O presidente francês, Emmanuel Macron, recebeu elogios por colocar os incêndios florestais na Amazônia no topo da agenda global, mas em casa os defensores do meio ambiente gostariam de ver menos conversa e mais ação.
Há dois anos, quando o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, se retirou do acordo climático de Paris, ele se comprometeu a "tornar nosso planeta grande novamente". Mas internamente Macron não cumpriu sua promessa. Uma tentativa de aumentar os impostos sobre os combustíveis fósseis desmoronou diante dos protestos dos "coletes amarelos", a expansão das energias renováveis ainda é prejudicada pela burocracia e as usinas nucleares herdadas ainda não foram fechadas.
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"Por um lado, Emmanuel Macron merece crédito por quase todos os seus discursos" sobre o meio ambiente, disse Arnaud Gossement, advogado de Paris que trabalha para desenvolvedores de energia limpa. "Por outro lado, a maioria de suas ações fica aquém".
Assim como outros líderes europeus, Macron está dividido entre uma crescente preocupação pública quanto às mudanças climáticas e o custo imediato para fazer a transição para a energia de baixo carbono. O presidente é puxado em uma direção por aqueles que buscam preservar empregos na indústria nuclear, nos negócios de petróleo e gás e na agricultura, e na outra direção por defensores da energia eólica e solar, veículos mais limpos e proteção do solo.
Os protestos contra os aumentos de impostos sobre a gasolina, dos chamados "coletes amarelos" ressalta o risco de se errar a dose.
Na cúpula do Grupo dos Sete (G7), no mês passado, Macron decidiu interromper a agenda formal e concentrar a pauta nos incêndios florestais que assolam a Amazônia. Ele acusou o presidente Jair Bolsonaro de mentir sobre os esforços para proteger as florestas e ameaçou boicotar o acordo comercial da União Europeia com o Mercosul, proposta que vários outros líderes do bloco rejeitaram.
Mesmo essa abordagem vigorosa sobre uma questão ambiental crucial atraiu críticas mistas na França. O ex-ministro da Ecologia, Nicolas Hulot, que renunciou há um ano pelo que descreveu como falta de ação em diversas questões ambientais, disse em um tuíte que Macron deve seguir suas duras palavras e proibir a importações de produtos agrícolas brasileiros.
Macron "pode mais"
Quando se trata de política doméstica, a promessa de Macron de aumentar a energia eólica e solar foi prejudicada por uma redução insuficiente de burocracia que dificulta o desenvolvimento de energia limpa, disse Gossement, que também é membro do conselho da federação francesa de negócios solares, a Enerplan. As promessas de fechar uma usina nuclear até o próximo ano e fechar usinas a carvão até 2022 ainda não foram cumpridas, disse ele.
Para Gwenaelle Avice-Huet, chefe de energias renováveis da concessionária francesa Engie SA, Macron tem conquistas positivas, mas pode ir além.
"Nos últimos anos, houve um esforço real para simplificar os procedimentos" para projetos renováveis, disse Avice-Huet. O projeto de lei sobre energia e clima e o roteiro energético do país "são itens muito positivos para acelerar as energias renováveis na França".
O projeto de lei, que deve ser apresentada no Parlamento nas próximas semanas, visa reduzir o uso de combustíveis fósseis em 40% até 2030 em comparação com 1990, diminuindo a burocracia para projetos de energia renovável e acrescentando incentivos aos proprietários para melhorar a eficiência energética das residências. A legislação também fará com que a maioria das usinas a carvão, matriz que forneceu 1,1% da eletricidade do país no ano passado, feche em 2022.
O projeto ainda prevê um roteiro para substituir parte da frota de usinas nucleares do país por formas de energia renovável até 2035, e a França tentará se tornar neutra em carbono até 2050. O governo está intensificando as licitações para projetos eólicos solares e offshore. Macron introduziu ou ampliou subsídios para impulsionar a reforma de casas, a substituição de combustível para aquecimento por caldeiras a gás mais eficientes e a compra de veículos mais limpos.
A França ainda precisa fornecer mais incentivos para o desenvolvimento do biogás e simplificar os procedimentos para a substituição de turbinas eólicas antigas por turbinas maiores e mais eficientes, um processo que atualmente leva cerca de sete anos, segundo Avice-Huet. O governo também deve liberar parte de suas terras não utilizadas para desenvolver fazendas solares, uma política que está sendo considerada atualmente, disse ela.
Política e eleições
Para Gossement, o teste de fogo será na votação, nos próximos meses, de um projeto do governo para aumentar a reciclagem de resíduos, como plástico. A recente criação de um conselho de cidadãos para o meio ambiente também sugere que "o Estado quer avançar com impostos em prol do meio ambiente, enquanto redistribui os recursos para aqueles que mais precisam".
Pode haver benefícios políticos para Macron antes das eleições municipais do próximo ano, já que o aquecimento global é uma causa crescente de preocupação. Nas eleições deste ano para o Parlamento Europeu, o partido de Macron, En Marche!, obteve 22,4% dos votos, um pouco abaixo do Frente Nacional, de Marine Le Pen, enquanto os Verdes ficaram em terceiro com 13,5% dos votos.
"As pesquisas de opinião são boas para os verdes, por isso é do interesse de Macron ter algo a mostrar aos eleitores", disse Gossement. "Emmanuel Macron ainda pode nos surpreender positivamente".