a Constituição paraguaia, um presidente só pode ser submetido ao juízo político por mau desempenho das funções e por delitos comuns ou cometidos no exercício do cargo.
Entre os que rechaçaram a destituição do presidente está o senador Carlos Filizzola, que ocupava o cargo de ministro do Interior quando ocorreu uma desocupação frustrada de terra em Caraguaty, a 290 quilômetros de Foz do Iguaçu, fato que resultou na morte de seis policiais e 11 sem-terra e tornou-se o estopim para a derrocada de Lugo. "Não me deixaram falar, me cortaram. Estava tudo montado. Nunca fizeram um juízo político em 24 horas", criticou o senador do Partido País Solidário. Filizzola saiu do ministério do Interior a pouco mais de uma semana por pressão política, após o episódio em Caraguaty, mas permaneceu na base aliada de Lugo.
Processo
O processo de impeachment de Lugo, que durou pouco mais de 24 horas, foi aprovado pela Câmara dos Deputados na última quinta-feira, dia 21, a pedido do Partido Colorado, encaminhado no mesmo dia ao senado e referendado ontem. A rapidez com que o processo foi conduzido foi criticada pelos partidários de Lugo que alegaram falta de tempo para a defesa. Além do episódio em Curuguaty, pesaram contra o ex-bispo outros quatro argumentos, entre os quais, facilitação de invasão de terras, além de conivência com reuniões de jovens socialistas na na sede das Forças Armadas.
No horário previsto para se defender, às 13h brasileira, Lugo não compareceu ao parlamento. Enviou os advogados Adolfo Ferreiro, Emilio Camacho, Luis Samaniego e o procurador-geral da República, Enrique García. Durante duas horas, eles tentaram derrubar os argumentos da acusação e dilatar o prazo para a defesa do presidente, mas não conseguiram desmontar o cenário antiluguista. "Isso é um profundo roubo político e institucional. O que está acontecendo é um erro grave para o futuro da república", criticou Ferreiro.
Conflito agrário com 17 mortes foi o estopim
O conflito que matou 11 agricultores e 6 policiais no Paraguai, no dia 15, foi a gota d´água no desgaste entre o presidente Fernando Lugo e os aliados no Congresso.
Esse desgaste resultou no abandono do apoio a Lugo pelo PLRA (Partido Liberal) e na rápida abertura do impeachment. O líder da sigla, o senador Blas Llano, é pré-candidato à Presidência em 2013 e enfrentava resistências do presidente. O episódio derrubou o ministro do Interior, Carlos Filizzola. Lugo nomeou Rubén Candía, ligado aos opositores colorados.
A medida não apaziguou a oposição e irritou o PLRA, que votou em peso a favor do impeachment.
Veja fotos do impeachment do presidente do Paraguai