Soldados patrulham a feira San Martan, em San Salvador, El Salvador, 26 de abril de 2018. Um número crescente de requerentes de asilo chega à conclusão de que a viagem para a Europa é mais segura do que pagar coiotes para atravessar o México| Foto: Meridith Kohut / The New York Times

Para María Marroquín, a vida em El Salvador se tornou intolerável depois que membros de uma gangue que extorquia dinheiro mataram vários comerciantes no mercado onde trabalhava. Ela também passou a temer pela vida do filho de 27 anos, David, depois que um primo foi sequestrado e desapareceu sem deixar rastros.

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Por isso, no ano passado, aos 52 anos, ela decidiu sair do país. A diferença é que, ao contrário dos muitos conterrâneos que tomaram a mesma decisão difícil, ela preferiu atravessar o Atlântico, rumo à Europa, em vez de se juntar aos milhares que estão seguindo a pé para o norte, na esperança de chegar aos EUA e obter asilo ali.

"Ir para os EUA agora é loucura", afirma, citando a pressão do governo Trump por uma política de imigração ainda mais dura. Por causa disso, um volume cada vez maior de centro-americanos vem estudando suas opções e começando a partir para a Europa.

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Tanto é que o número de requerentes de asilo no Velho Mundo aumentou quase 4.000% na última década, de acordo com as estatísticas oficiais, e as chegadas só fazem acelerar: foram quase 7.800 pedidos no ano passado; em 2017, 4.835.

A distância pode ser maior, mas muitos acham que não só é mais segura como mais barata em relação ao que os contrabandistas pedem para ajudá-los a atravessar o México e chegar aos EUA.

Marroquín tem outro filho na Bélgica, que foi quem preencheu a papelada para permitir que ela, o marido, a filha e David entrassem no país como turistas. Quando economizou o suficiente, comprou as passagens para Bruxelas. Dias depois da chegada, deu entrada no pedido de asilo.

Entrada mais fácil

Suyapa Portillo, professora associada do Pitzer College, na Califórnia, especialista em migração centro-americana, diz que as dificuldades para entrar na Europa são menores porque o continente não pede visto de entrada, como os EUA.

A Espanha é a primeira escolha para muitos imigrantes, não só por causa da língua comum, mas também devido a uma rede já estabelecida de amigos e familiares e às oportunidades de trabalho na economia informal.

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Outro atrativo é a percepção de que as autoridades são mais tolerantes, principalmente depois que se calculam os riscos e os gastos que provavelmente estarão envolvidos em uma viagem aos EUA: para quem não faz parte das caravanas, a empreitada pode chegar a US$ 10 mil.

Para Alejandro Hernández, um salvadorenho de 25 anos que pediu asilo na Espanha, atravessar o México teria sido um péssimo investimento. "Tem parente meu que pagou US$ 8 mil para os contrabandistas; alguns já tentaram entrar nos EUA quatro vezes e não conseguiram", conta.

E cita outras dificuldades: cansaço, sede e fome; o crime organizado mexicano; e o endurecimento das políticas de imigração e asilo do governo Trump.

Sua viagem para a Europa saiu por US$ 2 mil, equivalente à passagem aérea para a Espanha e à reserva de hotel para provar às autoridades que estaria ali como turista. "É muito mais caro ir para os EUA e você nem sabe se vai conseguir chegar", constata.

Hernández deu entrada no pedido de asilo em março de 2018, mas, por causa do acúmulo de requisições, talvez leve anos para receber uma resposta do governo. Enquanto isso, trabalha em uma fazenda de criação de porcos perto de Barcelona.

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Calcula-se que oito mil requerimentos de centro-americanos estejam pendentes na Espanha, e o acúmulo não tem previsão de diminuir: segundo a Eurostat, o país concedeu asilo para menos de quinze hondurenhos e/ou salvadorenhos em 2018, e para trinta no primeiro trimestre deste ano.

Segundo a Agência Espanhola para Asilo e Refugiados, a maioria dos pedidos oriundos da América Central se justifica pela ameaça da violência das gangues, problema intrínseco a muitos países da região, e citado constantemente.

A Espanha, porém, raramente reconhece a brutalidade das gangues como razão para aprovação das solicitações. De acordo com a porta-voz do órgão, muitas alegações de perseguição não justificam proteção internacional; para essas, há a salvaguarda das autoridades do país de origem. E essa é basicamente a filosofia seguida pela justiça local.

Quem tem o pedido de asilo negado pode apelar, estendendo assim seu prazo de permanência legal em terras espanholas.

Bélgica como opção

A Bélgica também se mostra um destino cada vez mais atraente para os imigrantes centro-americanos: já é a terceira opção mais popular entre os requerentes salvadorenhos, perdendo só para a Espanha e a Itália. A diferença ainda é grande – no ano passado, foram 2.311 requisições para a Espanha contra 288 para a Bélgica –, mas proporcionalmente os números estão crescendo; 244 se inscreveram no primeiro quadrimestre de 2019. Para dar uma ideia, em 2014 apenas 25 pessoas da América Central entraram com requerimento de asilo; há dez anos, nenhuma.

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Isso talvez porque o país reconheça a violência das gangues como justificativa para refúgio. Segundo a Eurostat, a Bélgica já aprovou mais de 80 casos entre janeiro e abril de 2019.

Dirk Van den Bulck, comissário belga para refugiados e apátridas, explica que, para seu país, as vítimas de gangues não têm condições de receber proteção do governo salvadorenho e, portanto, estão qualificadas para pedir asilo.

"Temos um sistema sólido; oferecemos proteção a quem precisa, independentemente de outros fatores, mesmo sabendo que isso pode, e provavelmente deve, atrair outros imigrantes", afirma ele.

As autoridades belgas concederam asilo para 281 dos 288 salvadorenhos cujos pedidos foram processados no ano passado, segundo a instituição responsável.

A grande maioria de centro-americanos que vai para a Europa, entretanto, não dá entrada na requisição de proteção oficial, preferindo simplesmente exceder o prazo do visto de turista, geralmente na Espanha ou na Itália. Não há números oficiais sobre quantos imigraram dessa maneira, mas algumas estimativas apontam para milhares a mais do que aqueles que optam pelo caminho oficial.

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As autoridades observam atentamente a origem das requisições, já que o aumento advindo de uma região pode atrasar os de outra. "Por enquanto, a América Central não gera preocupações, mas o grande número de requerentes de asilo originários da área já chama a atenção. Está no nosso radar", confirma Anis Cassar, porta-voz da Agência Europeia de Apoio ao Asilo.

Em um centro de refugiados no centro da Bélgica, quatro membros da família Marroquín dividem o mesmo quarto, com acesso ao refeitório e aos banheiros. María diz que o maior problema é o tédio, mas diz que as famílias estão sendo bem tratadas. Para se distrair, ela vai sempre para a casa do outro filho, em Enghien, para preparar pratos típicos de sua terra, usando os pacotes de fubá e farinha de arroz que levou nas malas.

Ela conta que quase todo o resto de sua família mora nos EUA, mas se diz satisfeita com a decisão de ir para a Europa e aliviada por saber que o filho David está em segurança. E completa, afirmando que espera que muitos outros façam o mesmo. "Com certeza, mais gente vai vir para cá."

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