A polícia turca prendeu pelo menos 350 pessoas em diferentes manifestações que ocorrem praticamente de forma ininterrupta desde a tarde deste sábado (15), informou neste domingo (16) o jornal "Hürriyet" ao citar fontes do Colégio de Advogados de Istambul.
Os agentes antidistúrbios turcos dispararam gás lacrimogêneo na rua Istiklal, em Istambul, para impedir que um grupo de manifestantes se aproximasse da praça Taksim, tomada à força na noite de sábado. Os agentes empregaram veículos blindados para fechar a rua para os manifestantes que seguem proferindo cantos de resistência, enquanto os comerciantes da via pedem aos policiais que não disparem mais gás. Ao mesmo tempo, ativistas pró-governo de Tayyip Erdogan estão nas ruas.
Embora alguns poucos manifestantes tenham lançado pedras contra os agentes, a maioria recriminou essa atitude e há pessoas que vestem coletes do sindicato de funcionários KESK que tentam pôr ordem e evitar agressões aos policiais. Os canais de televisão turcos estão transmitindo também imagens de uma multidão que marcha por Akaretler, no distrito de Besiktas.
Estes protestos são uma continuação dos que ocorreram durante toda a madrugada em Istambul depois que os policiais entraram no parque Gezi para despejar os milhares de acampados nesta zona verde, símbolo dos protestos antigovernamentais que abalam a Turquia há três semanas.
Após uma longa noite de protestos, ações da Polícia e choques com os manifestantes, Istambul acolhe neste domingo concentrações tanto a favor como contra o primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan. O partido de Erdogan, o islamita moderado AKP, convocou um comício de apoio ao líder, que já em Ancara foi aclamado por uma multidão à qual se referiu como a "Turquia real", em contraposição com as centenas de milhares de pessoas que estão há quase 20 dias se manifestando contra ele.
Os manifestantes antigoverno em Istambul continuam em pé de guerra, com novos protestos após uma longa noite de confrontos com a polícia, que mantém a praça Taksim e o parque Gezi fechados e com dezenas de trabalhadores apagando as marcas do símbolo da onda de protestos. Enquanto na praça os jardineiros trabalhavam nos jardins floridos, no parque eram retiradas as tendas e barracas que acolheram durante quase três semanas os "çapulcu", os indignados turcos que começaram defendendo uma zona verde para evitar a construção de um centro comercial e que acabaram pondo em xeque o governo turco.
Nos acessos à praça Taksim ainda é possível sentir o cheiro do gás-pimenta usado pelas forças de segurança para dispersar no sábado (15) os manifestantes que ocupavam o parque Gezi, que fica próximo. Até quase o amanhecer, em diferentes pontos da cidade, ocorriam choques entre policiais e milhares de pessoas que, inteiradas da expulsão de manifestantes do parque, fizeram uma passeata em sinal de protesto. "Só jornalistas e agentes", explicou um dos centenas de policiais que formam os cordões de isolamento nas entradas da praça.
A circulação pela praça, na qual há vários hotéis, está inclusive restringida para os turistas, embora um trabalhador de um estabelecimento com entrada pela Taksim tenha afirmado que seus hóspedes não estão tendo problemas. O zelo das autoridades para evitar que Taksim volte a se encher de manifestantes chegou ao ponto de elas advertirem a quem entrar no local que será aplicada a elas a legislação antiterrorista. "A partir deste momento, qualquer pessoa que estiver lá, infelizmente, terá que ser considerada pelo Estado como membro de uma organização terrorista", alertou em uma entrevista à televisão o ministro de Assuntos Europeus, Egemen Bagis.
O ministro pediu que voltem para casa "todos os cidadãos que apoiavam estas ações", em referência aos protestos na praça Taksim e no parque Gezi, segundo declarações recolhidas pelo jornal turco "Hürriyet". Na manhã deste domingo (16), perto do luxuoso hotel Divan, agentes dispararam jatos d'água contra pessoas que estavam às suas portas, e em outro estabelecimento hoteleiro, o Ramada, foram detidos médicos que estavam atendendo feridos durante os confrontos com a polícia, segundo o jornal "Milliyet".
Na principal rua comercial da cidade, a Istiklal, os agentes usaram gás lacrimogêneo para impedir que um grupo de manifestantes chegasse à praça e bloquearam os acessos com tanques. Nestes choques houve cenas de pânico, com muita gente correndo e policiais disparando balas de borracha, além de um agente lançando gás lacrimogêneo contra um jovem que tinha caído no chão após ser atingido pelos projéteis.
Apelo
Erdogan pediu à população neste domingo que não se deixe enganar e não atenda às convocações para manifestações na praça Taksim, em Istambul, eixo da onda de protestos antigovernamentais, que foi desocupada ontem pela polícia. "Apelo ao bom senso da população", disse o primeiro-ministro, que justificou a desocupação da praça e do parque Gezi pelo fato de seus ocupantes insistirem em ficar ali apesar de suas promessas que cumprirá a vontade popular a respeito do polêmico projeto de reurbanizar a área.
Em um grande comício em Istambul, o primeiro-ministro se defendeu das acusações de brutalidade policial contra os manifestantes, realizadas tanto dentro como fora do país. "Antes de nós, a polícia podia usar a força sem nenhum limite. Nós viemos e a restringimos", afirmou, em referência a seu partido, o islamita moderado AKP, no poder há 11 anos.
Além disso, assegurou que durante seu mandato acabaram os maus tratos em prisões e delegacias e foram suspensas as limitações à liberdade de expressão e manifestação. No entanto, Erdogan salientou que "não podem manifestar-se em qualquer lugar" e insistiu em garantir que ocorreram atos de vandalismo durante os 18 dias de protestos e que os hotéis na região estão vazios. "Quem pagará por isso?", perguntou a seus simpatizantes, que não pararam de entoar gritos de "A Turquia está orgulhosa de você".
No ato do sábado, Erdogan anunciou que o parque Gezi de Istambul, símbolo dos protestos, seria esvaziado hoje das milhares de pessoas que o ocupavam, um prazo que não cumpriu, já que nesse mesmo dia os agentes antidistúrbios entraram na área e expulsaram seus ocupantes. Após essa operação, o principal sindicato de funcionários, o KESK, anunciou que sairá "para as ruas e para as praças" para mostrar uma "resposta democrática" à operação no parque.
Em Ancara, milhares de pessoas devem acompanhar a comitiva fúnebre de um manifestante morto após ter sido atingido por um tiro na cabeça no começo das revoltas e que esteve vários dias em estado de morte cerebral.
A multidão colocará flores na praça de Kizilay, onde o atingiram, e depois marchará ao cemitério onde será enterrado. Dois sindicatos anunciaram que participarão do cortejo fúnebre.
Turquia vive longa noite de confrontos
Os confrontos entre Polícia e manifestantes depois da evacuação do simbólico parque Gezi de Istambul continuaram por toda a noite em mais de dez cidades da Turquia e a maioria terminou ao amanhecer, embora na capital ainda sejam registrados alguns choques. Os manifestantes enfrentaram a Polícia turca em Istambul depois que os agentes antidistúrbios desalojaram de forma violenta os "indignados" da Praça Taksim e de Gezi.
Os acampados no parque símbolo dos protestos turcos fugiram do recinto perante a contundente intervenção policial, mas mais tarde alguns se reagruparam para levantar barricadas e acender fogueiras em ruas próximas.
O governador de Istambul, Hüseyin Avni Mutlu, avaliou em comunicado emitido esta madrugada em 44 os feridos, nenhum com gravidade, na retirada e confrontos posteriores com os agentes.
Em breve a notícia do desalojamento se estendeu por todo o país e se produziram protestos, panelaços e confrontos nas principais cidades, especialmente virulentas na capital, Ancara, onde dezenas de milhares de pessoas pediram a renúncia do Governo. Os meios de imprensa turcos falam de uma das piores noites de violência desde que os protestos antigovernamentais começaram há mais de duas semanas no país.
Milhares de pessoas de diversos bairros de Istambul saíram durante a madrugada às ruas para tentar chegar à praça de Taksim, isolada pela Polícia.
Depois da meia-noite local, os choques com a Polícia começaram a se generalizar em vários distritos da cidade, e no bairro de Siraselviler, próximo a Taksim, barricadas oram erguidas. Milhares de cidadãos da parte asiática de Istambul cruzaram com a luz do dia a ponte do Bósforo para se dirigir a Taksim, depois de a Polícia tê-los impedido durante longas horas.
A Polícia desdobrou uma grande operação ao redor de Taksim e mantém isolada a região sem permitir que ninguém se aproxime. Unidades da gendarmaria turca, um corpo policial militarizado, começaram também a ser vistas em partes de Istambul, uma novidade em relação aos dias passados.
Os representantes do movimento de protesto de Taksim acusaram o primeiro-ministro, Recep Tayyip Erdogan, de "achatar seu próprio povo para satisfazer suas ambições autoritárias". "Condenamos a violência contra as mulheres, as crianças e os idosos que estavam no parque", denunciaram em comunicado.
Este grupo denunciou que a entrada policial deixou muitos feridos e detidos, e criticaram que o ataque não seja justificado porque aconteceu justamente quando quem ocupava o parque debatia se abandonava ou não o protesto.
Domingo em Istambul