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No último fim de semana, o regime chinês divulgou um documento intitulado “China: democracia que funciona”. O informe defende que a autocracia comunista é um regime democrático e direciona várias alfinetadas ao Ocidente, que realizará na quinta (9) e na sexta-feira (10) uma cúpula virtual sobre democracia, convocada pelo presidente americano Joe Biden, que deverá ter a participação de representantes de 110 governos.
China e Rússia não foram convidadas para o evento e manifestaram irritação com o encontro, especialmente Pequim, já que Taiwan, que o regime chinês reivindica como parte do seu território, irá participar.
Em “China: democracia que funciona”, a ditadura comunista sustenta que “a democracia não é um ornamento decorativo, mas um instrumento para abordar as questões que interessam às pessoas”.
“A democracia é um direito das pessoas em todos os países, e não uma prerrogativa de algumas nações. Se um país é democrático, isso deve ser julgado por seu povo, não ditado por um punhado de estrangeiros. Se um país é democrático, isso deve ser reconhecido pela comunidade internacional, não arbitrariamente decidido por alguns juízes autodesignados”, acrescenta o documento, no qual o governo chinês argumenta que “não existe um modelo fixo de democracia; ele se manifesta de muitas formas”.
“Avaliar a miríade de sistemas políticos do mundo com base em um único padrão e examinar diversas estruturas políticas de forma monocromática são em si atitudes antidemocráticas”, aponta.
A exemplo de uma resolução aprovada em novembro em plenária do Partido Comunista da China, o documento coloca a fundação da legenda, que este ano completou cem anos, como o fim de uma era das trevas no país.
“A fundação do PCC em 1921 foi como um farol iluminando o caminho para a democracia na China”, descreve. “Em 1º de outubro de 1949, foi fundada a República Popular da China. Isso marcou a transformação final do país, do domínio da autocracia feudal, que já existia há vários milhares de anos, para uma democracia popular.”
Curiosamente, ao explicar o sistema eleitoral chinês, na qual as eleições “são genuínas e não são manipuladas por interesses financeiros”, o documento admite que “na China, não existem partidos de oposição”, mas alega que o sistema partidário não é um sistema de governo de partido único, já que existem outras oito legendas no país além do Partido Comunista.
Porém, o informe deixa claro que a função dos outros partidos é meramente acessória: “Os outros partidos participam plenamente na administração dos assuntos de Estado sob a liderança do PCC”.
A única menção (bastante sutil) às perseguições e aos vetos que tiram da disputa quem não segue a cartilha do Partido Comunista Chinês é a ressalva de que os únicos cidadãos a partir de 18 anos que não têm o direito de votar e se candidatar são os “privados de direitos políticos nos termos da lei”.
Por fim, o texto argumenta que “os direitos humanos são totalmente respeitados e protegidos” na China. “Viver uma vida de contentamento é o direito humano final. A economia da China manteve um crescimento rápido, estável e de longo prazo, e a vida das pessoas melhorou significativamente”, aponta.
Analistas internacionais receberam o relatório com ceticismo, e diagnosticaram que as tentativas chinesas de se afirmar como uma democracia visam assegurar o poder interno e atrair países em desenvolvimento para o lado de Pequim na disputa geopolítica com os Estados Unidos.
“Xi (Jinping, ditador da China) há muito usa a alegação de que a administração do partido é superior à do Ocidente para legitimar o monopólio de poder do partido”, disse à agência Reuters Charles Parton, ex-diplomata britânico e associado sênior do Royal United Services Institute.